TOP 10: LIÇÕES QUE APRENDEMOS COM ELON MUSK NO TWITTER

Marco Antonio Barbosa
Telhado de Vidro
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15 min readNov 29, 2022
Perdemos, playboys.

Não adianta a gente espernear: as redes sociais — ou melhor, as plataformas de mídia social — chegaram a uma encruzilhada. E é pouco provável que elas sobrevivam do jeito que nós as conhecemos. A crise é tão generalizada que já se teoriza a respeito do que será da internet após o fim dessas mídias. O Facebook ceifou 11 mil cabeças no primeiro megapassaralho de sua história, em meio aos desafios de consolidar suas fantasias de universo virtual. O Instagram ensaiou uma transformação em algo mais parecido com o TikTok… e desistiu, em meio a muitas críticas. E o Twitter…

Bem, o Twitter. Em março de 2022, iniciaram-se as manobras que culminaram, em outubro, com a venda da empresa para o bilionário Elon Musk, pela bagatela de US$ 44 bilhões. Depois de demitir de uma só vez cerca de 3.700 empregados (metade do estafe), atirar um monte de ideias ~inovadoras~ na parede pra ver se alguma colava e bater boca em público com subordinados, Musk conseguiu botar o Twitter de cabeça pra baixo. A confusão interna é avassaladora, não está nem perto de chegar ao fim e já começa a se fazer sentir pelos usuários da plataforma.

Depois que (praticamente) consegui abandonar o Facebook, o Twitter passou a ser minha principal plataforma online. (O LinkedIn não é pra mim. E não tenho o physique du rôle para o Instagram.) Passo muito mais tempo do que deveria logado no passarinho azul, que virou meu muro de lamentações/meio de divulgação/canal de notícias/passatempo favorito. Como todo hábito, o Twitter envolve seu usuário numa relação de custo/benefício; como todo mau hábito, com o tempo o custo se tornou cada vez maior, para benefícios que só encolhem.

Quando começaram os avanços de Musk sobre a plataforma, muita gente se revoltou e ameaçou deixar o serviço (?) Se a empresa continuar a descer a ladeira na velocidade atual, isso nem será necessário. Em 17 de novembro, com a notícia de que o acesso à sede do Twitter foi fechado (temporariamente) aos empregados, começou-se a discutir, a sério, um provável fim da plataforma. O bilionário, ciente dos rumores, aproveitou para fazer o que faz de melhor: trollar.

Não sei dizer se o Twitter vai sobreviver a Musk, nem qual seria a cara da plataforma que vai surgir dessa barafunda. Mas já dá para apontar algumas conclusões que, espero, possam nos ajudar na transição para um futuro sem Twitter. Possível ou provável.

1: A compra do Twitter nunca foi uma questão de liberdade de expressão, e sim de ego.

Elon Musk, como todo bom representante da turma dos Milionários Sociopatas™ (no caso, bilionários), acredita que regulações não se aplicam à sua casta. O que o impeliu à aquisição do Twitter não foi a defesa da liberdade de expressão, e sim seu ego gigantesco — um traço que ele tem em comum com Donald Trump, Kanye West, Monark e outros boquirrotos incapazes de viver em sociedade. Para essa galera, é impossível conviver com a ideia de não poder dizer o que quiserem, quando quiserem, a quem quiserem. Fodam-se as leis, fodam-se os termos de uso, foda-se o direito de resposta. Liberdade de expressão, para eles, refere-se apenas à liberdade irrestrita para eles mesmos.

Ao iniciar sua obsessiva jornada rumo ao comando do Twitter, Musk afirmou-se como um “absolutista da liberdade de expressão”. E que via a plataforma como uma “praça pública”, na qual todo mundo teria direito de falar o que quisesse dentro dos limites da lei. Ao mesmo tempo, ele recusou a proposta de participar do conselho de administração da empresa, por acreditar que só ele, e ele sozinho, seria capaz de guiar a plataforma rumo a esse ideal de liberdade de expressão absoluta.

Essa intenção com as demissões em massa promovidas pelo novo CEO, que atingiram em cheio as equipes que cuidavam da moderação de conteúdo. Ao mesmo tempo, Musk anunciou que seria criado um “conselho de moderação” para gerir o tema, uma abordagem tentada pelo Facebook (e que não deu muito certo).

