Processo Foco & Fôlego atualizado e simplificado

Cali (Renato Caliari)
Tentaculus
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21 min readMar 4, 2021

Este texto é uma nova versão modificada e simplificada do processo Foco & Fôlego documentado aqui.

O documento anterior contém muitos detalhes que podem assustar numa primeira visita em vez de dar uma noção geral e incentivar.

Aproveitei e alterei alguns termos e eventos na linha do tempo que parecem favorecer o uso do processo.

Sobre a linguagem utilizada no texto

Dei preferência a termos em português acima de termos em inglês e também termos no feminino. A intenção foi tornar a linguagem mais inclusiva, porém correndo o risco de ao mesmo tempo tornar estranha ou confusa em um primeiro momento para quem é do mundo das ‘startups’ e tecnologia.

Exemplos: em vez de designer, experimentei o termo desenhista. Em vez de developer, experimentei o termo implementadora. Não utilizei o termo desenvolvedora pois desejei tornar distinto que alguém nesse papel irá implementar o que foi projetado e desenhado, e por ter uma trilha chamada de trilha de implementação.

Além disso, também me arrisquei em experimentar evitar especificar demais os itens pois meu desejo é permitir ter um processo concreto o suficiente para que alguém saiba o que fazer, mas abstrato o suficiente para que tenha espaço para resolver os detalhes mais interessantes de acordo com a própria realidade e limites encontrados.

Inspirações

Este processo foi super inspirado no ShapeUp da Basecamp — crédito ao Ryan Singer e às pessoas da Basecamp — e no Triple Track Agile (uma combinação de Problem Space com Solution Space).

Alguns links para quem desejar saber mais sobre o ShapeUp:

Veja também outras empresas que utilizam ciclos semelhantes de 6 semanas:

O que será descrito nesse texto pode até ser identificado como uma compilação do próprio Shape Up. E tudo bem, se assim for. :) Ou, talvez, uma interpretação, adaptação e versionamento do mesmo para o Foco & Fôlego, desejando oferecer acesso às pessoas que não dominam o inglês.

O importante nesse momento não é tentar identificar quando algo termina e quando outro começa, e nem querer defender um novo processo por si.

A ideia é compartilhar informações e oferecer algo para experimentar e adaptar de acordo com o contexto desejando potencializar benefícios e minimizar dores.

Se essa forma de expôr o processo for útil a você, já valeu.

Motivação

Além de me arriscar a adaptar o próprio ShapeUp da Basecamp para contextos um pouco diferentes e desejar tornar visível e acessível a mais pessoas de língua portuguesa, abaixo cito várias razões que me impulsionam a escrever sobre esse processo.

Há alguns grandes desafios nos processos de produtos atuais que vão desde iniciativas que parecem nunca terminar, falta de compreensão do que precisa ser feito, como escalar times, quem toma decisão do quê, falta de autonomia do time que está implementando algo para cortar escopo e tantos outros.

O dia começa e termina com reuniões e mais reuniões. Em geral, para tomar decisões de riscos não mitigados ou por não saberem quem tomam as decisões naquele escopo. Tudo é feito sincronamente. As pessoas não possuem tempo para trabalharem no que precisam.

Não há tempo de elaborar propostas de produto com profundidade e nem mitigar riscos.

Parece que muitos caem na armadilha de medir sucesso com quantidade de tarefas executadas. Pensam na velocidade de entregas, mesmo que não tenham entendido ou amadurecido a ideia o suficiente. Com isso, as necessidades do público não são bem resolvidas e a lista de defeitos, mais débitos técnicos, se tornam cada vez maiores.

Alguns times fazem cerimônias de planejamento e até mesmo usam práticas de estimativas. A intenção é boa, porém prever tempo de histórias ou tarefas não costuma ser tão efetivo assim.

“Gosto de dizer que posso ter inventado pontos de história e, se o fiz, agora sinto muito.” ー Ron Jeffries falando sobre estimativas de histórias de desenvolvimento.

