O Brasil não pode cultuar um presidente

Felipe Torquini
A Dissidência
Published in
3 min readJan 5, 2019

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O movimento bolsonarista surgiu como oposição ao PT mas sem nenhuma pauta concreta. A maior crítica sempre foi em relação ao domínio cultural promovido pelas alas socialistas e suas derivadas. Concomitantemente as pautas contra corrupção e em favor de um avanço econômico — com o país em crise, era sabido que existia algum erro — alavancaram as massas em favor do atual presidente. No entanto, durante os últimos anos, os grupos de apoio a Jair demonstraram uma grande onda de críticas a tudo que estava sendo feito e um culto ao homem em que depositaram confiança.

Bolsonaro historicamente não é alguém alinhado com a pauta liberal e sim com uma área mais corporativista e sindicalizada dos militares. Carregado com esta bagagem, sempre demonstrou críticas às reformas necessárias ao país (Plano Real, Privatização da Vale/das Telecomunicações, PEC do Teto de Gastos, Reforma da Previdência, etc). Sendo oposição, isso é possível. A arte de questionar a perfeição não é tão complicada. Assim como criticar o governo Temer devido aos escândalos também não era algo difícil. Todavia, o processo de governo inevitavelmente passa por pessoas que não necessariamente são limpas ou de boas intenções na política e isso precisa ser contornado.

Durante a campanha presidencial os constantes ataques ao candidato Geraldo Alckmin devido ao “escândalo da merenda” eram realizados após qualquer movimento do então candidato tucano. Alguns atuais deputados do PSL e apoiadores de Bolsonaro também, junto com a legião de fiéis, depositaram criticas em quem negociava com “velha política”, muito embora isso seja quase sempre preciso e não uma escolha particular.

Com a vitória nas eleições, Bolsonaro não está mais na oposição e todas as suas intenções e opiniões estão fadadas a definir o futuro do país e, por sua vez, isso também vai passar pela negociação com indivíduos desagradáveis. Ora, não há nada de errado nisso. Justifica-se o apoio ao Rodrigo Maia sobre a presidência da Câmara. Todavia, como está sustentada toda a narrativa que muitas vezes prejudicara o avanço de reformas que já poderiam ter deixado o país em uma situação mais confortável? Essa reflexão é válida para compreender como boa parte dos eleitores agem: focando em pessoas e não nas ações.

Não é incomum o próprio Jair Bolsonaro ou algum eleitor do mesmo tecerem comentários contra as reformas que poderiam ser proferidos por algum militante de qualquer partido comunista. Nesse início de 2019, já é rotina ler comentários pelas redes sociais que endossam que “reforma boa é a que vai passar”. De fato, existe um ponto, entretanto, esse era o ponto para a reforma final do Temer. Após todos os cortes e remendos que diminuíram o impacto da Reforma da Previdência, foi alcançada alguma proposta minimamente efetiva e plausível de aprovação. Propor incialmente algo mais brando, que possivelmente poderá ser recortado durante a tramitação, simplesmente é empurrar o problema com a barriga.

Não houve grande tumulto às críticas do Bolsonaro sobre como deve ser feita a mudança na previdência, e, neste momento, a tendência é que qualquer outro caminho menos efetivo que o atual presidente proponha será acompanhado por alguma narrativa. Caso outro político tenha realizado a mesma coisa, neste momento haveria uma comoção por esta parcela do eleitorado, que gritaria por comunismo ou qualquer coisa do tipo.

O culto ao personagem e não as ações deste é a pior opção para quem escolheu Jair para presidência. Seus atos durante o passado inúmeras vezes flertaram com políticas de esquerda — principalmente na seara econômica. A escolha dele foi pela promessa de uma guinada liberal, e que, de fato é crível, já que seu guru econômico é um discípulo da Escola de Chicago. Para este fim ser alcançado, serão necessárias críticas e exigir o que realmente é necessário, julgado a matéria, não seu propositor.

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