“Não sou eu uma mulher”: mulheres negras na discussão

Resenha de Não sou eu uma mulher: Mulher negra e o feminismo, por bell hooks

Carol Correia
Revista Subjetiva
3 min readMar 8, 2020

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Capa do livro.

Informações

Escrito em 1981 por bell hooks, com o nome inspirado no discurso de Sojourner Truth, traduzido em 2019 para o português por Bhuvi Libanio. Contém 320 páginas, divididas em uma introdução e cinco capítulos.

O livro, portanto, possui quase 30 anos e mesmo assim ainda encontra relevância. É tido como um clássico da teoria feminista, especialmente para a discussão sobre a mulher negra nos Estados Unidos.

Temas abordados

hooks inicia o livro falando sobre a invisibilidade das mulheres negras na discussão. Afinal, quando se falava da experiência da mulher, discutia-se a mulher branca, e quando se falava da experiência do negro, discutia-se o homem negro. Logo, a mulher negra se encontrava [e em muitas discussões que faltam a mínima racialização da análise ainda se encontra] ignorada nos movimentos feministas e movimentos negros.

No capítulo 1, hooks descreve a experiência das mulheres negras escravizadas e quanto o machismo foi fator para definir a experiência da mulher negra escravizada — a exploração sexual, a desumanização, a demonização, etc. O período da escravidão que perdurou por anos estabeleceu uma relação de dominação racial nos Estados Unidos que têm frutos até os dias de hoje.

Depois, hooks fala sobre a desvalorização da mulher negra nos Estados Unidos, o perigo que a miscigenação representava a supremacia branca, os estereótipos construídos em cima do homem negro de homem bestializado e violador e em cima da mulher negra de “matriarca”, castradora e inerentemente má e como isso afetou também as relações entre pessoas negras.

Em seguida, é discutido o imperialismo do patriarcado e a recorrente defesa e promoção do machismo na sociedade.

Não obstante a promoção do patriarcado, hooks estabelece:

“Não poderá haver liberdade dos homens negros enquanto eles defenderem a subjugação das mulheres negras. Não pode haver liberdade para os homens patriarcas de todas as raças enquanto eles defenderem a subjugação das mulheres. O poder absoluto dos patriarcas não é libertador. A natureza do fascismo é tal que ele controla, limita e restringe líderes bem como as pessoas que os fascistas oprimem. A liberdade como igualdade social positiva que garante a todos os humanos a oportunidade de modelar o seu destino na riqueza e produtividade comum, só pode ser uma realidade completa quando o nosso mundo não for mais racista e machista.”

No capítulo 4, é discutido a relação, muitas vezes, tortuosa entre mulheres negras e o movimento feminista. hooks analisa como o movimenta feminista foi um espaço em qual mulheres brancas endinheiradas proclamaram o movimento enquanto “seu” e viam a presença de mulheres negras como uma invasão. Ela observa o comportamento racista ao perceber a tentativa de aliança aos homens brancos ao reclamarem votos para mulheres em detrimento do voto para negros. Assim como a falta de importância dada a questões trazidas por mulheres negras no movimento feminista, visto muitas vezes como questões secundárias.

Ademais, enquanto ocorre racismo no movimento feminista e o mesmo é tido como “algo de branca”. hooks comenta sobre a mudança de pensamento e comportamento entre as mulheres negras, em que as líderes negras pararam de defender direitos das mulheres e passaram a defender a libertação dos negros, eliminando o racismo, não o capitalismo nem o patriarcado.

Considerações finais

Ao contrário das demais obras de bell hooks, Não sou eu uma mulher é mais analítica e menos esperançosa. É um grande livro a fim de discutir a mulher negra americana, algo que até nos dias de hoje não é muito feito.

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Carol Correia
Revista Subjetiva

uma coleção de traduções e textos sobre feminismo, cultura do estupro e racismo (em maior parte). email: carolcorreia21@yahoo.com.br