Porém, a decisão mais reveladora da verdadeira posição de Musk em relação ao que pode ou não ser dito no Twitter foi a ressurreição da conta de Donald Trump. O ex-presidente dos EUA foi banido permanentemente da plataforma depois da tentativa de golpe de estado apoiada por ele, em 6 de janeiro de 2021. Em maio último, Musk já havia declarado que revogaria o banimento de Trump, algo que rotulou como “moralmente errado”. O ex-presidente usou o Twitter incontáveis vezes para espalhar mentiras, discurso de ódio e fake news para desacreditar a eleição presidencial de 2020, na qual foi derrotado. Que definição estranha de “moralmente errado”, hein?

Nesse interregno, Musk encontrou tempo para trocar ideias com tuiteiros de extrema direita (inclusive do Brasil), microgerenciar perfis paródicos, bater boca com (e demitir) funcionários online e espalhar teorias conspiracionistas para seus 118 milhões de seguidores. Quer dizer: no fim das contas, Musk comprou o Twitter para que ninguém pudesse impedi-lo de usar a plataforma como (mais) um brinquedinho.

2: Aliás, a liberdade de expressão no Twitter tem regras e limites. Como em qualquer outro canal de mídia.

Vou abrir esta lição com um relato de um caso que aconteceu comigo. Enquanto escrevo este texto, meu perfil no Twitter está suspenso. Peguei um gancho de 24 horas por ter usado o termo “arrombado” em referência ao arrombado Marcel Van Hattem.

No dia seguinte, tomei outro gancho, dessa vez por uma semana, ao retomar o tema. O tuíte também violou as normas, e não tive nem a chance de apagá-lo. Ou a equipe de mídias sociais do arrombado está de olho vivo, ou há algum alerta automático programado no Twitter para a palavra “arrombado”. (Ou para a palavra “golpista”, quem sabe?)

Não me orgulho de usar termos como “arrombado” em público, mas também não me arrependo. Também não concordo com a ideia de ter “propagado o ódio” ao xingar um político — uma figura pública que pode e deve ser criticada pelos cidadãos. Mas regra é regra. Tomei o gancho e fiquei quieto, pois concordei em me submeter às regras do Twitter. Todo meio de comunicação de massa tem regras, que são ditadas por leis, por órgãos reguladores e pelos controladores do meio de comunicação em questão. E o Twitter, que é na prática um meio de comunicação de massa, não escapa dessa realidade.

Não existe liberdade de expressão absoluta em nenhum meio de comunicação. Não existe no rádio, na TV, no cinema, na mídia impressa. Para além do que dizem as leis e para além do que interessa aos donos de meios publicar (ou não), há conteúdos que simplesmente não devem, ou não deveriam, circular sem qualquer tipo de restrição. É por isso que canais de pay per view pornô têm senhas, é por isso que palavrões são “blipados” em transmissões televisivas, é por isso que não se exibem fotos explícitas de suicídios em jornais.

A diferença fundamental entre a mídia social e os outros meios de mass media é que os usuários das plataformas foram “convencidos” — por pessoas como Mark Zuckerberg e Elon Musk — que essas plataformas são “praças públicas” nas quais todos são livres para dizer o que quiserem. Não é assim. Em última instância, mais do que a lei ou que o simples bom senso, quem define os limites da liberdade de expressão no Twitter é quem paga a conta: os donos da plataforma e os anunciantes.

Quem ainda acredita que plataformas como o Twitter (ou a internet como um todo) são o reino da comunicação democrática, não prestou atenção nos movimentos do mercado, na concentração econômica e nos monopólios já consolidados pelas plataformas. A internet, há muito tempo, obedece à lógica do broadcast, onde quem tem mais, pode mais. Os limites da “democracia” e da “liberdade de expressão” nas redes são dois: dinheiro e Constituição. Como na imprensa, no rádio e na TV.

3: Elon Musk pode entender muito de ciência (será?). Mas entende porra nenhuma de gente.

Com a Tesla, Elon Musk transformou o paradigma mercadológico dos automóveis elétricos. Com a SpaceX, quer revolucionar o modelo vigente de exploração do espaço sideral. Com o Twitter… bem, até agora, com o Twitter o bilionário só conseguiu provar que não entende muito de pessoas.

Tipo: não sou especialista em gestão de recursos humanos, mas sei que demitir quase metade da força de trabalho sem ter noção de quem fazia o quê, em qual área, não é uma estratégia bacana. Principalmente se o cara depois precisou pedir para que alguns demitidos voltassem ao trabalho. Sei também que acusar seu estafe de ser “fraco, preguiçoso e desmotivado” não é um jeito legal de conquistar a confiança das pessoas. Em pleno rebote da pandemia de Covid-19, não é maneiro suspender o esquema de trabalho remoto de forma unilateral.