Os planejamentos duram horas, e por vezes se aprofundam nos detalhes das possíveis tarefas imaginadas. Talvez esquecem que boa parte das tarefas ainda aparecerão quando tiverem tempo para colocar a mão na massa. Quando sentarem pra desenvolver, novos desafios e tarefas que não foram planejados aparecerão.

Você não sabe dos detalhes até começar a implementar algo.

Além disso, parte do tempo de algumas pessoas é investido em ficar elaborando um backlog e roadmap longínquo de funcionalidades ou previsões do que se imagina que irá acontecer no futuro. Não que isso por si só seja falho, porém sabemos que planos funcionam mais para refletirmos sobre o problema presente do que acertar sobre soluções futuras.

Se reconhecermos que não temos o poder de prever, podemos encarar nossos próximos projetos como apostas com apetite definido de quanto tempo desejamos investir.

“O trabalho se expande de modo a preencher o tempo disponível para a sua realização” ー Lei de Parkinson

Esse processo tenta minimizar as dores comentadas até aqui.

Saímos da ideia de prever quanto tempo algo demorará para quanto tempo estamos dispostos a investir para tentar fazer algo.

Se nesse apetite a implementação deu certo, maravilha. Partimos para a próxima aposta e acompanhamos os efeitos da implementação. Se não deu certo, ficamos com a consciência um pouco mais leve: não gastamos mais tempo do que desejávamos e aprendemos algo. Agora, é partir para a próxima aposta.

Isso não significa que abriremos mão de uma estratégia, porém usaremos ela como um delimitador que nos aponta a direção e os limites, não o destino e passos exatos.

Nesse processo há dois ciclos distintos: um de foco e um de fôlego.

Foco para o trabalho direcionado e fôlego para reflexão, aprendizado, descanso e novas experiências.

Estratégias utilizadas no processo

  • Estratégia acima de metas.
  • Apostas sob demanda acima de planos futuros.
  • Período de tempo fixo acima de escopo fixo de tarefas.
  • Trabalho assíncrono acima de trabalho síncrono.
  • Times dinâmicos por projetos em vez de times fixos.
  • Foco e fôlego em vez de produtividade máxima constante.

Linha do tempo do processo

Padrões do processo

1. Papéis ativos no processo

1.1. O processo possui seis papéis pré-definidos: decisora, modeladora, desenhista, implementadora, líder de implementação e investigadora. Isso não significa que outros papéis não possam existir e colaborar. Exemplo: papéis relacionas a dados, conteúdo, marketing, etc.

1.2. Uma pessoa pode atuar em mais de um papel. E um papel pode ter mais de uma pessoa.

1.3. A decisora tem a responsabilidade de definir uma estratégia de foco pro ciclo e apostar nas ideias modeladas trazidas para a mesa de apostas.

1.4. A modeladora tem a responsabilidade de apresentar propostas modeladas para a mesa de aposta, levando em conta tudo que a investigadora possui de conhecimento e mantendo atenção numa experiência fluída e simples, e também considerando o conhecimento de desenhistas e implementadoras.

1.5. A desenhista tem a resposabilidade de fazer os desenhos das ideias apostas e, quando convidada, ajudar a modeladora fazer rascunhos das ideias modeladas e ajudar as implementadoras com as dúvidas levantadas ou pendências de artefatos.

1.6. A implementadora tem a responsabilidade de implementar ideias modeladas que foram apostadas e atualizar o estado dos escopos que está implementando. Além disso é esperado que apoie desenhistas e implementadoras tirando dúvidas.

1.7 A líder de implementação tem a responsabilidade de apoiar a coordenação de um projeto que passou pela aposta, dar visibilidade do progresso de implementação dos escopos e tentar remover obstáculos do projeto.

1.8. A investigadora tem a responsabilidade de entender o que o público-alvo e o negócio precisam.

2. Ciclo de Foco

2.1. O ciclo de foco se prolonga por algumas semanas consecutivas onde acontecem três trilhas paralelas: modelagem, implementação e investigação. É sugerido o experimento com 6 semanas consecutivas.

2.2 Mantenha o foco nas responsabilidades principais. Evite interromper as implementadoras no seu ciclo de foco com outros projetos.

