Já vi esse post em algum lugar…

A busca por engajamento nas redes sociais passa pelo desafio de produzir conteúdo autêntico e original

Cláudia Flores
wewe
6 min readOct 14, 2020

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De vez em quando a gente cruza com conteúdos muito semelhantes — alguns praticamente iguais

Nessa semana, um post viralizou nas redes acusando a ilustradora Bruh Bandeira de copiar desenhos de outros artistas e postá-los em seu Instagram como originais. O post desencadeou uma chuva de ataques à ilustradora, que escreveu um post com essas palavras:

@iara_naika foi a inspiração dessa arte, eu achei genial a ideia e criei em cima disso, deixando com o meu traço, sinto muito não ter marcado a pessoa que inspirou a arte como sempre coloco e marco nas artes, sempre passo com isso com as minhas, no meu caso tiram meu nome, mas foi bom que tudo isso aconteceu, para eu não esquecer de GRIFAR BEM GRANDE A REFERÊNCIA quando eu utilizar :) Obrigada e sigam a artista :) Por mais gente compartilhando sobre campanhas e conscientização.

Estas são as imagens, publicadas pela própria ilustradora em seu Instagram:

Reprodução da Ilustração de @iara_naika / Reprodução da Ilustração de @imagineedesenhe

É fácil a gente sair de pronto julgando ou escolhendo lados, mas não é esse o propósito aqui. Se ficarmos nisso, deixamos passar um ponto tão importante quanto óbvio: usar formatos ou conteúdos criados por outras pessoas (seja como referência, com os devidos créditos, o que é aceitável, seja como reprodução sem autorização ou plágio, crimes previstos em lei) é uma prática normalizada na internet. Antes de ser viral, GIF, meme, sticker ou challenge, um conteúdo é necessariamente criação de alguém. E a gente usa e reproduz o tempo todo sem saber de onde veio — seu autor, suas fontes, e até mesmo sua veracidade.

Sorria, seu conteúdo pode estar sendo reproduzido por aí sem os devidos créditos.

Sobre isso, existem duas grandes premissas da criação de conteúdo digital: a primeira é que o criador de conteúdo, para ser considerado relevante por seus seguidores e crescer de forma constante, deve ser autêntico, e isso requer produzir conteúdo original. A segunda é que, uma vez que um conteúdo cai na internet, o autor tem pouquíssimo controle sobre onde sua criação vai chegar.

A newsletter da YOUPIX da semana passada lista a autenticidade como uma das três principais práticas para influenciadores se destacarem na multidão:

É aquele ditado: “nem todo conteúdo autêntico tem sucesso, mas todo conteúdo de sucesso é autêntico”. Autenticidade tem a ver com o que as pessoas sentem de você, não é algo que você autointitula. O que você faz para as pessoas sentirem que você é autêntico? Para isso, é preciso ser: real, significativo, original e útil.

Esse não é um post sobre direitos autorais, mas vale lembrar que qualquer obra intelectual — de um livro até uma ilustração digital — pode oficialmente ser registrada. Esse processo, porém, é burocrático e a gente sabe que a maioria dos criadores não registra oficialmente seus conteúdos publicados. Provas de originalidade, na era digital, muitas vezes são prints de conteúdos ou diálogos, vídeos registrando processos criativos, etc.

Falando em registros, lembrei de um tweet recente da influenciadora Alexandra Gurgel, do canal body positive Alexandrismos:

Reprodução do Twitter da @alexandrismos

Imagina só: você dá uma ideia super inovadora e criativa num trabalho seu, e por algum motivo ela não se concretiza. Tempos depois, você vê sua ideia ganhar o mundo e — vejam só — você não recebeu nem um centavo, ficou sem os créditos, e nem um “obrigado” levou. Quantas vezes isso deve ter acontecido antes da era digital, na história da arte, da academia ou da comunicação? Hoje, com a rapidez com que um conteúdo viraliza, fica bem mais fácil de isso acontecer (e você sequer ficar sabendo que aconteceu).

Quem (não) quer hitar?