Depois dessa rajada de decisões antipáticas, Musk ainda teve a pachorra de lançar um ultimato a seus comandados. Os funcionários sobreviventes teriam de se comprometer com a construção de um novo Twitter, trabalhando por “longas horas e em alta intensidade”. Quem não estivesse a fim de fazer parte desse “Twitter hardcore” foi convidado a pedir demissão imediatamente. Gente fina, né?

4: Musk ainda não sabe como vai transformar o Twitter em um negócio lucrativo...

Elon Musk pagou US$ 44 bilhões pelo controle total do Twitter. Vamos lembrar: trata-se de uma empresa que declarou prejuízo de US$ 270 milhões no segundo trimestre de 2022 e que, segundo o próprio Musk, contabiliza perdas diárias de US$ 3 milhões. Só de juros pela grana que pegou emprestado para viabilizar a aquisição, a companhia vai pagar tipo US$ 1 bilhão por ano.

Para atingir sua declarada meta de multiplicar por cinco a receita da plataforma, o bilionário tem discutido — em público — inovações e alternativas para o negócio. Algumas ideias parecem viáveis. Outras… Por exemplo, a proposta de cobrar US$ 20 por mês para os usuários do Twitter Blue foi descartada, depois de um bate-boca público com Stephen King. (A taxa baixou para US$ 8. O valor, segundo Musk, não seria universal; cada país teria uma taxa específica, proporcional ao poder de compra da moeda local contra o do dólar.)

Também foram ventiladas hipóteses como cobrar taxas dos usuários para acesso à análise de dados, reviver a plataforma de vídeos curtos Vine (para competir com o TikTok) e testar algum tipo de serviço de pagamentos baseado na plataforma. Foram tantos balões de ensaio jogados em tão pouco tempo, que a ~estratégia~ de Musk virou piada no The Onion.

Alguma porra tem que dar certo nessa merda.

Mais relevante, no entanto, é a ideia de reduzir a importância da publicidade (que hoje corresponde a 90% da receita da plataforma) e substituí-la por um modelo de assinaturas. Musk já disse que “odeia propagandas”; em seu planejamento, a grana de publicidade não ultrapassaria 45% da receita total do Twitter. Problema: todas as outras plataformas de mídia social também estão desesperadas para criar um modelo viável de acesso pago, e nenhuma teve sucesso significativo ainda. (Você pagaria para usar o Twitter, ou o Facebook, ou o Instagram? Eu não.)

5:…e sua busca pode acabar por mudar completamente a cara da plataforma.

A obsessão de Musk em transformar os tuiteiros em usuários pagantes não passa apenas pela questão da receita extra. Ele quer também que os detentores de contas verificadas — aquelas dos US$ 8 mensais — passem a ter “prioridade nos replies, menções e buscas”. Essa nova lógica contraria o direcionamento seguido por quase todas as outras plataformas, que passaram a remunerar (em vez de cobrar mais d’) os perfis que geram mais engajamento.

Também tem o potencial de mudar totalmente a configuração do feed do Twitter à qual estamos acostumados. Não se sabe exatamente o que significa essa “prioridade” a ser dada às contas “VIPs”, mas levada ao pé da letra, daria ainda mais evidência a perfis que já são bombados. Das principais plataformas de mídia social, o Twitter é a menos sujeita a interferências algorítmicas no conteúdo visto por seus usuários. Em comparação com as outras redes, os tuiteiros podem manter um foco muito mais preciso nos amigos e nos influenciadores que realmente lhes interessam. Mas a “prioridade” dada a perfis pagantes pode descaralhar esse foco e poluir os feeds e/ou os resultados de busca.

Já pela perspectiva da “liberdade de expressão”, tão prezada por Musk, o Twitter poderia virar um novo porto seguro para influenciadores reacionários. Essa galera adora espalhar desinformação, conteúdo inflamatório, mentiras e trollagens — e quando dá a merda (e sempre dá), joga a cartinha da liberdade. Com a anulação do banimento de Trump, o novo dono do Twitter demonstrou que pretende dar o benefício da dúvida a esse tipo de gente.

Conclusão: reunindo o pior de todos os mundos, em breve poderemos estar pagando (US$ 8?) por um feed entupido de fake news e de influencers que influenciam ninguém.

6: Propagandas bizarras estão aparecendo com mais frequência.