2.3. Trilha de modelagem

2.3.1 As modeladoras são responsáveis por esta trilha.

2.3.2. A trilha de modelagem possui momentos distintos: submissão de ideias, seleção de ideias, modelagem, aposta e desenho.

2.3.2.1. Modelagem e mitigação de riscos

2.3.2.1.1. As modeladoras usarão a estratégia declarada pelas decisoras e as reações de votos para selecionarem quais ideias modelarem. Apesar da estratégia e votos darem uma direção do que escolher, é possível apostar em outras ideias, nas quais as decisoras poderão selecionar ou descartar na mesa de apostas.

2.3.2.1.2. O número de ideias selecionadas é relativo ao número de ideias que poderão ser apostadas por período. Porém, modele mais ideias do que é possíve apostar, pois algumas ideias serão descartadas na mesa de apostas.

2.3.2.1.3. As ideias selecionadas para o ciclo são modeladas em 3 semanas. Nesta etapa as modeladoras convidam representantes desenhistas e implementadoras para mitigar riscos. É possível que as modeladoras peçam ajuda para fazer um rabisco bruto da solução.

2.3.2.1.4. Ideias muito complexas ou arriscadas podem ser modeladas ao longo de mais de um ciclo de foco. Decisoras podem pedir para modeladoras, ou as próprias modeladoras podem optar, para continuar modelando ideias e mitigando riscos sem colocar para aposta de implementação em um ciclo de foco específico. Exemplos nesse contexto podem ser novos produtos ou funcionalidades mais complexas. Nesses casos, as modeladoras têm autoridade para pedir às desenhistas a criação de protótipos com mais fidelidade para experimentação com público (interno ou externo), em vez de rabiscos, como seria o esperado por padrão. E, por isso, há liberdade de convidar desenhistas para realizar trabalhos de desenho fora do período padrão, que comumente seria logo após uma ideia ser selecionada para implementação na mesa de apostas.

2.3.2.1.5. Cada ideia recebe um apetite classificado como pequeno ou grande, com um período de tempo fixo para cada um deles. Uma sugestão é utilizar 2 semanas para apetite pequeno e 6 semanas para apetite grande.

2.3.2.2 Mesa de apostas

2.3.2.2.1. A mesa de apostas acontece no início da quinta semana do ciclo de foco.

2.3.2.2.2. É um evento síncrono, onde algumas ideias modeladas são selecionadas e outras descartadas.

2.3.2.2.3. As ideias descartadas irão para uma lista arquivada sem qualquer expectativa de realizá-las algum dia. Não há ‘backlog’. Quem tiver interesse em ver uma ideia melhor estruturada ou adaptada para uma outra mesa de apostas, salva essa ideia para si e faz observações ou justificativas para submeter em outro ciclo novamente.

2.3.2.2.4. As decisoras são responsáveis pela seleção de ideias que serão desenvolvidas no próximo ciclo de foco . É sugerido que tenham no máximo 3 pessoas que possuam autoridade no direcionamento de produto para a mesa de apostas, preferencialmente com perspectivas e competências diferentes (ex: produto, tecnologia, desenho, dados, etc).

2.3.2.2.5. Qualquer pessoa interessada pode assistir. Um convite é enviado para todas as pessoas da organização para assistir a este evento online e entender os critérios de seleção utilizados. O evento pode ser gravado para que assistam assincronamente.

2.3.2.3. Desenho de telas

2.3.2.3.1. No início da quinta semana, há 2 semanas para desenhar as telas. Algumas desenhistas são convidadas para essa etapa e ficam responsáveis para o desenvolvimento e entrega dos artefatos de alta fidelidade.

2.3.2.3.2. As implementadoras devem ter todos os artefatos e informações necessárias para a implementação.

2.3.2.4. Agrupamento de ideias e formação de times

2.3.2.4.1. O agrupamento de ideias e formaço de times acontece no fim da sexta semana de foco.

2.3.2.4.2. Ideias com pequeno apetite (ex: 2 semanas) são agrupadas com outras ideias até que se igualem ao tempo de ideias com grande apetite (ex: 6 semanas) e se torne uma proposta combinada.

