924 Gilman: uma casa de alma punk

Uma tarde no clube mais importante da East Bay. Berço de Green Day e Operation Ivy, local ainda é gerenciado pela comunidade

Rodrigo Alves
Punk na Califórnia
4 min readSep 16, 2017

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Por Rodrigo Alves

Ali pelas quatro da tarde num sábado qualquer de agosto em Berkeley, na Califórnia, a calmaria da vizinhança com pouca gente na rua era um convite pra ficar feito bobo olhando os tijolos daquele prédio pequeno na esquina. Do outro lado daquelas paredes, tinha história pra caramba. Foi ali dentro, no seminal 924 Gilman Street, que a cena da East Bay pariu bandas como Operation Ivy, Green Day, Rancid, Neurosis, Jawbreaker e dezenas de outras. No fim dos anos 80, quando a violência e a intolerância espreitavam o punk, o clube enfiou o pé na porta com uma filosofia que condenava o racismo, o machismo e a homofobia. Sem álcool, sem drogas, sem violência, sem fins lucrativos, sem proprietários, sempre nas mãos de voluntários e da comunidade local, aberto a todas as idades. Tem sido assim há três décadas.

Lá dentro, absolutamente tudo é tomado por grafites, cartazes e adesivos: paredes, mesas, cadeiras, escadas, banheiros, lixeiras, tudo está coberto por alguma mensagem. É muito detalhe para varrer com os olhos, mas fica difícil desviar a atenção do palco com piso cor de vinho, tentando repassar mentalmente a quantidade absurda de bandas importantes que já pisaram ali.

Naquele sábado, às 17h, rolou a reunião periódica com integrantes da comunidade para tomar decisões sobre a rotina do clube. Tudo na base do voto. Um sofá roxo, uma poltrona preta, uma mesa de madeira, 10 cadeiras de metal, e uma voluntária conduzindo o debate. A entrada é livre, e você não pode votar se aquela é sua primeira vez, mas todo mundo pode falar — do cara que quer exibir no clube um documentário sobre transgêneros até o morador de rua pedindo apoio para protestar contra a marcha da direita que atrai neonazistas. Assim segue o baile na casa que usa apenas doações e o dinheiro dos ingressos para se sustentar — e se você não pode pagar, ok, dá para ver os shows de graça ajudando na limpeza ou na bilheteria.

O vídeo acima não apenas mostra as imagens do clube, mas também fala do documentário “Turn it Around: the Story of East Bay Punk”, que o diretor Corbett Redford acaba de lançar nos EUA. O filme conta a história da cena e também do Gilman, lembrando casos como o dia em que a comunidade expulsou skinheads nazistas que queriam arrumar confusão no local.

A seguir, mais imagens da tarde no 924 Gilman Street, em Berkeley:

É difícil achar um lugar livre nas paredes do Gilman.
Voluntários e membros da comunidade local tomam as decisões do clube na base do voto.
Nem dá para calcular quantas bandas relevantes da cena punk pisaram neste palco ao longo das últimas três décadas.
A entrada do clube, na esquina da Gilman Street com a 8th Street, em Berkeley.
Até a placa na rua tem adesivo: “Nunca esqueçam Tony Sly”, em homenagem ao vocalista do No Use For A Name, que morreu em 2012.

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Rodrigo Alves
Punk na Califórnia

Jornalista do GloboEsporte.com, fã de basquete, de futebol, de cinema, de séries de TV e de outros troços.