Rodolfo Buhrer/Reuters

Rumo a 2022 (11)

Atualizando a corrida eleitoral com os acontecimentos de Novembro de 2019

Gustavo Laet Gomes
6 min readDec 1, 2019

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Seguimos nossa série de previsões sobre a eleição presidencial de 2022 com base no método que explicamos na primeira edição da série Rumo a 2022. Primeiro, os gráficos:

O mês de novembro foi marcado por dois eventos cruciais: (1) a soltura do presidente Lula — depois que o STF votou pela inconstitucionalidade da execução antecipada da pena após a condenação em segundo grau — e (2) o clímax da crise do PSL, culminando com a saída do presidente Jair Bolsonaro e do senador seu filho 01 do partido e o anúncio da fundação de um novo partido, chamado Aliança pelo Brasil (ApB), de orientação neofascista.

Sim, neofascista, porque já não se pode mais mitigar, relativizar ou ignorar o movimento dessa gente. Se você ainda tiver dúvidas, leia o estatuto do partido. E se precisar de mais algum reforço, considere esse tweet:

O lema “Deus, Pátria e Família”, que aparece nas hashtags não é outro senão o da Ação Integralista Brasileira (AIB), partido fascista fundado em 1932 por Plínio Salgado. Algumas imagens dessa turba para recordar os mais esquecidos:

Para compará-los aos seguidores de Mussolini ou Hitler, uma pesquisa no Google Imagens pode dar uma ideia.

Compare ainda a sigla do novo partido com a do partido neofascista que vem assustando a Alemanha — Alternative für Deutschland, sigla AfD — e que professa posições semelhantes às de Viktor Órban da Hungria, um dos ídolos de Eduardo Bolsonaro.

O flerte com a sanha genocida do fascismo alemão — também conhecido como nazismo, caso falhe a memória dos cínicos — se completa sinistramente com a insistência maníaca de Bolsonaro pelo número 38, o número brasileiro da morte, das taxas de homicídio que superam qualquer guerra e dizimam seletivamente a população preta e as nações indígenas. Símbolo abominável representado “artisticamente” pela escultura de cartuchos de balas com que o partido foi presenteado em sua convenção inaugural.

A fundação da ApB funciona, de certo modo, como uma resposta programada e calculada ao efeito simbólico da soltura do presidente Lula. Com o movimento Lula Livre, o PT foi construindo um ambiente de expectativa em sua militância (e, no fim das contas, em toda a esquerda), preparando-se para converter o evento da soltura em um marco político da resistência a Bolsonaro. Uma vez solto, Lula funcionaria como uma espécie de catalisador da oposição a Bolsonaro, ao mesmo tempo iniciando-a efetivamente e dando fôlego a ela. É como se até aqui a oposição estivesse sustada.

Vendo e compreendendo isso perfeitamente — não era necessária muita inteligência para fazê-lo — também o bolsonarismo manobrou para poder fazer um movimento simetricamente oposto como resposta à soltura de Lula. Em primeiro lugar, acusou-o imediatamente de estar se radicalizando. Note que o próprio Lula aceitou de bom grado essa pecha, pois isso também atende ao seu interesse de se firmar como única alternativa possível ao bolsonarismo.

A tal radicalização do lulismo — que até aqui é meramente retórica — era o ensejo perfeito para uma radicalização efetiva do bolsonarismo — que até aqui era disfarçada retoricamente. Com o inimigo nas ruas, o bolsonarismo lança fora, num ato “heroico”, o que ainda lhe restava de “pudor” bom-mocista para mostrar sua verdadeira face (“desconhecida” apenas pelos cínicos): o fascismo, apresentado como radicalização necessária para defender valores — Deus, Pátria e Família — ameaçados pelo “ateísmo” subversivo do “comunismo” lulista agora “radicalizado”.

Em termos práticos — voltando aqui ao nosso feijão com arroz — o que vemos com isso é que a candidatura de Jair Bolsonaro ganha novo fôlego, porque agora o antigo inimigo, de novo às soltas, precisará do velho capitão da campanha para ser novamente (e de preferência) definitivamente abatido. Num movimento prévio, Bolsonaro rompe definitivamente com Hamilton Mourão, oferecendo abertamente a vice-presidência a Sergio Moro. Isso, em parte, responde à pesquisa que foi divulgada no mês anterior, revelando certo medo da própria posição de Sergio Moro, e, em parte, coloca Moro numa posição de ter que romper com o bolsonarismo, caso queira mesmo ser candidato. É uma boa jogada.

Outro efeito da soltura de Lula e consequente aprofundamento da polarização (ao menos retórica) é que os candidatos alternativos perdem força, à direita e à esquerda. Tanto Luciano Huck, quanto João Doria, o primeiro se apresentando como o “bom moço” e o segundo como o “antipetista moderado”, ficam prejudicados diante da ameaça do bicho-papão Lula novamente à solta pelas ruas.

À esquerda, uma possível candidatura neutra de Flávio Dino, que poderia ser capaz de unir por procuração os polos da própria esquerda, fica ainda mais distante e improvável. Para o Ciro Gomes resta se encaminhar para o centro, acenando para Rodrigo Maia com alianças na eleição municipal e tentando manter o PSB e a Rede sob sua esfera de influência, já que o PCdoB, dificilmente abandonará o posto de aspone do PT.

É possível que haja, no fim das contas, quatro forças políticas em disputa (e talvez fosse bom para elas e para todos nós que as candidaturas se aglutinassem nessas 4 frentes, ao invés de abrir uma lista com mais de uma dezena de candidatos):

  1. Os fascistas bolsonaristas na extrema-direita, aliados aos lava-jatistas e aos cínicos novistas-guedistas;
  2. Uma centro-direita formada dos cacos do PSDB, liderada por João Doria e com uma provável nova desistência de Luciano Huck;
  3. Uma centro-esquerda puxada pela aliança do Ciro Gomes (que será mais efetiva se conseguir o apoio paradoxal do DEM); e
  4. O PT com um poste do Lula, provavelmente o próprio Fernando Haddad, já que é praticamente impossível que o Lula recupere seus direitos políticos.

Note que, politicamente, Rodrigo Maia e o DEM são a força mais importante (no sentido de ser atuante) atualmente no Congresso. O DEM oscilará no centro, entre as posições 2 e 3 e só se decidirá nos momentos finais. Não obstante, duvido que o apoio do DEM seja capaz de colocar os candidatos dessas posições no 2º turno.

2º Turno

Embora o Jair esteja em trajetória de ascensão e o Moro em trajetória de queda, creio que ainda é cedo para cravar a presença do capitão fascista no 2º turno — isso se ainda tivermos eleição. Portanto, mantemos aqui Moro e Haddad, mas com sinalização de que Jair pode tomar este lugar em breve, seja por uma melhora em sua posição eleitoral, seja com um golpe de Estado que o implante como ditador. A ver.

  • Editado em 02/12/2019, às 5:30, para correções e a inclusão do parágrafo sobre o número 38.

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