2.3.2.4.3. Uma decisora, que conheça os sistemas e as pessoas bem o suficiente, faz a formação dos times e distribui as pessoas entre os projetos de acordo com as habilidades, conhecimento e desejo de atuação. Quando possível, incentive auto-formação de times, onde as pessoas escolhem onde desejem atuar e as decisoras contribuam apenas na resolução de conflitos ou coordenando lacunas.

2.3.2.4.4. Uma decisora seleciona uma implementadora como líder de cada projeto.

2.3.2.4.5. Após essa etapa o ciclo de fôlego se inicia.

2.4. Trilha de implementação

2.4.1. No início do ciclo o time avalia toda a descrição do projeto e registra todas as suas dúvidas. A modeladora do projeto pode responder assincronamente ou marcar uma reunião síncrona de início de projeto para tirar todas as dúvidas e ajustar o que for necessário.

2.4.2. Cada time tem autonomia para adaptar o escopo, porém ainda resolvendo o que o projeto propõe para caber dentro do ciclo de foco e realizar a entrega.

2.4.3. Mantenha times pequenos. Quanto mais implementadoras por projeto mais difícil a coordenação de tarefas. Experimente um grupo enxuto de de 2 a 3 implementadoras.

2.4.4. Nos primeiros dias é esperado que façam um mapeamento de escopos, entendam com mais profundidade a proposta e listem as primeiras tarefas. Não há expectativa de conclusão de tarefas de implementação nesses dias.

2.4.5. Após iniciarem a implementação de tarefas, ainda é esperado que novas tarefas continuem surgindo conforme os desafios do mundo real e mais entendimento vão ganhando forma.

2.4.6. Conforme o projeto progride, a líder de implementação compartilha atualizações dos escopos e do projeto como um todo periodicamente com pessoas interessadas.

2.4.7. Ao fim de um ciclo de foco, a líder de implementação compartilha o que foi implementado, compartilhando imagens ou vídeos para demonstrar, e informações que expliquem o que era esperado e como está funcionando. Também compartilha o que foi cortado do escopo ou adaptado. Caso não tenha sido entregue, levanta os obstáculos que apareceram e alinha expectativas de qual será o próximo passo.

2.4.8. Desenhistas participam sob demanda caso sejam necessários mais artefatos ou adaptações.

2.4.9. Modeladoras dão assistência conforme surgirem dúvidas e podem ajudar em decisões.

2.5 Trilha de investigação

2.5.1 As investigadoras são responsáveis por essa trilha.

2.5.2 Nessa trilha acontecem atividades como pesquisas, entrevistas, análise de dados e de chamados do suporte. Além disso também é indicado a compilação, estruturação e atualização de informações de tal forma que possam ser consultadas e compartilhadas entre as pessoas.

3. Ciclo de Fôlego

3.1. Após o ciclo de foco, há algumas semanas consecutivas de fôlego. Sugestão de 2 semanas para este ciclo.

3.2. O ciclo de fôlego é um tempo destinado a descanso, inspiração, experimentação e aprendizado. Pode ser um tempo livre —incluindo dias de folga — ou um tempo com uma estrutura e artefatos mínimos que potencializem aprendizado & desenvolvimento, descanso, experimentação de ideias, refinamentos de arquiteturas, inspiração e aprendizado. É um momento oportuno para: dinâmicas como “Hack Week” ou “Hackaton”, conforme interesse das próprias pessoas; pesquisa de clima; revisões de arquitetura de sistemas e design; etc.

3.3. Submissão de ideias na primeira semana

3.3.1. Qualquer pessoa pode submeter ideias incubadas. Se nenhuma ideia é enviada, as modeladoras ainda possuem responsabilidade de ter propostas modeladas para a mesa de apostas, porém quando possível aproveitarão a diversidade de perspectivas das pessoas da organização para explorar outras ideias.

3.3.2. Espera-se que as ideias submetidas tenham passado por período de incubação e deliberação antes da semana de submissão. A semana de submissão de ideias é uma oportunidade para levá-as à mesa de apostas e não um período para inventar ideias do nada, sem contexto ou reflexão.

