O tratamento da saúde mental na rede pública

Taís Forgearini
Precisamos falar sobre a vida
5 min readDec 11, 2017
Setor público não consegue atender a totalidade de indivíduos com transtornos mentais. Foto: Arquivo internet

Uma avaliação do Ministério da Saúde identificou que quanto mais Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) houver nos municípios, menores são os índices de suicídio. Os CAPS são destinados a pessoas com transtornos mentais e oferecem atendimento à população realizando acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários. Outro fator que contribui na redução nos indicadores de atentados contra a própria vida é a disponibilidade de vagas para internação, quando necessária. A possibilidade de um atendimento mais especializado é um dos desafios para o coordenador de saúde mental da Secretaria de Saúde de Porto Alegre, Giovanni Abrahao Salum Júnior.

De acordo com Salum, o setor público está aquém das condições ideais para atender a demanda de indivíduos com transtornos mentais. O Sistema Único de Saúde (SUS) destina recursos insuficientes para patologias de origem psíquica. “A rede é muito deficiente para poder suprir a demanda de saúde mental do município. Há uma falta de serviços histórica dentro do serviço de saúde pública, e isso se reflete em relação ao suicídio também”, destaca Salum.

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Atualmente, a rede para atendimento de saúde mental da Secretaria de Porto Alegre conta com doze CAPS — cinco CAPS AD, quatro CAPS II e três CAPS I. O município tem duas emergências de saúde mental, uma que é o Plantão de Emergência em Saúde Mental (PESM) do Pronto Atendimento Cruzeiro do Sul (Pacs) e a outra que é o Instituto de Assistência e Proteção à Infância (IAPI); as demandas de emergência vão para esses dois plantões de atendimento. “Para um município do tamanho de Porto Alegre, é pouco para poder atender às demandas de saúde mental”, ressalta Salum.

A atenção primária em saúde é o atendimento inicial que tem por objetivo orientar sobre a prevenção de doenças e solucionar os possíveis casos de agravos, organizando o fluxo dos serviços nas redes, dos mais simples aos mais complexos. Segundo o coordenador de Porto Alegre, de 40% a 50% das pessoas que frequentam uma unidade têm algum tipo de sofrimento mental que pode ocasionar atos suicidas. A gestão atual da Secretaria quer que a atenção primária fique com cinco transtornos mentais mais prevalentes, que é depressão, ansiedade, álcool, drogas e exposição à violência. Os profissionais de atenção primária têm que saber lidar com esses cinco problemas mais prevalentes, e isso envolve avaliar o risco mais comum que é o suicídio. “É preciso haver mais treinamento para atenção primária para que eles saibam conhecer os problemas de saúde mental comuns e identificar os riscos”, salienta Salum.

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Entre as demandas e projetos da Secretaria estão a ampliação de serviços e treinamentos, informatização, regulação de protocolos especiais, indicadores para ver o quanto a rede está bem ou não. Para 2018, há previsão de abertura de três CAPS, um CAPS AD e dois CAPS III para a infância e adolescente, que é a rede mais insuficiente na capital dos gaúchos de acordo com o coordenador Salum.

Iniciativas de tratamento à população

A Prefeitura de Candelária, através da Secretaria Municipal de Saúde, e o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) foram pioneiros ao desenvolver, em 2010, o programa de prevenção, sendo naquele momento o único no país. O projeto “Vida Sim — Programa de Promoção à Vida e Prevenção ao Suicídio” surgiu em razão da cidade estar entre as cincos com maior índice de suicídios do país na época. O programa é voltado para a atenção ao comportamento suicida, assim como o impacto traumático que este evento provoca na sociedade, buscando estratégias para reduzir índices, acolher a demanda e caracterizar um perfil epidemiológico dos indivíduos.

O ‘Vida Sim” trabalha com o principal grupo de risco: as tentativas de suicídios. Foi criado um protocolo que organizou o fluxo desde a captação dos casos de tentativas até o acompanhamento após alta do tratamento. O comportamento suicida é identificado por toda a rede básica de saúde, administração central do sistema de saúde (ACSS), hospital geral, segurança pública, serviços de emergência, e na zona rural a identificação é feita pelos profissionais da Emater, através dos grupos realizados com os agricultores, pois os maiores índices são neste grupo. Quando identificados, os pacientes são encaminhados para o CAPS, onde é elaborado um Plano Terapêutico.

“A depressão e a dependência química, principalmente do álcool, são os principais fatores que levam uma pessoa a tirar a própria vida, — na verdade, quem tenta o suicídio não quer morrer, mas sim, deixar de sofrer, e neste programa oferecemos uma alternativa para terminar com esse sofrimento. Hoje, ainda é um tabu falar de suicídio, porém, omitir, somente serviu para aumentar os índices. Cerca de um milhão de pessoas estão se matando por ano no mundo inteiro e ninguém fala sobre isso, outras doenças, não matam um milhão de pessoas por ano e existem muitas campanhas falando sobre, como a dengue e a H1N1, por exemplo”, conta a assessora técnica da Secretaria Municipal de Saúde de Candelária, Grazieli Juliana Priebe.

Grazieli é assessora técnica da Secretaria Municipal de Saúde de Candelária, Município pioneiro no desenvolvimento de programas de prevenção ao suicídio. (Foto: Divulgação)

O lançamento do Manual de Prevenção ao Suícidio — Divisão de Vigilância Epidemiológica/NVDANT ocorreu para toda a rede SUS do país no final de 2012. No primeiro ano do programa, as mortes por suicídio na cidade diminuíram 70%, demonstrando que o trabalho em rede e a prevenção funcionam. Parte da equipe que iniciou os trabalhos do projeto, por motivos pessoais e profissionais, não atua mais no programa.

A proposta foi reformulada, incluindo os novos profissionais da equipe atual do CAPS e, em setembro de 2017, ocorreu o Seminário Suicídio em Pauta, em uma parceria da Secretaria Municipal de Saúde e Hospital Candelária. O evento contou com a participação de mais de 300 pessoas, entre profissionais de saúde, educação, assistência social, entidades não governamentais, igrejas, e população em geral. “Devemos desmitificar a ideia de que não se pode falar sobre suicídio”, conclui Grazieli.

Produção: Wesley Andriel, Michele Mueller, Rafael Pereira, Taís Forgearini, Gabriela Araújo e Kassandra Pooch.

Em caso de auxílio:
CVV (Centro de Valorização da Vida) — telefone 188 (ligação gratuita) para o Estado do Rio Grande do Sul e 141 (custo de uma ligação local) para todo o território nacional. Pelo site www.cvv.org.br, via chat ou Skype.
O atendimento pessoal é realizado nas unidades do CVV em horário comercial.
CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) mais próximo.

Emergência:
Unidades Básicas de Saúde, Unidades de Pronto Atendimento, Pronto Socorros, Hospitais, SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Emergência) pelo telefone 192.

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