As 5 melhores leituras 2022/1 (Resenhas #15)
Como já é uma tradição pessoal, ainda que atrasado, venho registrar a lista das leituras do semestre, destacando as 5 melhores. Foram 11 livros lidos no período. Menos do que eu gostaria que tivesse sido, mas várias leituras aqui se destacam pela qualidade. Mais uma vez fica o destaque para Yago Martins, com dois livros lidos e no ranking top 5, e para C. S. Lewis, com 4 livros lidos.
I. Top 5 melhores leituras
1. Biblical Theology — Geerhardus Vos
The process of revelation is not only concomitant with history, but it becomes incarnate in history. (P. 6)
Páginas: 426| Data: 1948| Editora: Eerdmans Publishing| Dificuldade: Alta
Como mencionei em resenhas anteriores, li este livro pela indicação do Guia de estudos do Invisible College. Após passar um bom tempo em minhas leituras teológicas estudando Teologia Sistemática e seus temas relacionados, vi a necessidade de estudar mais sobre Teologia Bíblica para entender melhor o processo da revelação ao longo da história e o papel de cada parte dela nisso. Diante disso, não há o que negar que o livro de Geerhardus Vos é referência no tema e realmente merece a fama que tem.
Passando pela revelação mosaica, profética e pelo Novo Testamento, o autor mostra como todas as coisas se conectam em torno de grandes alianças que Deus faz conosco. Mesmo tendo alguns pontos que eu, sendo batista e o autor presbiteriano, discordemos, a argumentação do autor não pode ser ignorada, assim como a ênfase do próprio texto bíblico e estrutura da revelação em torno das alianças. Creio que os pontos que mais me marcaram nos estudos foram o período mosaico, especialmente Gênesis, e a abordagem do significado da tentação de Jesus.
Recomendo muito a leitura para qualquer cristão que deseje aprender mais sobre a Palavra, entendendo melhor o “fio da meada” que conecta todas as coisas. Porém, não é um livro de leitura tranquila e trivial, visto que o autor aprofunda os argumentos e lida com várias contestações ao que está argumentando e apresenta diferentes visões para questões mais complicadas de lidar.
2. Lectures on Calvinism — Abraham Kuyper
In prayer lies not only our unity with God, but also the unity of our personal life. (Lc. 163)
Páginas: 220| Data: 1898| Editora: Modern Theology| Dificuldade: Alta
Considerado como um clássico do Neocalvinismo, o livro de Kuyper é essencial para qualquer um entender os princípios que sustentam esse movimento. O livro é excelente, abordando o relacionamento do Cristianismo, especialmente o Calvinismo que tem em alta conta a soberania de Deus, com a religião, ciência, arte e outros. A teologia Calvinista é apresentada não como uma defesa teológica nesse livro, mas pressuposta em um sistema de vida, uma cosmovisão (ainda que seja complicado classificar o Calvinismo como uma cosmovisão em si).
Além de ser útil para refletirmos sobre nosso papel em sociedade e teologia pública, o livro serve para compreender como o Kuyper é usado erroneamente para justificar inúmeras posições políticas atuais dentro da igreja.
Recomendo também esse livro, mas a ser lido com um conhecimento prévio sobre quem era Kuyper e seu impacto hoje. Deixo também como ressalva que alguns trechos de suas palestras, se analisados de forma anacrônica, podem ser interpretadas como sendo eurocêntricas. Talvez, inclusive, em alguns pontos seja, mas na maioria eles podem ser honestamente lidos e interpretados dentro do argumento completo do autor. É preciso ter cuidado para não tirar uma ou duas frases de contexto que, dentro da palestra como um todo, podem, na verdade, estarem dizendo o oposto do que o trecho parece dizer. Não é uma leitura simples “em linha reta” e que certamente entra na minha lista de livros para ler novamente.
3. No alvorecer dos deuses — Yago Martins
A religião de alguém não é definida apenas em esforços de busca por um Deus pessoal, mas em qualquer busca por uma origem absoluta de toda a diversidade temporal do sentido diante do qual temos sentimento de criatura, em dependência, finitude, êxtase de fascínio e assombro, e uma energia em atividade militante que afeta nossos hábitos e comportamentos morais. (P. 25)
Páginas: 192| Data: 2020| Editora: Thomas Nelson| Dificuldade: Média
Não é à toa que Yago Martins aparece novamente na lista de melhores leituras. O autor tem uma capacidade excelente de expressar assuntos profundos em uma linguagem afiada e precisa, buscando não deixar pontas soltas, tocar a ferida não deixando de ser também muito pastoral em sua abordagem. Isso é acentuado por ser um autor brasileiro, não passando pela barreira da linguagem, cultura e tradução, falando diretamente ao contexto brasileiro.
Tenho um carinho especial por esse livro, ou melhor, pela edição que tenho, pois foi presente do melhor amigo que fiz em BH.
O livro é separado em duas partes: Idolatria para dentro e Idolatria para fora. Na primeira, Martins mostra como a idolatria funciona dentro de nós, identificando nossas devoções e onde encontramos nossa identidade. Já na segunda, ele expõe o impacto da idolatria na esfera pública: congregamos em torno de idolatrias, distorcemos nossas representações de Deus e caímos na desgraça da idolatria política, que inclusive possui uma obra que aplica os princípios vistos aqui ao movimento bolsonarista: A Religião do Bolsonarismo, lido no semestre passado.