3.3.3. Ideias descartadas em outros períodos de apostas podem ser submetidas novamente, acreditando que faça sentido para esse momento.

3.3.4. Uma ideia precisa ter qual o problema deseja resolver ou qual oportunidade de negócio que percebe, uma descrição rápida e, opcionalmente, um rascunho do que seria a solução.

3.3.5. Após cada início de ciclo de foco, haverá uma semana para todas as pessoas votarem em quais ideias gostariam de ver avançar para modelagem.

3.4 Votação em ideias na segunda semana

3.4.1. Durante uma semana, qualquer pessoa pode votar nas ideias submetidas.

Regras simples para desenho

  • Antes das apostas, foque em rabiscos e não em protótipos. O propósito é tornar algo mais concreto para entendimento, mas não especificar detalhes do que será desenhado posteriormente, por alguns perigos: (a) pode ser que a proposta não passe pela mesa de apostas e o investimento de tempo não terá valido a pena, (b) pode ser que a discussão na modelagem ou mesa de apostas orbitem assuntos secundários que não deveriam estar contido no momento: como cor, proporção e laytout e (c) pode ser que outra pessoa seja selecionada para desenhar os detalhes após a aposta. Se tiver especificidades reduzirá a autonomia e criatividade da pessoa responsável pelo desenho final.
  • Experimente ao menos dois tipos de rabiscos. (1) Diagrama de palavras com setas conectando algumas tópicos a outros, indicando fluxos e estados, e também (2) rabiscos usando formas geométricas simples e brutas, com pincel grosso para evitar que você caia na tentação de desenhar detalhes ou escrever textos.
  • Após uma proposta ser selecionada na mesa de apostas, inicie os desenhos pensando nos elementos que permitam interação e relação com o usuário (affordances), em vez de iniciar por customização de fontes, cores, espaçamentos e detalhes de layout.

Regras simples para implementação

  • Mapeie os escopos. Divida o projeto em escopos. De acordo com Ryan Singer, autor do livro ShapeUp, “os escopos refletem as partes significativas do problema que podem ser concluídas de forma independente e em um curto período de tempo — alguns dias ou menos. Eles são maiores que tarefas, mas muito menores que o projeto geral”.
  • Comece por algo central e importante nos primeiros dias. Procure por algo pequeno e novo, que nunca fizeram antes.
  • Integre continuamente. Minimize riscos e integre ‘frontend’ e ‘backend’ continuamente desde o início.
  • Entregue o quanto antes. Não espere para finalizar algo no último dia, o quanto antes entrega mais fácil é corrigir falhas, documentar e compartilhar.
  • Evite débitos técnicos. Não se aventure em algo pela metade. O amanhã é incerto e não há garantia que terão apetite para investir tempo no débito que está deixando hoje.
  • Apresente entre a quarta e quinta semana do ciclo de foco. A maior e mais crítica parte já deveria ter sido implementada e integrada no produto até aqui. Receba reações com tempo suficiente para que juntos adaptem o escopo para conseguirem terminar no prazo do ciclo.

Perguntas e respostas

Como iniciar o experimento com este processo?

Procure conversar com os times que estão mais sofrendo com o processo de produto atual, apresente esse processo a eles e veja como ele poderia ajudar. Discutam.

Após isso, faça o convite: quais times estão dispostos a experimentar?

Pense na validação do próprio processo: o que é possível validar para mitigar riscos?

Alguns padrões para experimentar:

  • Ciclo de 6 semanas e 2 semanas de fôlego ainda seguindo todo o restante do processo atual da empresa.
  • Papéis desse processo mesmo sem mudar o restante.
  • Modelagem de iniciativas com apetite de 6 semanas ou de algumas iniciativas de 2 semanas para agrupar antes de implementar o processo para saber quais dificuldades aparecem.
  • Redução de reuniões em grupo durante o ciclo de foco e incentivo à comunicação assíncrona (com propostas modeladas, contextos nas interações e decisões documentadas).

Quando acontecem reuniões nos ciclos?

