Como é trabalhar como Front-end Developer e Designer de Interação, por Talita Pagani

William Oliveira
Training Center
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9 min readAug 7, 2017

Esse post é parte de uma série de entrevistas para o Training Center sobre o que um profissional pode dizer sobre sua área de atuação visando mostrar para outras pessoas como é trabalhar no que fazem, esclarecendo para algumas pessoas se elas se dariam bem trabalhando na área ou mesmo só para mostrar para outras pessoas como é trabalhar com isso.

Introdução

Olá, sou a Talita Pagani, programadora por formação e designer por paixão. Tenho 29 anos, sou bacharel e mestre em Ciência da Computação, possuo especialização em gestão de projetos e trabalho há 12 anos na área de TI. Atualmente, sou designer e front-end developer na Nexaas, uma empresa muito bacana do Rio de Janeiro que está expandindo sua atuação em São Paulo. Tenho também a minha própria empresa que ainda está “engatinhando”, a Utilizza — Design de Interação, especializada em consultoria de acessibilidade e UX.

Em pouco mais de uma década, atuei em diversas áreas de desenvolvimento de software para a web, incluindo a antiga função de web designer, front-end, analista de teste (uma das mais transformadoras em minha carreira), analista de requisitos e assistente de gestão de projetos. Nessas atuações variadas e que parecem não estar relacionadas, sempre houve um elemento comum: minha preocupação com a experiência de uso dos projetos. UX é sempre uma prioridade, independente da qual função em que eu esteja.

Como você conheceu as áreas de front-end e design de interação?

Em 2001, aos 13 anos, eu comecei a criar meus primeiros sites que eram sempre dedicados a temas que eu me interessava, como bandas ou animes. Eu queria entender como podia compartilhar conhecimento e como tornar de fácil acesso informações relevantes sobre esses assuntos, especialmente sobres os quais eu não encontrava muitos sites a respeito. Meus primeiros sites foram no HPG, Yahoo! GeoCities e MSN Communities e ainda não sabia mexer direito com HTML, usava os editores visuais dessas ferramentas.

Eu não ficava satisfeita com os layouts engessados desses editores e então comecei a criar páginas customizadas usando o FrontPage da Microsoft. Ainda era no modo visual, mas eu me intriguei quando entrei na aba de código e vi aquele emaranhado de coisas e comecei a querer aprender o que era aquilo. Fui descobrindo (D)HTML, CSS, um pouco de JavaScript. Isso me motivou a começar a fazer cursos profissionalizantes porque eu já tinha decidido seguir carreira nessa profissão de “criar sites”, algo que meu pai achava que era ilusão porque esse negócio de fazer site não dava dinheiro (99% rindo, mas aquele 1% chorando).

Fiz um curso básico de web design onde aprendi Dreamweaver e Flash, depois fiz um curso de Photoshop e comecei a criar layouts também, tudo ainda de forma amadora, lá pelos meus 15 anos. Em 2004 comecei um curso mais avançado de web design e desenvolvimento web onde também aprendi JavaScript, ASP e “banco de dados” Access. A primeira versão do meu site talitapagani.com era em ASP + Access e eu até desenvolvi um mini-CMS para gerenciar o conteúdo do site e do blog que tinha na época.

Em 2005 fui apresentada ao livro “Homepage Usabilidade: 50 Websites Desconstruídos” do Jakob Nielsen e isso mudou completamente a minha visão sobre o que era desenvolver websites, como havia questões que eu não me preocupava e eram cruciais para garantir uma boa experiência de uso (e na época nem conhecia o termo UX). Mesmo fazendo a faculdade de computação e já trabalhando com desenvolvimento web, eu passei a me preocupar também com usabilidade, arquitetura de informação (AI) e design de interação, porque eu também trabalhava com o projeto de design de interface e AI.

Isso tem sido meu foco até hoje: sigo codificando em front-end, mas também sigo trabalhando com o design de interação, usabilidade e UX, porque parto de um princípio de que é possível ser “designer que coda” e isso não é indecisão, não é ser unicórnio e nem é algo impossível de ser realizado com competência. Afinal, é importante entender as características técnicas do design que será implementado, assim como é preciso programar as interações do sistema de forma que beneficie a experiência das pessoas.

Por que você escolheu ser front-end developer e designer de interação?

