O novo êxodo da década rumo às vilas digitais. Como marcas falam com uma geração que abdica das redes sociais para construir suas próprias comunidades?
Exausta do atual cenário de mídia social, Gen Z prioriza conversas em grupos privados. A migração sinaliza para uma restauração da economia criativa que remonta aos primórdios da internet
Há uma discussão divergente em curso na Meta: veiculação ou não de anúncios no WhatsApp. Segundo três pessoas familiarizadas com o assunto, essas conversas exploraram a exibição de publicidade em listas de conversas com contatos na tela de chat do aplicativo. Por ora, decisão alguma foi tomada.
A informação foi revelada pelo Financial Times, na última sexta-feira, 15, e rechaçada com veemência pelo chefe da empresa em um post no X/Twitter.
“Essa história é falsa”, escreveu Will Cathcart.
Apesar da negativa, é de conhecimento público a busca da Meta por novas fontes de receitas. Conforme lembrou o FT, em julho, a controladora do Facebook reportou o seu primeiro crescimento de arrecadação de dois dígitos desde 2021, com a grande maioria — US$ 31,5 mil milhões — provenientes de publicidade no segundo trimestre.
Recentemente, o WhatsApp já havia testado um recurso que permite o envio de mensagens de marketing direto dentro do app para usuários que consentiram em recebê-las. Atualmente, são 200 milhões de pequenas empresas que usam o serviço regularmente.
O aplicativo não tornou-se apenas uma plataforma comercial, mas também um ponto de encontro para comunidades.
E são para estes lugares fechados e privados que estão migrando uma geração mais jovem saturada das redes sociais.
O WhatsApp é apenas mais uma opção entre outros aplicativos que estão tornando-se canais preferidos de um público que busca mais autenticidade e conversar com pessoas que compartilham dos mesmos interesses.
Sem pestanejar, o Insider decretou a morte das redes sociais para mostrar que “à medida em que as pessoas enfrentam as consequências do compartilhamento constante, as mídias sociais se tornam menos sociais, e os usuários estão migrando para aplicativos de mensagens e bate-papos em grupo.”
A reportagem conversou com influenciadores e usuários da Geração Z e especificou um novo comportamento insurgente:
- Os usuários, especialmente os mais jovens, têm reduzido a frequência com que postam em seus feeds principais
- Eles agora passam muito mais tempo conversando, enviando fotos em bate-papos em grupo, postando em Stories e usando recursos como Close Friends
- O processo tem criado comunidades mais restritas e autênticas em plataformas como Discord e Geneva, nas quais os usuários estão dedicando mais atenção aos relacionamentos do que ao engajamento
Quando a Meta cogita anúncios no WhatsApp, ela também já está estudando como irá entrar nestes grupos.
“Como uma marca aparece nos DMs ou no servidor Discord de alguém se essa pessoa não for convidada? Esse é o ponto. As pessoas ainda podem acessar o Instagram para conferir suas celebridades e influenciadores favoritos , mas os jovens não querem que marcas e profissionais de marketing se infiltrem nas comunidades fechadas onde passam a maior parte do tempo”, avisou Lia Haberman, instrutora da UCLA Extension e conselheira do American Influencer Council.
E não é somente a Gen Z que está adotando este hábito, frisou Haberman:
“A Geração Alpha (a faixa etária de 13 anos ou menos) não está adotando os costumes tradicionais de mídia social.”
O comportamento que pode prevalecer nesta próxima década, e liga o sinal de alerta para marcas e a creator economy, é descrito por Simon De La Rouviere como um movimento em direção às aldeias digitais e físicas.
A metáfora é baseada em um artigo escrito por Skunk Ledger sobre Cenas e Vilas:
“A aldeia, conforme descrito, é o ambiente local diversificado. É o espírito da humanidade.”
Rouviere faz uma abordagem com foco nos criadores de conteúdo:
“A mídia social é fragmentada e difícil como usuário, então imagine como criador. O ambiente para o qual eles, nós, eu, estamos enviando trabalho mudou totalmente. O jogo acabou e todos nós perdemos. Agora temos um cenário de mídia fragmentado com públicos menores e oportunidades limitadas de crescimento.”
O cerne do problema, por sua vez, leva esta dor também para o usuário, alimentando cada vez mais por conteúdos determinados pela lógica do algoritmo. Ou seja, alcance em detrimento da qualidade.
“Durante a maior parte de uma década, as pessoas têm criado conteúdo para um algoritmo, não para o público. Pior ainda, elas não estão criando coisas para si mesmas. Portanto, se não for mais possível confiar nos feeds para colocar o conteúdo na frente de novos olhos, as pessoas estarão livres para criar o que quiserem”, ponderou Rouviere.
A reunião em grupos menores e nichados pode ser uma tentativa de reestabelecer a economia criativa no momento em que o modelo alavancada por cliques e curtidas está definhando-se.
“E assim, com a perda de certas cenas algorítmicas, estamos voltando para a aldeia: grupos centrais e aconchegantes do Discord, eventos IRL, boletins informativos, rolos de blog (…) Até as fitas cassete estão voltando”, destacou o insider.
O cenário, portanto, caminha-se para um reencontro com os primórdios da internet, conforme destacou o blog The Jaymo:
“De qualquer forma, quem faz coisas na Internet sabe que a Web2.0 acabou (…) As coisas vão se parecer mais com o mundo da Web 1: uma colcha de retalhos fragmentada de cenas, vozes e plataformas (…) As pessoas estarão livres para fazer o que quiserem, em vez de fazer coisas que flutuem bem na superfície espumosa dos mares sociais.”
Uma nova era de partilha online autêntica está a emergir, conforme descreveu o Insider. Resta saber se as marcas estão acompanhando este movimento e se já compreenderam que “público não é algoritmo”, como colocou The Jaymo.