  • O trabalho assíncrono é padrão, e com isso, reuniões são desencorajadas, especialmente no ciclo de foco.
  • Reuniões síncronas no ciclo de foco acontecem em geral de duas formas: (1) pré-agendada com frequência determinada ou (2) sob demanda. Ambas como eventos rápidos (max. 30 min) e entre 2 ou 3 pessoas. No caso (1) são usadas para mentoria e apoio e no caso (2) para tomada de alguma decisão que não dá para aguardar resposta assíncrona ou que o assunto se tornou complexo entre as mensagens.
  • Todas as decisões realizadas em reuniões são registradas e compartilhadas para as pessoas poderem consultar posteriormente.
  • Reuniões e dinâmicas que envolvam mais de 3 pessoas acontecem por padrão no ciclo de fôlego.

Quais benefícios em ter um ciclo para foco com prazo fixo?

  • criação de uma urgência saudável que favoreça tomada decisões e adaptação do escopo para entrega em um período de tempo que decidiram investir na implementação. por terem ciclos e propostas definidos, evita uma cultura de urgência e pressão que tira a saúde e resiliência do sistema.
  • visão em túnel intencional temporária: priorizar o projeto em mãos, negligenciando demais tarefas. No livro UpStream o autor Dan Heath fala que “A primeira coisa a perceber é que “criar urgência” consiste basicamente em cooptar o poder do tunelamento para o bem. Em vez de tentar escapar do túnel — como ocorre com a discussão sobre folga, podemos tentar usar o foco extremo que ele fornece em nossa vantagem. Quem não foi mais produtivo — e mais motivado — ao declarar uma data limite (deadline)? Um prazo fornece urgência artificial a uma tarefa. […] À medida que o prazo se aproxima, você acaba descartando todo o resto e fazendo o que é preciso ser feito (get it done).”
  • evitar mudanças de contexto e realização de multitarefas. Mesmo breves bloqueios mentais criados pela troca de tarefas podem custar até 40% do tempo produtivo de alguém, de acordo com Meyer e outros pesquisadores.
  • evitar interrupções. Após uma interrupção, demora em média 25 minutos para retornar à tarefa original, de acordo com Gloria Mark.

Quais benefícios em ter um ciclo para fôlego?

  • evitar visão em túnel prolongada
  • garantir resiliência do sistema organizacional: a busca por produtividade máxima constante tende a comprometer isso
  • reflexão e aprendizado
  • saúde
  • sentir e responder com novas estratégias
  • experiências não planejadas
  • criatividade
  • engajamento com ideias e projetos temporários que as pessoas se interessam
  • desenvolvimento, mentoria, estudos e treinamento

Na pesquisa In Praise of Slack: Time Is of the Essence diz que “a folga organizacional, em termos de tempo e [recursos humanos] que não estão constantemente sujeitos a medidas de eficiência a curto prazo, é importante para as organizações que lidam com os desafios do século XXI […] As demandas futuras por flexibilidade estratégica e por integrar aprendizado e conhecimento em todas as organizações destacam a necessidade de reexaminar a importância do tempo no trabalho organizacional — e reconhecer que todos os recursos organizacionais não podem ser comprometidos com os esforços imediatos de produção, se quisermos ter tempo para prestar atenção, pense e se beneficie do conhecimento adquirido”.

O que falar sobre cultura de pressão e urgência contínua?

Recomendo a leitura do texto abaixo, refletindo sobre a questão de ter tempo para modelar uma proposta, tempo para foco sem distrações e tempo para fôlego:

Como saber se uma proposta está bem modelada?

A modelagem deve ser concreta o suficiente para que os times saibam o que fazer, mas abstrata o suficiente para que tenham espaço para resolver eles próprios os detalhes mais interessantes de acordo com a realidade e limites que encontram.

Ofereça às desenhistas e implementadoras um contorno dos limites e também autonomia para decisões específicas e renúncias (‘trade-offs’) de acordo com o contexto próprio encontrado ao desenhar e implementar a proposta.

