Estação Rio Grande da Serra

Quatro situações em que a CPTM avacalha com o patrimônio histórico

Apesar de alguns anúncios feitos nos últimos meses, não existe uma política consistente de turismo que envolva infraestrutura de transporte, serviços regulares e localidades estratégicas

COMMU
Trens Metropolitanos
7 min readJul 9, 2019

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Prólogo

Com o anúncio pelo governo da implantação de um trem turístico entre Santos e a capital paulista, que precisaria percorrer toda a Linha 10-Turquesa (Brás-Rio Grande da Serra), a despeito do mesmo governo posteriormente ter reafirmado o compromisso de conversão da Linha 10 em metrô (elevando o grau de segregação e os níveis de oferta, consequentemente inviabilizando serviços adicionais de padrão díspar), surgiu a ideia de dar continuidade à crítica feita quando a CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) realizou uma viagem de despedida para a série 1100: não existe uma política consistente de turismo que envolva infraestrutura de transporte, serviços regulares e localidades estratégicas.

1. Estação Júlio Prestes

A situação da Estação Júlio Prestes, terminal da Linha 8-Diamante é entristecedora. A estação apresenta infiltrações, é mal iluminada e está claramente subutilizada. Uma das plataformas apresenta uma exposição composta por painéis, mas a plataforma não pode ser acessada, logo, não é possível lê-los. A CPTM alegou em março que “como a Estação Júlio Prestes é tombada pelo CONDEPHAAT, são necessárias autorizações especiais para qualquer intervenção no prédio” e que “já iniciou essas tratativas, e se empenha em resolver a situação o mais breve possível”. A situação foi resolvida? Absolutamente não.

Infiltrações no hall de entrada da estação

Como noticiamos após reunião com o atual diretor-presidente da CPTM, Pedro Moro, a estatal não considera prioritária a questão da integração entre as estações Luz e Júlio Prestes, que poderia ensejar um projeto de reforma, restauro e modernização da última, no sentido de implantar acessos subterrâneos e um novo túnel entre ela e a Estação Luz. É evidente que o governo, ao subfinanciar a CPTM, está comprometendo uma série de projetos estratégicos.

2. Estação Rio Grande da Serra

A Estação Rio Grande da Serra é um exemplo relativamente antigo de descaso. Anos atrás reclamamos sobre a situação do telhado e, de lá pra cá, o aspecto geral da estação não mudou. As paredes seguem muito desgastadas, a escada de metal continua sem poder ser utilizada (a estrutura está comprometida pela corrosão), a plataforma que não é utilizada apresenta sinais de vandalismo e os sanitários absolutamente são terríveis.

Quando é feita a opção por não utilizar o Expresso Turístico para Paranapiacaba (por economia, falta de lugares ou desinteresse naquele tipo de serviço), trocando-o pelo transporte regular, é por Rio Grande da Serra que o acesso se dá, pois parte das imediações uma linha de ônibus até a vila ferroviária. Foi exatamente assim que nós fizemos em 2016, quando escrevemos um artigo sobre a vila (naquela oportunidade também criticamos de novo as condições da Estação Rio Grande da Serra).

Apenas em 2018, em virtude de um TAC (Termo de Ajuste de Conduta) firmado com o Ministério Público, a estação recebeu algumas obras de acessibilidade, conforme podemos ver nas fotos a seguir, tiradas em abril daquele ano. Nas fotos a CPTM deu início à remoção da passarela, porém, a falta de recursos, mais uma vez, se fez presente, comprometendo o restauro e reinstalação do equipamento.

Instalação de piso tátil e remoção da passarela metálica

É triste constatar que a estação não condiz com o potencial turístico de Paranapiacaba e que tem contribuído muito pouco para desenvolver o entorno no município em que está localizada.

3. O caso da Estação Franco da Rocha: prévia do que acontecerá com as estações Perus e Caieiras

Em 2014 a CPTM finalmente inaugurou uma nova, ampla e acessível estação no município de Franco da Rocha, Linha 7-Rubi (Luz-Francisco Morato-Jundiaí). Aquele edifício, combinado com algumas melhorias feitas pela prefeitura no Centro, bem como a evolução da qualidade da frota, que finalmente deixou de operar com trens de concepção obsoleta e rústica, foi, inegavelmente, uma grande vitória.