Quando comecei como web designer — a pessoa que fazia do layout ao código, desenvolver sites também era uma atividade em que eu podia exercer criatividade e lógica em conjunto. Pensar em layouts que fossem atrativos mas também funcionais, layout imersivo e interatividade inovadora. A princípio, eu encarava como um hobby e montava sites de assuntos que eu gostava e queria ter um espaço para falar a respeito, em uma época em que não haviam blogs. Não achava que seguiria carreira na área e até me recusei prestar um “vestibulinho” para o colégio técnico de informática de Bauru (vinculado à Unesp). Poucos meses depois, me vi decidindo que era essa carreira que eu queria seguir.

Como comentei, eu cheguei a trabalhar também em outras funções. Em 2012 entrei na MSTECH como Programadora na carteira mas como Tester na prática e foi uma experiência que me ajudou a ser mais atenta à qualidade como desenvolvedora e designer. Em 2013, ainda na MSTECH, passei a atuar como assistente de gestão de projetos e no final de 2014 migrei para analista de negócios e requisitos, pois estava sentindo falta da parte técnica. Depois dessa experiência, eu vi que, mesmo tendo competência para gestão, não é o que me faz feliz. Eu sou técnica e resolvi voltar a atuar em funções técnicas.

Como foi o seu primeiro trampo?

A escola de informática em que eu fazia curso me indicou para uma entrevista e comecei um estágio de 12 horas/semana, três vezes por semana e não remunerado como web designer em uma instituição particular que oferecia cursos de pós-graduação. Cuidava de atualizações do site e fiz uma nova versão do mesmo.

Depois de seis meses, comecei um estágio no departamento de TI dos Correios de Bauru e aí é que eu começo a contar oficialmente o início da minha jornada profissional. Neste estágio, já vinculada à faculdade, pude aprender muito sobre desenvolvimento cross-browser (tínhamos que fazer tudo funcionar só no IE6), melhorei minhas habilidades de layout pois trabalhava no design da intranet, aprendi muito sobre back-end com ColdFusion e SQL Server e tive um grande aprendizado sobre JavaScript. Nessa jornada, recebi muito apoio do Fábio Mastelari, que também era estagiário mas tinha mais experiência em programação e me ensinou várias coisas sobre front-end. O trabalho nos Correios exigia uma grande responsabilidade e eu vejo que, em 1 ano e 2 meses de estágio, dos 18 aos 19 anos, amadureci não apenas como profissional mas também como pessoa, pois precisei aprender a lidar com pressão, prazos, cobrança e pessoas de diferentes tipos.

Quais são as skills de quem trabalha nesta área?

De modo geral, uma base bem fundamentada em conceitos. Conceitos primeiro, ferramentas depois.

Para front-end, é importante entender bem de HTML, CSS e JavaScript. E o entender bem vai além de escrita de código: entender a semântica do HTML, especialmente sobre acessibilidade, compreender o box-model e as particularidades do CSS, os paradigmas de programação suportados no JavaScript, melhores práticas de desenvolvimento (design patterns) e performance. Entender fundamentos de computação como estrutura de dados, redes (você desenvolve coisas que dependem de rede), sistemas operacionais e engenharia de software ajudam a ter uma perspectiva mais ampla sobre o desenvolvimento de soluções, sejam sites ou aplicativos. E isso tem uma mutabilidade muito menos frequente do que ferramentas. Se você sabe os conceitos, você consegue decidir a melhor ferramenta/framework para a sua necessidade.

Para design de interação, a mesma coisa: é preciso entender os conceitos sobre design de modo geral, design de interação, usabilidade e arquitetura de informação antes de qualquer ferramenta. E é preciso se interessar pelas pessoas e desenvolver a empatia. Não é necessário ser o “ás” da socialização. Quem me conhece sabe que não sou, inclusive. Mas você deve conseguir conversar com as pessoas, escutá-las, traduzir as suas necessidades e se colocar no lugar de usuários e clientes. Costumo dizer que a área de UX tem uma grande intersecção com a análise de requisitos, ambas têm valores comuns.

Quais são os principais desafios da área?

Manter-se atualizado frente a tantas mudanças tecnológicas. Quando voltei a atuar formalmente como front-end no final de 2015, me senti desatualizada sobre ferramentas, automatizadores, frameworks e o novo ecossistema. Isso me deixou em pânico! Cheguei a questionar minha competência, se eu conseguiria acompanhar. O que fui percebendo é que você não tem demérito por não dominar todos esses recursos. Foque em uma stack para se dedicar a estudar a fundo, mas mantenha-se informado sobre o que está ocorrendo e estude um pouco por fora para saber o básico sobre outras stacks.