Uma ideia bem modelada, em geral (depende do contexto e necessidade do time e organização), descreve:

  • a motivação para desenvolvê-la (problemas e oportunidades).
  • quais padrões são necessários na solução, sem dizer exatamente como será a solução específica na prática.
  • um rascunho com uma possibilidade de desenho e fluxo (primeira prova de conceito bruto). As desenhistas não precisam e nem são aconselhadas a seguir o rascunho da proposta. Ele serve apenas para visualizar o que é possível gerar a partir da proposta.
  • riscos mitigados. Para evitar que as implementadoras se percebam num caminho sem saída ou problemas técnicos difíceis de resolver, é indicado consultar uma implementadora que ajude a mitigar os riscos ainda na modelagem.
  • o que não fazer ou aprofundar. É comum desejarmos melhorar ou expandir algo para além da ideia principal. Por isso incentivamos a tentar prever possíveis desvios que possam acontecer e marcá-los como “não fazer”.
  • possíveis perguntas e respostas que podem ser levantadas por outras pessoas ao ler a proposta.

Exemplos de propostas

  1. Proposta de uma funcionalidade feita pelo Ryan Singer (estrategista de Produto da Basecamp) usando linguagem de padrões e um rascunho referenciando os padrões. Se desejar, assista ao vídeo dele escrevendo essa proposta.

Motivação:

Imagem extraída do vídeo “Shaping “Introductions” for Basecamp 4 and Writing a Pattern Language” do Ryan Singer (Basecamp)

O que se espera com a proposta:

Imagem extraída do vídeo “Shaping “Introductions” for Basecamp 4 and Writing a Pattern Language” do Ryan Singer (Basecamp)

2. Proposta bruta inicial do Hey World feita pelo Jason Fried (CEO da Basecamp) no produto Hey. Veja o tweet dele sobre isso. Observe que apesar de conter limites, ainda é aberta o suficiente para desenhar e implementar.

Essa é uma imagem recortada da proposta. Ainda assim, possivelmente ela não continha todos os tópicos que comento mais acima para uma proposta. E esse é um ponto importante: tenha o que for necessário para o seu contexto e necessidades.

Uma das primeiras propostas internas do Jason Fried (Basecamp_ que levou ao Hey World

Uma reflexão sobre diferentes níveis de abstrações ao modelar uma proposta

Abaixo darei exemplos de níveis de abstrações, não de propostas modeladas, para demonstrar o quanto impacta em direção e decisões locais.

  1. Fazer um serviço que permita as pessoas planejarem paradas ao se locomover de carro.
  2. Criar solução para quando alguém está planejando as paradas para chegar a um destino a tempo e deseja:
    > determinar a sequência ideal para fazer as paradas;
    > determinar a quantidade de tempo adicional para fazer as paradas;
    > determinar se há estacionamento disponível nas paradas.
  3. Aqui está o diagrama completo e todas as atividades que serão necessárias executar para desenvolver o produto que permite pessoas planejarem paradas para chegar a um destino a tempo.

O nível 1 pode ser muito abstrato e faltar informações, não oferecendo limites e direção. O nível 3 seria muito detalhado e específico, não oferecendo oportunidade de decisões contextuais.
O nível 2 tenta oferecer amplitude para descobertas e experimentos contextuais e limites que dão direção e alinham expectativas.

O que fazer quando não for possível desenhar as telas e artefatos necessários dentro de 2 semanas após a mesa de apostas?

Há vários tipos de projetos, alguns que demandam mais tempo e esforço de implementação, mas também alguns que demandam mais tempo e esforço da parte de desenho. Para esse último caso, quando não for possível terminar o trabalho de desenho nas duas semanas após a mesa de apostas, há algumas opções:

  • manter as desenhistas que iniciaram o trabalho em um ciclo de foco ainda alocadas no projeto quando iniciar a implementação no próximo ciclo de foco. Elas continuarão os desenhos em paralelo ao trabalho das implementadoras, resolvendo o que estiver pendente na ordem que melhor atenda a implementação.
  • convidar mais desenhistas para ajudar nos desenhos dentro das 2 semanas assim que perceberem que não será possível entregar com o número atual de desenhistas. Isso envolve um risco de mais coordenação do trabalho. Por isso é importante tentarem dividir escopos explícitos para facilitar o trabalho assíncrono.

