Isolamento social e proatividade combinam?

Raisa Jakubiak
Polyteck
Published in
6 min readApr 25, 2020

Você não precisa ser o rei da produtividade durante a pandemia — é um momento de tensão e incertezas. Mas tomar sua primeira atitude pode fazer você sair dela uma pessoa diferente

Quando o André idealizou a revista Polyteck, uma das suas maiores preocupações era fazer com que o estudante brasileiro deixasse de ser passivo. Isso foi em 2013, depois de ele voltar de um intercâmbio na Universidade da Pensilvânia (UPenn). Lá, ele percebeu que os alunos eram muito mais interessados em aprender e corriam muito mais atrás dos conteúdos, além da sala de aula — esse, por acaso, virou o slogan da Polyteck durante seu tempo de atividade.

Ele chegou com essa ideia para o Fábio e para mim e nós, imediatamente, concordamos que era uma característica “endêmica” não só dos alunos, como também da nossa sociedade — inclusive de nós mesmos, em alguns aspectos (na época, eu tinha acabado de me formar e não via opções de trabalho que me agradassem. Estava paralisada pelo medo [o André falou disso em alguma edição da Polyteck). Claro, isso também tem muito a ver com os moldes do sistema de ensino: aqui são meio engessados. Já, no sistema americano, você deve, inclusive, escolher matérias que não tenham a ver com o seu curso para completar sua grade. Isso serve para “abrir a cabeça” e tornar cada profissional único. Tudo bem, você pode pensar: a UPenn é uma Ivy League, não dá para comparar (sugiro que assista a esse vídeo)

Muita gente também leva uma vida difícil, tendo que trabalhar, estudar, sustentar uma família…tudo isso junto. Mas vamos combinar: em geral, nós somos mais passivos. Estudamos para tirar a nota necessária para passar, contamos o número de faltas, fazemos o mínimo necessário no trabalho…

Uma coisa é certa: não há como fingir que está tudo normal e falar que você tem que aproveitar ao máximo, porque esse é a melhor época da sua vida. Nada está normal.

Enfim, tudo isso foi em 2013, antes do canais motivacionais no YouTube, dos Instagrammers e dos “coachs quânticos” (fuja desses). Quem é que, ao ver um anúncio no Facebook ou no Instragram, não vê dezenas ou até centenas de pessoas perguntando algo que já está escrito no próprio anúncio? Isso já virou até meme:

Você deve estar rindo aí, ou lembrando do anúncio que viu há 5 minutos e estava bem assim. Tudo bem, podem ser pessoas simples, sem instrução. Então, vamos trocar de situação: grupo de alunos da pós graduação - caso real. Todas as informações sobre o local onde se reserva a sala para as defesas são facilmente encontradas numa procura de 2 minutos no Google:

“Alguém sabe o horário de funcionamento da secretaria? Preciso marcar minha defesa”

E alguém responde: “não precisa ir até lá, é só solicitar por e-mail”

“Você pode me passar o e-mail?”

Logo, isso não é apenas um problema da população com menor grau de instrução. Também não é só uma questão de “interpretação de texto”, como diz o meme ali em cima. É muito sobre esperar que alguém faça as coisas por você. É sobre passividade. E a pergunta que fica: como poderíamos melhorar?

Com isso, na época, tentamos desenvolver um conteúdo de qualidade e interdisciplinar, a fim de chamar a atenção dos alunos universitários para as outras áreas e “chamá-los” para o mundo da proatividade. O resto é história — chegamos em 80 universidades em todo o país e, de brinde, conseguimos, o André, o Fábio e eu, transformar nós mesmos em pessoas mais proativas.

Distribuição da Polyteck em algum momento da sua existência

Agora, o que tudo isso tem a ver com a pandemia e o isolamento social?

Alguns estão fechados em casa trabalhando em home office. Uns ficaram sem nada para fazer. Já outros estão trabalhando o dobro, o triplo ou como nunca trabalharam na vida antes. E, ainda, cada um lida com os problemas de maneira diferente.

Uma coisa é certa: não há como fingir que está tudo normal e falar que você tem que aproveitar ao máximo, porque esse é a melhor época da sua vida. Eu cheguei a me culpar por não estar sendo super ultra mega produtiva em alguns momentos, me achando super incompetente. Já superei isso. Nada está normal. Só não está preocupado e angustiado, pelo menos um pouquinho, quem não tem noção do tamanho do problema.

De quem já assistiu todas as séries do Netflix a quem está aproveitando para dar um gás na carreira, fazendo todos os cursos que vê pela frente, todos tivemos nossos planos frustrados de alguma maneira. No entanto, é um momento perfeito para tentarmos entender o que é importante para nós. Quais são seus sonhos? Como transformar seus sonhos em planos?

Hoje em dia, há milhares de influenciadores no YouTube no Instagram postando frases motivacionais e de superação, e isso inspira as pessoas. Acho super bacana, pois em 2013, quando começamos a Polyetck, isso praticamente não existia. Foi quase como nadar no deserto no escuro. Hoje vejo muito mais pessoas querendo se desenvolver e se destacar. Porém, mesmo com o mundo meio parado, a maneira de fazer as coisas acontecerem não mudou: e é agindo.

Se tem algo que aprendi trabalhando na Polyteck foi: nunca espere que alguém faça algo por você. Porque meus colegas eram uns incompetentes? Porque ninguém se ajudava? Muito pelo contrário! O André e o Fábio são duas das pessoas mais agilizadas e prestativas que eu conheço. Mas nós tínhamos tanto trabalho novo, que ninguém mais sabia como fazer, que tivemos que aprender a nos virar sozinhos. E isso deixou uma herança em nós que, às vezes, traz recompensas até hoje.

Exemplos

Pense na pessoa que é seu ídolo. Pode ser alguém famoso ou até mesmo alguém bem próximo. Como ele conseguiu o que tem? Trabalhando duro, com certeza. O meu, como de muitos brasileiros da minha geração, é Ayrton Senna. Pode-se dizer: mas ele era talentoso, nasceu em família rica e os pais ainda incentivaram! Claro, isso com certeza o colocou alguns passos à frente. Mas e se ele não tivesse se dedicado (até demais, como quem o conhecia dizia), teria chegado onde chegou? Certamente não.

Ayrton Senna carregando a bandeira do Brasil

Sim, é um saco não poder sair, espairecer e ver as pessoas que você gosta. Alguns não estão recebendo salário. Outros não podem ver as pessoas que amam, pois estão na batalha direta contra o covid-19. Quem está trabalhando em qualquer setor está sobre pressão constante. Mas pense: como eu posso melhorar? Eu sempre penso: “O que o Senna estaria fazendo se a pandemia fosse na época em que ele corria?

Você não precisa encarar o mundo como se fosse um campo de batalha que precisa ser conquistado a força (eu sou assim, mas nem sempre é bom) — mas por que não “aproveitar” esse momento, já que não temos escolha, para fazer algo que você sinta orgulho? Algo que, assim como foi a Polyteck pra nós, você olhe para trás e fale: “eu melhorei”, “eu me tornei mais pró ativo”, ou o melhor: eu ajudei alguém?

Mão na massa, agora é com você!

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