Tabela com as estações tombadas no trecho principal da Linha 7-Rubi. Observação: a data de inauguração nem sempre condiz com a data de inauguração do edifício atual

Mas nem tudo é digno de elogios: a antiga estação, tombada, perdeu utilidade e o aspecto só tem piorado ao longo dos anos. Um vídeo de janeiro de 2019 publicado no YouTube ilustra a situação da estação centenária:

Vídeo publicado pelo canal Maiqs Ferroviando SP

As duas estações outras estações também são patrimônios históricos protegidos e, se por um lado a CPTM precisa avançar com o programa de modernização e reconstruir as duas, por outro, a estatal precisa garantir de maneira planejada e intersetorial uma destinação aos edifícios históricos, de forma a não repetir a situação que tem sido observada em Franco da Rocha desde 2014, uma vez que o município, que está longe de figurar entre os mais ricos da metrópole, só previu oficialmente um conjunto de ações para o local em 2017, por meio do Decreto 2.595/2017, que entre as providências dadas em relação ao Sistema Municipal de Cultura de Franco da Rocha, previu:

Ação 22: Estruturar o centro de memória da cidade na antiga estação de trem.

[…]

Ação 60: Utilizar praças públicas, ruas, equipamentos públicos, quadras, campos de futebol, estação da CPTM, etc. para as atividades.

[…]

Meta 29: Restaurar a antiga estação de trem e implementar um Museu sobre a história da cidade em até 3 anos.

Ação 93: Celebrar um termo de cessão de uso entre a CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) e a Secretaria de Cultura.

Ação 94: Restaurar, estruturar e manter a antiga estação de trem.

Considerando que o vídeo é de janeiro e que o decreto é de 2017, Franco da Rocha ameaça não cumprir a 29ª meta, já que o prazo vence em seis meses. Triste, até porque aquela parcela da Linha 7-Rubi carece de equipamentos de cultura e lazer.

4. Atendimento à Aglomeração Urbana de Jundiaí

Na Aglomeração Urbana de Jundiaí (AUJ) temos mais estações tombadas numa extensão operacional, entre elas, a própria Jundiaí, atual terminal da Linha 7-Rubi. Os mesmos problemas citados na seção anterior se aplicam e se somam a algumas questões particulares à AUJ. Antes de prosseguirmos, porém, é preciso fazer um não tão pequeno parênteses sobre o que significa “extensão operacional” na prática: uma extensão operacional funciona estendendo o serviço da linha para uma parcela que possui características muito diferentes do trecho principal; o serviço numa extensão operacional não necessariamente deveria apresentar qualidade inferior em relação ao trecho principal, mas historicamente é o que ocorre.

Plataforma da Estação Jundiaí

Feitas as devidas considerações no parágrafo anterior, o que vale observar aqui é que nenhuma palavra foi dada pelo atual governo em relação às estratégias para as estações tombadas da extensão operacional.

Tabela com as estações tombadas da extensão operacional da Linha 7-Rubi. Observação: a data de inauguração nem sempre condiz com a data de inauguração do edifício atual

O Executivo, encabeçado por João Doria (PSDB), demonstra não ter interesse em implantar um sistema de VLT (Veículo Leve sobre Trilhos, termo que abrange os diferentes tipos de bondes modernos oferecidos pelo mercado) e insiste na implantação de um trem regional que aproveite a faixa de domínio e os trilhos pós-Jundiaí, que seriam cedidos pela concessionária em troca da renovação adiantada da concessão pelo governo federal. As duas questões foram discutidas no passado por nós, nos artigos “Concessão da Linha 7-Rubi: sobram dúvidas e incertezas” e “Linha 7-Rubi e o trem intercidades: uma proposta de conciliação”.

Pelo menos três dúvidas recaem sobre as estações da extensão operacional e o trecho em direção a Americana, que poderá ser utilizado para um serviço de caráter regional:

  1. Como ficam as estações históricas operacionais?
  2. Como ficam as estações históricas que talvez entrem em operação novamente, entre Jundiaí e Americana, ainda que não tombadas? (A ressalva é importante, pois apenas Campinas foi tombada)
  3. Como fica o VLT, considerado necessário pela CPTM após uma pequisa Origem Destino dedicada àquela aglomeração de municípios?

Seria interessante que a concepção de um serviço regional, seja em via exclusiva, seja mesclado com o metropolitano (como foi o caso na nossa proposta de conciliação, que buscou preservar a integridade da atual demanda da Linha 7-Rubi), considere desde o princípio o patrimônio histórico.

Finalmente, não podemos deixar de mencionar que um VLT poderia dinamizar o turismo e a economia, principalmente se fosse criado um ramal em direção ao Centro de Jundiaí, saindo da faixa de domínio para circular nas ruas, como acontece em sistemas de bondes europeus.

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por Caio César

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