O machismo do(s) mercado(s)

Marina Sala
Mulheres de Produto
4 min readAug 3, 2018

Algumas pessoas podem começar a ler esse texto e achar meio absurdo o que eu vou dizer logo de cara, mas em todo o tempo em que eu trabalhei no mercado publicitário foram poucas as vezes em que eu me senti menosprezada por ser mulher.

Pelo ponto de vista da minha vivência, esse tipo de machismo nas agências é mais forte na área da criação que normalmente é 90% composta por homens. Mas como não era na minha área a gente não sente tanto na pele, né.

Será que, desde a infância, quando fantasiávamos o que queríamos ser com nossos brinquedos, os meninos já não estavam sendo direcionamos a uma mentalidade mais criativa e inovadora? Criar algumas narrativas e personagens para dar vida a algumas bonecas com certeza fez parte da infância das meninas, mas poder ser astronauta, monstro, guerreiro, criador de cidades e encantador de pipas, as vezes até tudo ao mesmo tempo, deve ter sido mais estimulante.

Mas independente do meu devaneio, acho que no fundo eu dei foi muita sorte, viu? Porque como gerente de projetos nesse mercado, eu não sentia que me olhavam com desconfiômetro ou não achavam que eu não sabia o que eu tava falando porque eu era mulher.

A não ser quando o assunto era tecnologia.

Até aí… a gente vai se provando, e vai levando né?

Mas quando eu comecei a insistir na transformação de gerente de projetos pra gerente de produto, depois do segundo meetup, foi que eu tomei o primeiro balde de água fria: tem muito mais homem do que mulher!

Fui me ligando que ser mulher, e ainda por cima sem graduação em ciência da computação, não era o perfil preferido dos recrutadores.

E fui percebendo que sempre quando o assunto era código, falavam comigo como se eu não-fizesse-a-menor-ideia-do-que-eu-tava-fazendo-ali. Que quando me explicavam algo que eu não sabia, numa próxima vez em que o assunto surgia me explicavam de novo a mesma coisa. Mas gente, se alguém me ensina algo novo eu aprendo. Por que me explicavam de novo sem eu pedir?

Uma vez, eu disse pra um colega que eu não era tão burra quanto eu parecia, que eu só exagerava no batom mesmo.

"Sabia que, por ser mulher, eu automaticamente teria que demonstrar minha capacidade. E estava com medo de parecer feminina demais, e não ser levada a sério. Queria passar batom e usar uma saia bem feminina, mas desisti da ideia. Escolhi um terninho careta, bem masculino, e feio." — Trecho do livro Sejamos todos feministas, da Chimamanda Ngozi Adichie.

E aí começam as dúvidas: eu devia continuar sendo quem eu realmente sou (e quando eu digo isso existem mil cores envolvidas 97% do tempo) e com a grande chance de ser subestimada, ou vestir o terninho careta pra tentar passar uma imagem mais tecnologicamente-masculina?

Como podemos melhorar isso?

  • Se você for homem e achar uma situação perfeitamente normal mas ao imaginar uma inversão de papéis a atitude do outro parecer absurda, é porque aquilo é machista. Um bom exemplo disso é o filme "Eu não sou um homem fácil", produção da Netflix.
  • Reaja aos manterruptings da vida, reivindique a igualdade na hora de todos se expressarem.
  • Reclame do bropriating, que é quando um homem se apropria da ideia de uma mulher e leva o crédito por ela em reuniões.
  • Quando rolar um mansplaining, tipo quando eu me pergunto por que me explicavam tudo de novo sem eu ter pedido, use charme e um pouco de ironia pra dizer que você é capaz de pensar, e com isso aprender ;)
  • Todas as anteriores podem gerar o gaslighting, que é quando te tacham de louca, chata, dramática, entre outros, por estar se defendendo dessas atitudes que vão contra você, contra nós.
  • E por último, mas não menos importantes, não defenda só você mesma. Defenda todas nós. Nem sempre temos coragem de enfrentar determinadas pessoas ou situações, mas as vezes precisamos só de um empurrãozinho.

Leia mais sobre esses termos em: Mini manual de como identificar o machismo no trampo.

Por enquanto, eu escolhi continuar com minhas estampas, meus vestidos e minhas cores. E se precisar continuar me provando, eu continuo, mas sei que a primeira impressão que as pessoas tem de mim é que eu não entendo nada de tecnologia.

Ainda não são todas que tem coragem (ou que podem se dar a esse luxo) mas não podemos deixar isso acontecer. Sejam vocês mesmas!

De acordo com a astronauta no meu braço, podemos ser o que quisermos :)

Mulheres, não desistam de trabalhar com tecnologia, ou com qualquer outra coisa que vocês quiserem, porque vocês não estão sozinhas ❤

Quer ouvir mais mulheres falarem sobre isso? Escuta essas lindas nesse podcast "TI é coisa de homem: Pare com essa babaquice!"

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