Especialmente diante do cenário atual da sociedade brasileira, creio que a leitura desse livro é essencial e confrontadora. Recomendo a todos. Destaco que é também uma obra com edição e diagramação excelentes.
4. Judith Butler: teologia e revolução — Caio Marcos
(…) o espírito revolucionário é, essencialmente (…) uma tentativa de se reinterpretar a realidade. (P. 49)
Páginas: 128| Data: 2020| Editora: Episteme| Dificuldade: Alta
Recebi esse livro durante meu período assinando o Clube Review. Livro com uma qualidade de material excelente, muito bem diagramado e editado. Por ser primeira leva de impressões, enviado para o clube antes de começar a ser vendido, encontrei alguns erros de digitação, mas nada que apague a beleza que é esse livro. E olha que nem comecei a falar sobre o conteúdo.
O livro é dividido em três capítulos: (1) A proposta de Butler, (2) Revolução em Butler e (3) Revolução e o homem tohûlátrico. O leitor é logo avisado no início que não é um livro sobre Butler ou uma apologética direta contra suas ideias, ainda que ele contenha muito disso, mas um grande ensaio sobre o espírito revolucionário que paira sobre as ideias dela, assim como em nossa sociedade. No primeiro capítulo são apresentadas, em termos gerais mas suficientemente aprofundados, as ideias de Butler. No segundo, como o espírito revolucionário se manifesta nessas ideias e o terceiro capítulo fecha com os impactos disso na sociedade e uma resposta cristã a tudo isso.
Creio que não preciso enfatizar muito que não é uma leitura fácil e que o que escrevi aqui não chega nem perto de ser um resumo de uma resenha de tudo o que é tratado no livro, mesmo com suas poucas páginas. A minha edição pessoal é coberta de anotações. Recomendo para aqueles que desejam entender um pouco mais sobre o contato do Cristianismo com a sociedade atual, assim como um excelente exemplo de teologia pública realizada.
5. Cristo habita em ministérios fracassados — Yago Martins
Páginas: 151| Data: 2022| Editora: Concílio| Dificuldade: Baixa
Mais uma vez Yago Martins está aqui, assim como teve dois livros no top 5 do semestre anterior. Além disso, creio ser interessante destacar que a publicação do livro do Caio Marcos também é fruto do ministério do Yago. Muita teologia boa tem vindo através dele. Deus seja louvado!
Um leitor mais atento notará que esse livro não tem uma citação logo abaixo do título. O motivo é que minha cópia física foi emprestada para meu pastor e discipulador, pois achei a obra tão boa, assim como as anteriores da série da Grande Comissão, que emprestei para ele ler e estou sem ela aqui. O título “Ministérios Fracassados” lembra o documentário feito pelo Yago no início de sua contribuição na internet.
O autor mostra de forma excelente o que devemos buscar como resultado dos nossos ministérios e qual é o sucesso que importa. Ele lida com situações específicas e pastorais com a mesma linguagem precisa que mencionei antes. Creio que a série sobre a Grande Comissão deveria ser leitura básica nos seminários brasileiros.
II. Outras leituras
6. O Alvorecer da Alegria Indestrutível — John Piper: o melhor livro devocional que li nos últimos anos. Tendo a não gostar desse tipo de livro mesmo constantemente dando novas chances a ele e fui surpreendido com a profundidade de Piper nas devocionais para o advento.
7. Deus no Banco dos Réus — C. S. Lewis: uma compilação com 416 páginas, feita em 1970, de artigos, cartas e ensaios de Lewis em torno de temas apologéticos, como Milagres, Religião e ciência, Trabalho e oração e outros. Uma leitura não é suficiente para absorver a grandiosidade do que é escrito aqui.
8. Sobre histórias — C. S. Lewis: artigos escritos por Lewis em torno do tema da sua especialidade: literatura. Ele trata até sobre O Hobbit. Além disso, defende em vários artigos sobre formas de escrever textos, sobre o que seria um gosto juvenil, ficção científica e outros. Leitura excelente para aqueles que gostam mesmo de ler.
9. Um experimento em crítica literária — C. S. Lewis: não é à toa que Lewis aparece tanto aqui. Comprei toda a coleção da Thomas Nelson Brasil e fico sempre muito satisfeito quando leio um livro dele, mesmo aqueles fora da minha área de interesse. Lewis trata aqui sobre quantidade de leitura, diferença entre níveis de leitura, fantasia, poesia, mito e outros.
10. A Cadeira de Prata — C. S. Lewis: releitura de mais um livro de Crônicas de Nárnia junto com minha esposa. Excelente como todos os outros e inaceitável que um jovem cristão ainda não tenha lido.
11. Storytelling com Dados — Cole Knaflic: único livro técnico do semestre. Excelente para ajudar a aprender como apresentar os dados de forma que as pessoas se interessem e decidam tomar alguma atitude a partir das informações apresentadas. Está aqui por último apenas pela superioridade dos outros livros, não por falta de mérito deste. O livro é em colorido, o que é excelente, mas a qualidade do material deixa um pouco a desejar.
Como já mencionei antes, esses rankings semanais com breves resumos sobre os livros são auxiliares da minha absorção pessoal do conteúdo do que li e uma reflexão posterior do que foi lido. Publico aqui para deixar registrado e caso ajude alguém a escolher suas leituras. Não tenho mais lido tantos livros em quantidade como antes, mas as obras que li neste semestre valeram bastante o tempo dedicado.