Mas esse assunto vai além do universo dos influenciadores, artistas, agências ou marcas. Basta produzir conteúdo original, criativo, atraente para ser notado. O lado positivo? Tornar-se referência. O lado negativo? Ser vítima de plágio.

Cancelamentos à parte, todo plagiador deveria ser responsabilizado, mas nem sempre é o que acontece. Nas redes, muita gente tenta se proteger aplicando marcas d’água ou logos para evitar reposts sem créditos, mas é fato: copiar é bem mais fácil que criar. Facebook que o diga.

Principais buscas por marca d’água, recurso para proteger de cópias (Google Trends)

Quando se fala de conteúdo digital, porém, copiar nem sempre é considerado negativo. Muitas vezes, ao criarmos conteúdos, nos inspiramos em estilos de fotos que alguém fez antes, em formatos de vídeo que viralizaram nas redes. A produção de conteúdo hoje é bastante ancorada em formatos de referência. É só abrir o Pinterest, o TikTok, o Instagram, o Twitter, o YouTube para ver conteúdos que viralizam o tempo todo, e todo mundo passa a copiar. E quem não quer virar inspiração?

Às vezes, ser referência na internet é tudo o que algumas pessoas desejam, e fazem tudo para virar hit (inclusive copiar integralmente posts dos outros como se fossem seus, o que no Twitter já é verbo tradicional: “kibar”).

Reprodução / Twitter

Somewhere over the bubble

Os algoritmos das redes sociais também nos ajudam a ter aquela sensação de “já vi esse mesmo post em algum lugar”. Quanto mais a gente interage com determinado assunto ou tipo de perfil, mais as redes nos oferecem um pouco mais do mesmo conteúdo, trazendo aquela sensação de que “nossa, tá todo mundo falando desse assunto, vou falar também pra não ficar de fora”. Será que é todo mundo mesmo, ou é um gatilho que nos incentiva a falar dos mesmos assuntos que os outros pela necessidade de pertencer?

Leiam também: Por que precisamos falar sobre “O Dilema das Redes”, da Netflix

Sobre esse tema, vale indicar outra newsletter bem bacana: a Bits to Brands, da Beatriz Guarezi, falando sobre as definições de slow content, um conceito muito novo e aparentemente pouco praticado por quem cria conteúdo, mas que nós — minha dupla Terena Miller, eu e nosso projeto wewe — temos procurado praticar como forma de sair da bolha, de lidar com o F.O.M.O. e estabelecer uma relação menos tóxica com o conteúdo que criamos. Porque produzir conteúdo criativo, original, autêntico, relevante dá trabalho. Como diz a Beatriz em sua newsletter: “quem sabe, de tanto puxarmos o freio, as coisas não desaceleram um pouco?”

Só vai acontecer se a gente praticar.

Para ler também: Quantas pausas tem na sua produção de conteúdo?

Como manter uma produção de conteúdo original

  • Sinalize todo e qualquer repost com o perfil original;
  • Se alguém te inspirou a criar um conteúdo, mencione a referência. As minhas para esse post foram as acusações que postei aqui sobre “roubos de ideias/trabalhos”, e também a news da Youpix falando sobre autenticidade;
  • Ao partir de uma referência para criar, pense: de que forma posso incluir minha própria interpretação e acrescentar algo novo que essa referência não tem? O que torna meu conteúdo único e autêntico? Trazer identidade a um conteúdo é a melhor forma de preservar seu caráter original, mesmo que parta de uma referência;
  • Se for compartilhar frases ou textos de alguém, coloque entre aspas e dê os créditos, não há nada de errado em buscar inspirações e referências em outros trabalhos, desde que sejam sinalizadas quando forem literais;
  • Busque uma frequência de produção que te permita se dedicar a conteúdos originais;
  • Inclua marca d’água, logo e ou outros recursos para evitar que seus posts sejam copiados sem os créditos;
  • Se usar uma foto, texto, ilustração ou arte de outra pessoa, peça permissão e dê os créditos. Se não souber de quem é, não use. É sempre o trabalho de alguém.

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