Na área de UX e Design de Interação, o grande desafio ainda continua sendo convencer as empresas do valor da UX. Não tenho esse problema na empresa em que estou hoje, mas vi muito isso em outras empresas em que trabalhei e para as quais prestei consultoria. Falar com usuários reais, fazer pesquisa, testar a solução proposta: parecem coisas de outro mundo quando mencionamos nas empresas. Ainda é um “trabalho de formiguinha” mostrar que o processo de design economiza tempo, dinheiro e ajuda todo o time a desenvolver soluções melhores.

Outro problema comum a profissionais de tecnologia: o vício em trabalho, quando você vira um workaholic. Parece legal virar madrugada programando. Há uma cultura de startup e empreendedorismo que defende que isso é dedicação e propósito. Como disse a Susan Fowler em um tweet: “Trabalhar de 10 a 14 por dia não é trabalhar duro. É trabalhar de forma estúpida. Ninguém consegue usar seus cérebros com eficiência no mesmo problema durante muitas horas”. Acrescento ainda que isso mostra dois problemas: ou a pessoa não sabe gerenciar o tempo dela de forma adequada ou ela tem mais atividades do que pode suportar. Como uma pessoa que já teve algumas crises de burn out, recomendo que você saiba equilibrar vida pessoal e social com vida profissional. Passar tempo com pessoas queridas, sair da frente do computador, praticar o “nadismo” (a arte de não fazer nada) são importantes para calibrar nossas forças. E aprender a dizer não é importante também. Depois de quase 30 anos, estou aprendendo :)

Quais são as principais recompensas da área?

A principal recompensa é poder desenvolver soluções que têm potencial para mudar a vida das pessoas. Tecnologia é uma área coringa que serve a todos os setores e com a tecnologia podemos construir coisas incríveis para educação, saúde, meio ambiente, etc, e ajudar a mudar o mundo.

A comunidade de desenvolvimento e de UX também são grandes recompensas a quem está na área: fora uma desavença ou outra, são comunidades bem unidas em que a maioria das pessoas se preocupa genuinamente em compartilhar conhecimento e ajudar os demais colegas a evoluir na carreira. Os eventos da área são oportunidades de conhecer pessoas incríveis, fazer amizades e trocar conhecimento. Algo que muitas profissões tradicionais não têm.

A possibilidade de trabalhar remoto também é uma das melhores coisas que a profissão proporciona, pois permite maior qualidade de vida.

Você pensa em mudar de área?

No momento não, mas se tratando da área de tecnologia que está em constante evolução, não dá para prever o futuro. Será que o caminho ainda será ter front-end developers? Em um futuro próximo ainda teremos UX Designers ou essa função será ainda mais ramificada? Não sabemos, mas enquanto essas questões não são respondidas, posso dizer que encontrei meu momento na carreira assumindo que gosto igualmente de design e de código e consigo fazer os dois sem me sentir mal por isso, pois há muitos profissionais que duvidam que isso seja possível.

Por que alguém deveria se tornar um(a) front-end e/ou designer de interação?

Se você tem gosto por lógica, ama tecnologia, se interessa por desafios e tem vontade de desenvolver sites e sistemas web que sejam úteis e de fácil utilização, a profissão de front-end é o caminho para você.

Se você tem pézinho nas Humanas, gosta de entender as pessoas, quer resolver os problemas dos usuários de forma criativa, se preocupa em entregar um produto que tenha boa experiência de uso e agregue à vida das pessoas, então a profissão de UX pode ser para você.

Se você gosta das duas áreas, me abraça e vamos mostrar que dá fazer as duas coisas e não existe esse negócio de unicórnio!

Esta foi mais uma entrevista com profissionais da área de desenvolvimento de software. Outras entrevistas que você pode curtir: Consultor de TI, por André Baltieri, Coordenador de Sistemas, por Jhonathan Souza Soares, Quality Analyst Engineer, por Úrsula Junque, outro sobre Full-Stack Developer, por Ana Eliza, Front-End Developer, por Fernando Daciuk e muitos outros. Confere lá!

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William Oliveira
Training Center

Engenheiro de software frontend, escritor do livro O Universo da Programação (http://bit.ly/universo-da-programacao), periférico e bissexual