O pior é que, por vontade própria ou não, o Twitter já está perdendo receita de publicidade. A plataforma já perdeu, desde que Musk assumiu, cerca de 50% dos seus 100 maiores anunciantes. Esse conjunto de marcas, que reúne gigantes como Chevrolet e Coca-Cola, gastou apenas em 2022 aproximados US$ 750 milhões em tweets patrocinados. A constatação seguiu-se a um sinal amarelo emitido no começo de novembro pela Group N, maior agência de compra de espaço publicitário do mundo, indicando que o Twitter passou a ser uma “plataforma de alto risco” para anunciantes.

(A resposta de Musk à debandada? Afirmar que a culpa é dos “ativistas”, que querem “destruir a liberdade de expressão” e forçam (?!) os anunciantes a boicotarem o Twitter. Ele também demitiu boa parte dos funcionários que cuidavam da venda de espaço publicitário na plataforma.)

Assim como não existe o tal vácuo de poder, inexiste o vácuo de publicidade. Com a saída das grandes marcas do Twitter, os espaços reservados para os tweets pagos passaram a ser ocupados por… outras marcas. Marcas mais estranhas, oferecendo produtos e serviços idem. Produtos e serviços que definitivamente não são compatíveis com meu perfil.

Pode ser apenas uma percepção pessoal. Mas, no meu feed, vejo uma variedade menor de grandes anunciantes (tipo: um monte de anúncios de uma só marca de cerveja, quando antes apareciam diversas marcas) e uma pulverização de anúncios estranhos — criptomoedas, turismo para países ~exóticos~, produtos que nada tem a ver com meus hábitos. Enquanto Musk afugenta as megamarcas, os espaços de anúncios são ocupados por essas empresas mais, aham, alternativas. E o departamento comercial do Twitter, fragilizado e atarantado, não consegue (ou não quer) reagir. Alto risco mesmo.

Conversa real entre o head de publicidade em mídias sociais da Apple e Musk (https://twitter.com/jdan/status/1597296511062528001)

7: Assim como mensagens de spam igualmente bizarras.

Outra parada que proliferou legal depois da chegada de Musk: spam na caixa de mensagens. Antes, eu recebia tipo uma mensagem suspeita a, sei lá, cada ano. Ultimamente, venho recebendo duas ou três por semana, às vezes mais. As DMs variam de remetente, mas todas seguem esse formato aí embaixo.

Com o downsizing radical das equipes de monitoramento de conteúdo, era de se prever que os usuários iriam ficar mais vulneráveis a esse tipo de lixo. Há menos gente acompanhando as denúncias de spam e de perfis falsos, e menos gente para avaliar as denúncias e tomar decisões a respeito. Antes da chegada de Musk, o Twitter removia cerca de um milhão de spammers por dia, e o bilionário ainda reclamava do excesso de bots na plataforma. A coisa não parece ter melhorado com a mudança de comando.

8: Não haverá um “outro Twitter”.

Diante do salseiro criado por Musk e das transformações que ele pretende implementar, muita gente começou a procurar por uma nova plataforma que substitua o Twitter. Pra essa galera, trago boas e más notícias.

A boa é que o passarinho azul, apesar de tudo, não deve mudar taaaaaaanto assim (veja a lição 9). A má notícia é que não existe uma plataforma que substitua perfeitamente o Twitter, e provavelmente não vai existir. Temos por aí o Koo, que além de inspirar muitos trocadilhos pueris, oferece usabilidade e recursos quase clonados da rede comandada por Musk. Outra alternativa é o Mastodon, que vem atraindo cada vez mais gente, apesar de exigir um pouco mais de trabalho de seus usuários (por ser uma rede descentralizada).

Na real, por mais que as novas opções busquem oferecer uma interface familiar, não há como substituir o investimento (emocional e de carga horária) que todos nós já enterramos no Twitter. Quem optar por largar a plataforma de Musk vai ter que reconstruir sua base de seguidores/seguidos e sua imagem pública como tuiteiro; descartar um histórico de conversas (boas e más), memes, links, threads. Você pode continuar “tuitando” no Koo (ops) ou no Mastodon, mas a bagagem (e a dependência) construídas no Twitter não vão te acompanhar.

Uma platatorma de mídia social não é apenas a tecnologia, o modo de uso e suas funcionalidades: é uma coisa viva, porque vai mudando no mesmo passo que nós mudamos e nos relacionamos com seus usuários e com a própria plataforma. Estar no Twitter, assim como estar no Facebook, no Instagram e no LinkedIn, é uma experiência irrepetível, fruto de um dado contexto social e tecnológico e alimentada por expectativas e correlações muito particulares. A mecânica do “microblog” é reproduzível; nossa relação com a plataforma, não. Quem migrar para o Koo ou para o Mastodon deve estar ciente disso. Pode ser uma experiência legal, divertida ou enfurecedora, assim como o Twitter, mas nunca será a mesma oferecida pelo Twitter.