O que fazer quando não for possível terminar a implementação de um projeto dentro do ciclo de foco?

Em raros casos, alguns projetos que não terminaram no ciclo de foco poderão ser estendidos para uma semana do ciclo de fôlego.

Para essa exceção é necessário que as tarefas pendentes sejam extremamente necessárias, não exista mais perguntas em aberto nem problemas a ser resolvidos.

Qualquer aspecto desconhecido e importante no projeto nesse momento demonstra um problema de modelagem ou um buraco no conceito. É perigoso se arriscar na continuação de projetos assim após as semanas determinadas para o ciclo. O indicado é parar o projeto e colocá-lo para modelar novamente e enviar para próxima mesa de apostas, se acreditarem que seja uma solução importante.

Mesmo que os critérios sejam atendidos para estender um projeto, a opção padrão ainda é interromper. A semana de fôlego é importante para os times.

O que fazer quando deseja lançar um novo produto que agrupe funcionalidades que não cabem em um ciclo?

Se questione o motivo de desejar mais de um ciclo de foco para lançar algo.

Se esforce para que a solução implementada em apenas um ciclo resolva uma dor importante o suficiente para que alguém com a dor consiga perceber os benefícios imediatos com a solução.

Ainda assim, é possível que você deseje agrupar mais funcionalidades para se diferenciar no mercado e permitir o produto resolver uma dor de forma mais ampla e crucial para o público.

Pode iniciar experimentando a solução implementada em apenas um ciclo dentre as colaboradoras da própria empresa, antes de lançar, ou com algumas pessoas selecionadas do público. Posteriormente é possível ir implementando outras funcionalidades nos próximos ciclos de foco e lançando para grupos maiores de pessoas até lançar para todo público.

Enquanto isso vá colhendo reações das pessoas: está resolvendo o que imaginava? Ainda faz sentido apostar novas propostas nesse produto?

O que fazer com defeitos ou débitos técnicos?

Eles podem entrar como propostas para serem modeladas e se tornarem projetos para o próximo ciclo de foco, disputando seu valor com outras propostas.

Também é possível trabalhar neles durante o ciclo de fôlego conforme desejo das próprias pessoas. É necessário avaliar riscos para isso.

Uma outra opção é ter pessoas focadas na correção de defeitos e débitos técnicos de tempo em tempo e de forma rotativa, participando de ciclo de foco, porém separadas exlusivamente para isso.

Como avançar arquitetura de desenhos (ex: design system) e sistemas internos ou externos?

Algumas possibilidades:

  • ideias de melhoria e atualização de arquiteturas enviadas para mesa de apostas.
  • times temporários exclusivos para rodar em paralelo a um ciclo de foco para melhorar e atualizar as arquiteturas conforme demanda. ou times dedicados.
  • usar o tempo do ciclo de fôlego para isso conforme desejo e engajamento das próprias pessoas.

Como compartilhar atualizações de implementação e entrega?

É importante que outras pessoas e times saibam do progresso dos projetos. Algumas formas de compartilhar enquanto está implementando são:

  • atualizar algum quadro de rastreamento de escopos (um tema ou épico dentro de um projeto do ciclo, que contém tarefas com afinidade). Tente dar visibilidade se o escopo ainda está em fase de descoberta e entendimento ou já está em fase de implementação.
  • compartilhar com os times uma nota resumida do que progrediu do projeto, buscando citar quais escopos avançaram na implementação ou descoberta, e quais estão com obstáculos.

Após a entrega de um projeto:

  • atualizar o estado do projeto na ferramenta que estão se organizando.
  • compartilhar com os times o que foi implementado, compartilhando imagens ou vídeos para demonstrar, e informações que expliquem o que era esperado e como está funcionando. E também, compartilhar o que foi cortado do escopo ou adaptado.

Quais referências podem ajudar na trilha de investigação?

Abaixo estão alguns links que podem ajudar a explorar o espaço do problema, o qual desejamos saber e aprender mais:

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