Você acha mesmo que alguém quer ler sobre as suas viagens?

Calma, eu quero. Deixa eu explicar melhor.

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Eu sei, você ama viajar. Todos nós amamos. Na verdade, uma pesquisa mostrou que apenas 12,9% da população brasileira não gosta de viajar, ou seja, mesmo que nem sempre tenham a oportunidade, os outros 87% gostam da ideia— o que é uma estatística fácil de entender.

Como não gostar de viajar? Viajar (potencialmente) envolve todos os prazeres da vida: experimentar sabores novos, comer quantidades não recomendadas de comida, ficar bêbado com bebidas alcoólicas de procedência duvidosa, fazer atividades físicas numa tarde de segunda-feira, dormir tarde e acordar na hora que quiser, conhecer pessoas incríveis, visitar lugares maravilhosos que podem colocar sua vida em risco, talvez transar com pessoas incríveis que podem colocar sua vida em risco… Enfim! Não dá para enumerar todos os prazeres de viajar, até porque a lista varia de pessoa para pessoa.

Difícil mesmo é entender quem não gosta.

Mas é aí que tá. Esses caras que não gostam de viajar é que são raros. É difícil encontrar eles por aí. Eu mesmo, na minha vida inteira, só conheci uma pessoa desse seleto grupo. Não sei o que eles pensam, não sei como se divertem, não sei o que diabos fez eles não gostarem de viajar. Eles é que deviam estar sendo entrevistados.

E do outro lado temos nós: os 87%. Mais de 180 milhões de brasileiros. Um número enorme de reféns desse cliché eu-amo-viajar que todo mundo já cansou de ouvir em todos os cantos. Gostar de viajar é um senso comum. Não somos especiais, embora às vezes a gente ache que é.

A gente se acha especial porque viajar ainda tem uma pegada cool e aventureira. Nós só esquecemos que não somos mais a geração que precisava passar meses dentro de um navio para chegar em outro continente. Naqueles tempos eram poucos os corajosos que desbravavam o planeta. Quando eles voltavam, catalogavam animais desconhecidos e escreviam livros com verdadeiras aventuras. Eles sim eram especiais.

Hoje chegamos em qualquer lugar do mundo em poucas horas. As histórias dos viajantes são disseminadas em todos os meios de comunicação possíveis, dos jornais ao cinema. Se nenhuma mídia convida o viajante a contar suas histórias, ele conta por conta própria. Ele cria um canal no YouTube. Escreve e publica seus próprios livros. Faz verdadeiros reality shows no Instagram. Narra sua viagem em todas as plataformas, do Twitter ao Medium (olha eu aqui).

Para você ter uma ideia, no último ano foram postadas 95 milhões de fotos por dia no Instagram. 1,13 bilhão de usuários estão ativos diariamente no Facebook. Mais de 1 bilhão de horas de vídeo são assistidos por dia no Youtube. Não vem ao caso jogar um monte de números e estatísticas aqui, o fato é: todo mundo está compartilhando suas vidas o tempo todo. Especialmente as suas viagens. É um volume absurdo.

Nós adoramos compartilhar as experiências que temos longe de casa. Nos sentimos um pouco como o Darwin chegando pela primeira vez na América do Sul, só que em tempo real e com 4G. Porém o que exatamente estamos desbravando? Ele estudava plantas e animais até então nunca vistos. Nós fotografamos plantas e animais que já foram exaustivamente fotografados antes. Paisagens que já vimos em quadros espalhados por todos os lugares. Todos os destinos mais comuns (e até alguns mais inusitados) já foram registrados de milhares de ângulos, descritos em milhares de textos e mostrados em milhares de vlogs por aí.

Nesse mar de informação, quem é visto?

O que ainda não foi compartilhado?

O que existe de único?

Você.

Não adianta tentar competir com a Lonely Planet, o Guia Quatro Rodas e a revista Viagem & Turismo em listas de restaurantes, pontos turísticos, preços e horários de funcionamento. Existem mais empresas apurando esses fatos e publicando tudo online do que é realmente necessário. Elas tem equipes inteiras à disposição e recebem apoio financeiro de anunciantes e investidores. É por isso que eles são muito bons nisso. Trabalhar para eles é o sonho de muita gente (incluindo eu mesmo, fica a dica se algum deles estiver lendo esse texto), mas ninguém é páreo para vencê-los.

Por outro lado, sabe o que eles não conseguem fazer?

Contar a sua experiência. Passar a sua personalidade. Saber as histórias engraçadas e inusitadas que você viveu. Isso é único e isso nunca foi compartilhado antes. Esses conteúdos passam muito mais veracidade e emoção do que editoriais de revista. São as pessoas que engajam seguidores nas redes sociais. Pode reparar que uma selfie na frente de um ponto turístico ganha muito mais likes que uma foto só dele, por mais incrível que ele seja. A questão é que provavelmente todo mundo já viu uma foto daquele lugar antes. Você que é o diferencial ali.

Pense nos viajantes que você segue — aposto que seu feed também é cheio de viajantes como o meu — e pense em quem você não segue. A diferença não é o lugar, né? São as pessoas. Você ri e chora com elas, e no fundo sente até uma invejinha branca delas também, eu sei. Se todas forem pro mesmo destino, cada uma terá vídeos, fotos e histórias diferentes pra contar.

É diferente ler sobre experiências reais. É por isso que voltando àquela pergunta do título, a resposta certa é sim. As pessoas querem ler sobre a sua viagem. É muito mais difícil ganhar atenção com um post “10 praias imperdíveis no Caribe” do que com um post “Como eu sobrevivi uma semana na Alemanha depois de gastar todo meu dinheiro no primeiro dia”. Existem milhares de posts como o primeiro exemplo, mas a história que você viveu é eternamente única. E se mas alguém tiver passado por algo parecido, é aí que nasce uma conexão.

Não existem mais continentes perdidos esperando para serem descobertos, mas existem histórias nunca vividas que só você pode contar. Por isso, fotografe, filme, escreva, desenhe, dê dicas e registre as suas viagens de todos as maneiras que imaginar, mas sempre focando na sua experiência pessoal. Isso é ser um desbravador moderno. Isso é interessante. Isso sim é especial.

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Igor Mariano
Revista Subjetiva

Brasileiro, gestor de marketing, apaixonado por viagens, café, cerveja, livros e tudo que nos distrai • www.instagram.com/igor_mariano