Análise de sobrevivência: o básico

Thomas Freud
thomasfreud
3 min readApr 10, 2020

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No texto sobre planos de pensão elaboramos um modelo bem mais realista a partir do exemplo apresentado quando tratamos sobre o que são fundos de pensão. Para calcular o valor estimado de um benefício de aposentadoria, o modelo desenvolvido serve muito bem como exemplo. Entretanto, quando consideramos o trabalho de um atuário, isso é apenas uma pequena parte do conjunto.

Um dos aspectos mais fascinantes da ciência atuarial é a característica que ela tem de combinar a matemática financeira com o estudo das probabilidades. A partir desta combinação, todo o trabalho atuarial — inclusive no contexto de um fundo de pensão — evolui. Entretanto, a probabilidade é uma área vasta da matemática, com diversas aplicações, fazendo muitas vezes com que nos percamos nesse universo. Felizmente, quando tratamos estritamente de aposentadorias — por hora não vamos abordar outros tipos de benefícios como pensões por morte ou invalidez — podemos simplificar bastante as coisas, afinal a simplicidade é a essência da vida.

Portanto, em um primeiro momento o atuário trabalha com análise de sobrevivência, a qual sustenta boa parte de seus resultados sobre probabilidades. A análise de sobrevivência é um campo dentro da estatística que estuda o tempo esperado que demora até que algo falhe ou deixe de funcionar ou ainda que um indivíduo morra. Os exemplos são os mais vastos possíveis: quanto tempo leva, em média, até que uma lâmpada queime, ou um motor pare, ou que partes de uma máquina deixem de funcionar, ou que alguém — gente ou bicho — venha a morrer.

Esse último exemplo é de particular interesse para os atuários. Quando um fundo de pensão é instituído, as aposentadorias, em geral, são pagas em forma de “mensalidades” vitalícias, o que significa dizer que, ao se aposentar, o indivíduo passa a receber seu benefício pelo resto de sua vida. Pois bem, quanto dura “o resto de sua vida” é uma pergunta crítica. Muitos conhecem a história de Jeanne Calment, conhecida como a pessoa mais velha já registrada e que viveu até os 122 anos.

Quando contava com a idade de 90 anos Calment fez um acordo de venda de seu apartamento para um advogado francês, sob a condição de que ela viveria no imóvel até sua morte, depois disso o advogado ficaria com a propriedade. Além disso, ficou acordado que ele lhe pagaria, pelo resto de sua vida, a soma de 2500 francos por mês. O fato é que o advogado morreu, sua viúva continuou a fazer os pagamentos dos 2500 francos mensais, e no final, quando Calment morreu aos 122 anos de idade, estima-se que o apartamento tenha custado a família mais que o dobro de seu valor.

Essa história exemplifica bem a importância da análise de sobrevivência, sobretudo em um contexto que envolve pagamentos vitalícios e grandes somas de dinheiro — considere um fundo de pensão que terá que pagar aposentadorias para centenas de beneficiários. O atuário faz estudos de sobrevivência sobretudo para estimar a possibilidade de eventos tais como esse. Teoricamente, quanto mais longeva for a vida de um beneficiário, mais longo o fluxo de pagamentos de benefícios e, portanto, maior a despesa para o fundo e também o risco.

Considere que o símbolo (x) pode ser lido: uma pessoa de idade x. Logo, (30) representa uma pessoa na idade de 30 anos. Tx significa o tempo de vida de (x) até que sua morte ocorra. Em símbolo podemos escrever como segue:

O símbolo pode ser lido como “a probabilidade de que (x) morra até completar a idade x+t. Ou, conforme a igualdade abaixo: “a probabilidade de um indivíduo de 30 anos morrer nos próximos 5 anos.

Mas vamos nos deter a função de sobrevivência, que seria o complementar daquela função. Deve ser lida como “a probabilidade de um indivíduo de x anos sobreviver, pelo menos, até x+t anos.

Esse é um símbolo comum em trabalhos atuariais, inclusive existe uma notação atuarial padrão internacional. Geralmente, atuários trabalham com tábuas de sobrevivência, na qual constam probabilidades de sobrevivência tabuladas, para todas as idades até um determinado limite. Esse limite é chamado de ômega da tábua, e corresponde a idade teórica a partir da qual ninguém sobrevive.

Na segunda parte desse texto, vamos desenvolver as funções de sobrevivência à luz da teoria atuarial.

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Thomas Freud
thomasfreud

PhD Student, Actuary and master in statistics and probability | Accounting bachelor's degree.