9: Uma plataforma de mídia social não acaba de um dia pro outro.

Voltando à boa notícia mencionada na lição acima. Por mais que Musk mexa e remexa no Twitter, ele não vai acabar com o conceito básico do negócio: mensagens curtas, postadas instantaneamente em uma plataforma centralizada. E, para a imensa maioria dos usuários, isso é o suficiente. Uma plataforma de mídia social pode ser encerrada por vários motivos, mas, na prática, só acaba mesmo quando é abandonada. Enquanto nós, os noiados do Twitter, continuamos a debater liberdade de expressão, trollagem, fake news e outras noias, centenas de milhões de usuários “normais” continuarão a tuitar todos os dias, alegremente alheios às polêmicas.

Não vai haver debandada em massa de tuiteiros. Na verdade, com toda a atenção obtida por Musk na mídia, o número de usuários e de acessos à plataforma vem crescendo nas últimas semanas. O “nosso” Twitter pode estar acabando, mas o Twitter “deles” parece estar firme & forte.

10: Mas se acabar, não será algo tão ruim assim.

Sim, parece que o Twitter não vai acabar tão cedo. Mas pode, no médio/longo prazo, perder sua autonomia como plataforma e virar um componente do tal “aplicativo de tudo” que Elon Musk vem tentando tirar do papel. O endgame do bilionário é criar um único app, chamado de “X”, que uniria uma miríade de serviços hoje espalhados por diversos outros aplicativos. Imagine um Twitter misturado com iFood, Uber, PayPal, YouTube, Spotify, Instagram, Whatsapp, Booking.com, AirBnB & mais, tudo acessível num mesmo perfil. Ainda poderíamos chamar esse (monstro de) Frankenstein de Twitter?

Isso ainda deve demorar um tempinho — alguns anos — para se tornar realidade. Faço então outra pergunta: quando (ou se) esse X App aparecer, ainda precisaremos do Twitter?

Reunidas, a internet (em geral) e as mídias sociais (em particular) são, talvez, o maior exemplo de potencial desperdiçado na história da humanidade. Sim, mídias sociais servem para disseminar conhecimento, ligar pessoas, poupar tempo, descomplicar serviços, divulgar notícias relevantes, fazer amizades. Ou poderiam servir pra isso tudo, e mais. Na prática, tornaram-se imensas âncoras amarradas a nossos pés. Não concebemos mais a comunicação interpessoal sem elas. Entregamos a elas toda sorte de informação íntima, o que nos torna vulnerável a todo tipo de ataque e má intenção. Passamos a filtrar a realidade que enxergamos por meio dessas plataformas; muitos de nós passaram mesmo a usar as plataformas não para filtrar, e sim para recriar suas próprias realidades. Perdemos tempo, saúde física & mental e dinheiro ao engajarmo-nos em discussões inúteis, golpes, mentiras. O que era para ser um passatempo virou, para muitos, a única conexão com o mundo exterior e com outras pessoas.

Essa semana que passei suspenso do Twitter me fez ver que não preciso tanto assim da plataforma. A energia mental desperdiçada, o estresse, a expectativa por um like ou por um RT — precisamos disso? Conforme escrevi lá em cima, percebemos que um hábito se tornou um vício quando a satisfação extraída diminui e os efeitos negativos superam os positivos, e mesmo assim insistimos em mantê-lo.

Elon Musk pode realmente acabar com o Twitter, ou transforma-lo em outro app, ou torna-lo um ambiente inabitável para pessoas normais. Ou pode também desistir da empresa, entubar o prejuízo e deixar as coisas como estão hoje. Quando o ricaço assumiu a empresa, fiquei apreensivo e até triste. O bom é perceber que já não me importo com o desfecho da história, seja lá qual for. Ficarei por lá pra ver o que vai rolar, provavelmente participando menos, postando menos, gastando menos tempo. E se acabar mesmo? Partimos pra outra, ora. De preferência, offline.

Bom, melhor um fim terrível do que um terror sem fim.

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Marco Antonio Barbosa
Telhado de Vidro

Dono do medium.com/telhado-de-vidro. Escrevo coisas que ninguém lê, desde 1996 (Jornal do Brasil, Extra, Rock Press, Cliquemusic, Gula, Scream & Yell, Veja Rio)