A santa inquisição de Emannuel Adebayor

Vinícius Nascimento
Galo de Kalsa
Published in
4 min readAug 21, 2019

Entre altos e baixos com a camisa do Tottenham, togolês ficou marcado pelo bizarro feudo familiar e a tal da Juju

Emmanuel Adebayor nasceu há pouco mais de 35 anos. Da capital do país, Lomé, saiu o jogador que indubitavelmente cravou seu nome como o maior atleta togolês de todos os tempos. Foi por lá que Adebayor deu os seus primeiros passos no futebol antes de sair para a França, como acontece com tantos jovens africanos em busca de uma oportunidade no esporte.

Enquanto batia sua bola em acampamentos no Togo, pode até ser que Adebayor tenha sonhado, mas não devia ter lá tanta certeza de que sua história seria forjada com finais e gols em Champions League, camisas pesadas e 97 gols no primeiro escalão inglês. E de fato tudo isso aconteceu.

Depois de uma boa temporada de estreia no profissional do Metz, ele chamou atenção da Juventus mas acabou preferindo assinar com o Mônaco e logo em 2003–04 disputou sua primeira final de UCL com os monegascos, que acabaram derrotados pelo Porto de Mourinho, Deco e Carlos Alberto. Seguiu na França até 2006, ano em que arrumou as malas e deixou o principado aos 22 anos com 121 partidas e 27 gols.

“Arsenal, né? Meh, pode ser, bora lá”

O destino era o norte de Londres para defender o Arsenal, o nortista fake news, que desembolsou 3 milhões de libras pelo togolês. Além de marcar em sua estreia contra o Birmingham, Adebayor fez outros 61 gols em 142 partidas disputadas durante os seus três anos com a camisa do Canhão. De lá, rumou para o Manchester City, onde nos presenteou com esta inesquecível imagem, e depois Real Madrid, por empréstimo. No mesmo 2011 que defendeu os merengues, acertou um novo empréstimo e retornou a Londres para jogar no Tottenham.

Em seu primeiro ano, foi importante para os Spurs e marcou 17 dos 55 gols do time lilywhite na campanha do 5º lugar na Premier League. A boa chegada amoleceu o coração de Daniel Levy e o mandatário topou desembolsar cinco milhões de libras para tê-lo em definitivo a partir da temporada 2012/2013. Os números de Adebayor caíram drasticamente e naquela PL foram módicos 5 gols em 25 partidas.

Foto publicada para dizer que acho essa camisa bem bonita

Estava ruim, mas o inferno do então camisa 10 viria mais à frente. Uma heresia pode ser definida para além do seu caráter religioso, como um pensamento diferente que vá contra os dogmas de qualquer sistema estipulado. Uma igreja é um sistema assim como um clube também o é. E se diferentemente da Igreja Católica durante a Idade das Trevas (não confundir com as nossas), o Tottenham não enviou ninguém ao fogo, precisou orquestrar sua própria inquisição.

Já tendo perdido espaço com o técnico Tim Sherwood para Roberto Soldado e um tal de Harry Kane durante o inverno de 2014, Adebayor não tinha dúvida acerca do que lhe amarrava as pernas — e os gols: Em um feudo familiar que poderia ter saído de um episódio de Game Of Thrones, o atacante togolês alegava ser vítima de um ritual de magia, a que me recuso a classificar como “negra”, chamada “Juju” perpetrado por sua mãe e irmã com o intuito de prejudicar o seu futebol e terminar sua carreira. Parece loucura né? Mas foi real.

A felicidade estampada na face da matriarca

Do outro lado do imbróglio, as mulheres da família Adebayor alegaram que o atacante expulsou teria expulsado a mãe de casa, o que a levou a vender tomates em uma feira da capital togolesa para sobreviver, e não atendia as ligações da famílias. Para além disso, a matriarca acusava curandeiros islâmicos de terem feito lavagem cerebral para que seu rebento acreditasse em bruxarias.

“Elas deveriam parar de lançar juju sobre mim. Deveriam me deixar em paz. Todos eles dividem minha casa, compartilham meus carros e dizem que se eu morrer tal carro iria para tal pessoa. Vocês podem imaginar?”, declarou o atacante aos tabloides ingleses na época.

Seja como for, até por não contar com o mesmo por sua má fase em campo o Tottenham se meteu no feudo e liberou o atacante sem prazo para um retorno, abreviado por seu expurgo ao fim da temporada.

“Nós confirmamos que Emmanuel Adebayor recebeu permissão para retornar para casa para resolver problemas pessoais. Esse é um problema pessoal, então não vamos comentar mais sobre o assunto, publicou o clube na ocasião.

Apesar da história cabulosa, Adebayor construiu bons momentos no velho White Hart Lane. Não dá para negar que o centroavante teve sua importância por um tempo que se não durou muita coisa, ao menos existiu. Só o fato de ser um dos dois únicos jogadores em toda a história, ao lado de Jimmy Robertson, a marcar gols no North London Derby (NLD), o clássico contra o Arsenal, defendendo Spurs e Gunners já é algo marcante. Também havia sagrado-se como o maior artilheiro do clássico com oito gols. Isto até um tal de Harry Kane ultrapassá-lo mais uma vez.

Nesse dia abrimos 2x0 e tomamos 5x2 no final. sPuRsY

Até por essas boas histórias, e alguns gols importantes, a epopeia de Emmanuel Adebayor no Tottenham não pode entrar na bela seção onde Lucas Colenghi conta causos de passagens nada (ou pouco) saudosas na história do time.

Talvez, contudo, Adebayor tenha chegado ao time na hora errada. Seus 43 gols poderiam ser ampliados caso o togolês conseguisse uma oportunidade com Pochettino. Sem o limão para absorver as energias ruins, sobrou apenas o gosto amargo do declínio.

*texto com edição e colaboração de Fernando Valverde

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