Descobrindo a Diversidade: Vamos falar sobre transexualidade?

O que é, problemas enfrentados por pessoas transexuais e uma exposição reflexiva sobre essa situação, que é tão invisível.

Lucas Panek
Não faz a frígida
5 min readMay 8, 2016

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Nomi é uma personagem trans do seriado Sense8, interpretada pela atriz trans Jamie Clayton.

Por Bruno Kulik

Pessoas transexuais ou transgêneras são pessoas que não se identificam com o gênero designado pela sociedade, que é sempre dado de forma falocêntrica, ou seja, em relação com ao órgão sexual com o qual nasceu. Se no ultrassom veem que o bebê tem vagina, logo é providenciado um quarto cor-de-rosa, bonecas e etc. No senso comum temos uma ideia de gênero estática, binária e sexista. Mas, no meio disso, temos um mar de diversidades, de expressões e de formas de experienciar a identidade de gênero.

Uma pessoa transexual pode se identificar com os dois gêneros ao mesmo tempo, com um ou com outro em momentos diferentes, com nenhum, com um apenas o tempo todo, enfim como eu disse um mar de formas.

Uma confusão muito frequente é entre identidade de gênero e orientação sexual. Vamos separar:

  • Identidade de gênero diz respeito a forma que você se percebe socialmente, individual seu.
  • Orientação sexual é definida levando em consideração a sua identidade de gênero e a identidade de quem lhe atrai afetivamente ou sexualmente. Por exemplo: Uma mulher transexual lésbica, ela se identifica como mulher, e se sente atraída por mulheres.

Procedimentos médicos

A necessidade da cirurgia de resignação sexual, que adéqua seu órgão sexual, também é variável, ou seja, algumas pessoas transexuais precisam dela, outras não. E essa necessidade, quando existe e a pessoa não tem acesso, pode levá-la a atos desesperados e de risco na tentativa de adequação. Existem relatos de mutilação genital que levaram transexuais à morte, pois a única escolha muitas vezes é fazer isso em casa com qualquer objeto cortante. O seriado Orange is the new black, do Netflix, retrata um caso onde uma mulher transexual recorre a medidas drásticas para conseguir o dinheiro do procedimento. Apesar de ser um episódio ficcional, representa o problema de muitas pessoas trans.

Outra forma de adequação de gênero é o tratamento hormonal. Os hormônios têm papel fundamental no organismo, e determinam, dentre outras coisas, a expressão de características físicas do nosso corpo que se atribuem ao gênero. Por exemplo, a testosterona pode acentuar o crescimento de pelos, aumento da massa muscular etc. E a expressão disso é limitada pela sua herança genética.

As duas ferramentas, cirurgia e tratamento hormonal, são questões de saúde que foram, e na realidade ainda são, negligenciadas pelo Governo e o Estado. As consequências disso são pessoas que se tratam de forma independente, ou com a receita de uma pessoa conhecida, tomando, por exemplo, anticoncepcionais sem acompanhamento de qualquer profissional da saúde para dar orientação, determinar dosagem, e enfim, todo suporte que o tratamento demanda. Essa automedicação irregular hormonal traz uma série de riscos.

Hoje, o SUS fornece tratamento hormonal, psicológico e a cirurgia de resignação sexual, mas de forma ainda muito precária e inacessível, pior do que a de costume do serviço por ele oferecido. Além de funcionários despreparados, exigências absurdas, e filas de esperas pra cirurgia que chegam a 6 anos, esse tratamento não está disponível em todo o sistema, só em alguns estados.

Problemas sociais

A expectativa de vida de travestis (termo usado comumente pra se referir a mulher transexual que não fez a cirurgia de resignação sexual) é em torno de 35 anos, de acordo com uma pesquisa realizada pelo doutor em Psicologia Social, Pedro Sammarc. Já a média dos brasileiros é de 73 anos. Essa diferença absurda vem de vários fatores, dentre eles a marginalização, a falta de oportunidade de emprego, e a violência transfóbica.

Outro problema enfrentado é o nome. No Brasil temos o ‘’nome social’’, que por lei deve ser respeitado em todo órgão público, mas que na prática não é bem assim. Muitas vezes é tratado como “nome fictício”. E o processo de mudança de nome civil, além de caro, pode ser simplesmente negado pela justiça.

A marginalização se dá quando elas não são aceitas em quase nenhum ambiente social público ou privado, sofrem discriminação na escola, universidade e qualquer ambiente acadêmico. Sofrem discriminação no trabalho, sendo frequentemente colocadas, quando aceitas, em subempregos e situações precarizadas de trabalho. A única forma de sustento pra grande parte delas é a prostituição.

O Brasil é o país que mais mata transexuais, entre 2008 e 2014 foram registradas 604 mortes no país. Ser transexual não é crime legalmente falando, mas elas são punidas socialmente com pena de morte. São constantemente mostradas na mídia como bizarras, ou motivo de riso.

No Brasil existe também uma cultura de fetichização das transexuais, ou seja, são tratadas como objeto sexual. Em relacionamentos afetivos, outro problema que encontram é o relacionamento invisível, onde o parceiro se recusa a assumir publicamente o relacionamento com uma pessoa transexual, trazendo o sentimento de ser motivo de vergonha e rejeição.

É evidente, se olhar para a história da humanidade, que a transexualidade é natural do ser humano, e sempre ocorreu. Já a discriminação, essa não ocorre em todos os tipos de sociedade. Existem tradições de povos indígenas onde a transexualidade é sinônimo de poder, nos nativos norte-americanos, por exemplo, o líder xamânico chamado de Berdache é necessariamente transexual.

Uma das maiores dúvidas é como se referir a uma pessoa transexual sem ofendê-la ou causar constrangimento. Pode ser resolvido perguntando pra pessoa o seu nome. Se você tem alguma dúvida sobre a forma de tratamento que deve usar (ele ou ela), pergunte, de forma educada e sempre com bom senso, pra própria pessoa em questão como ela prefere ser tratada.

Descobrindo a Diversidade, por Bruno Kulik

Curitibano, militante do coletivo Difundindo Cores desde 2014, onde teve contato com pautas LGBTs e de opressões de forma geral. Coralista no Coral Gay de Curitiba desde 2015. Pretende levantar questões, fomentar o debate e repassar informação de forma lúdica e didática.

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