Como é trabalhar como Desenvolvedor, por Bernard De Luna

William Oliveira
Training Center
Published in
9 min readMay 16, 2017

Esse post é parte de uma série de entrevistas para o Training Center sobre o que um profissional pode dizer sobre sua área de atuação visando mostrar para outras pessoas como é trabalhar no que fazem, esclarecendo para algumas pessoas se elas se dariam bem trabalhando na área ou mesmo só para mostrar para outras pessoas como é trabalhar com isso.

Introdução

Meu nome é Bernard De Luna, sou CEO da https://bunee.io, tenho mais de 15 anos com experiência em produtos digitais. Já dei centenas de palestras técnicas no Brasil e exterior, já dei mentoria e consultoria para diversas marcas famosas no país e já apresentei os maiores eventos de tecnologia e empreendedorismo do Brasil.

Como você conheceu a área de Desenvolvimento?

Comecei a criar sites (era assim que chamávamos na época) em 1997–1998. Eu gostava muito de desenhar, então rapidamente comecei a desenhar digitalmente, e como uma consequência natural, comecei a buscar formas de subir isso para a internet.

Naquela época, não tínhamos conteúdo o suficiente para virarmos grandes desenvolvedores ou designers. Quase todos os artigos eram em inglês, ainda não existiam blogs. O jeito era aprender com CDs, revistas, livros e muita força de vontade.

Uma facilidade era que os programas ainda eram WYSIWYG (What You See Is What You Get), que eu nem sei se a nova geração conhece esse termo ou sabe o que isso significa. Como tinha uma grande facilidade com desenho, conseguia fazer sites mais bonitos e isso foi me trazendo clientes por volta de 98–99, iniciando minha carreira :)

cada oportunidade vem seguida de uma cobrança

Por que você escolheu ser Desenvolvedor?

Diferente das pessoas que entram em Desenvolvimento ou Design ou sub-áreas digitais, eu não escolhi ser x ou y, eu apenas me vi dentro desse setor. Minha grande decisão estratégica foi em 2002 (quando tinha 17 anos), pois eu já tinha clientes, conseguia desenvolver com mais qualidade e escolhi minha faculdade (Publicidade) para ganhar o lado estratégico de um projeto, uma criação, uma negociação (nunca quis trabalhar em uma agência ou com publicidade propriamente).

Como foi o seu primeiro trampo?

Olha, meu primeiro grande trabalho estruturado foi como estagiário em uma empresa de Inteligência Artificial, acredito que em 2003 eu acho. Porém, em 2001 eu trabalhei em uma Software House desenvolvendo e desenhando software, mas foi um trabalho tão frustrante que eu nunca falo sobre ele. Continuo considerando a minha primeira escola o meu estágio.

Eu aprendi muita coisa sobre essa primeira empresa, não só desenvolvimento técnico, mas principalmente desenvolvimento pessoal. Aprendi a tomar esporro e me segurar, aprendi que cada oportunidade vem seguida de uma cobrança. Aprendi que responder de bate-pronto não é preparação e sim preguiça de pensar para tomar a melhor decisão. Aprendi que a linha entre arrogância e experiência é muito tênue. Foram 4 anos e meio trabalhando em uma empresa que cresceu junto comigo. Eram aproximadamente 10 pessoas quando entrei, passando para quase 20 pessoas nesse tempo.

Quais são as skills de quem trabalha nesta área?

Interessante essa pergunta, pois eu nunca fui contratado como DESENVOLVEDOR. Sempre que conto isso, muita gente se assusta. Na maioria das empresas que passei, eu sempre fui como PRODUTO. Meu papel era sempre criar, desenvolver, liderar o time, gerenciar, monetizar e evoluir produtos digitais. Desde a época do meu primeiro emprego, nós projetamos diversos produtos, passando por todas as etapas que são conhecidas até hoje.

O desenvolvimento não era uma etapa separada e bem definida como é hoje, e mesmo quando ele evoluiu, por evolução da carreira, eu já tinha migrado para uma visão mais holística de produto, como acompanhamento de métricas, aquisição de talentos para o meu time, comunicação com o time para melhor produtividade e felicidade da equipe, entre outras coisas.

Acredito que dentro da área de desenvolvimento, você precisa buscar ser um T-Shapped (busque por Transdisciplinaridade), ou seja, ser generalista (aprender muitas habilidades) e escolher 1 ou 2 para ser especialista. Graças a gostar de estar presente em tudo de uma empresa, eu aprendi muitas coisas, que iam desde desenvolvimento, SQL, Design, AI, Processos, Apresentações e até mesmo Marketing Digital (que me levou a cursar minha pós-graduação com ênfase em Mkt Digital, para ganhar ainda mais estratégia).

Agora, se você que estiver lendo isso, gostar de produto, mais até do que desenvolver, existe um mercado novo em crescimento no Brasil e no mundo, os Product Managers. Nesse mercado, você ganha um excelente salário, lida com métricas e com testes (experimentações), é responsável pelo sucesso do produto, que pode ser desde faturamento até happiness de seus usuários. Se eu começasse hoje minha carreira, eu ainda sim aprenderia a desenvolver ou programar, mas focaria em produto desde o Day One.

Quais são os principais desafios da área?

Além das empresas que trabalhei, tive 2 negócios meus, um deles era uma empresa de desenvolvimento. Lá eu desenvolvi e me desenvolvi bastante nessa área. Acredito que todo desafio está vinculado a um contexto, ou seja, uma mudança de arena e um desafio perde o propósito. Por exemplo, para se fazer um projeto de um cliente, temos que buscar tecnologias estáveis, evitando novidades que podem mudar na semana seguinte. Foi assim com o HTML5, Linear-gradient, Flex e agora CSS grid. Por outro lado, em alguns projetos próprios ou experimentais, podemos nos dar o luxo de usá-los, com alguns polyfills para maior estabilidade.

Ainda sim, não acredito que esse seja o maior desafio do Dev. Hoje o maior desafio é você parar de procrastinar! O Dev que sabe NodeJS e não sabe Angular ou React, não é porque ele é incompetente, e sim porque ele não sabe gerenciar o seu próprio tempo. O mesmo para back-end, o mesmo para designers, o mesmo para qualquer setor. O aprendizado é muito doloroso para o nosso cérebro, pois ele funciona como um celular, ou seja, quer o tempo todo hibernar para poupar bateria. Toda vez que você pensa em aprender algo novo, ele precisa sair da zona de conforto (poupar bateria) e por isso tenta boicotar o aprendizado. Para que o Dev continue aprendendo coisas novas, ele precisa aprender a domar o cérebro dele, descobrindo a sua melhor maneira de aprender coisas novas, seja montando uma palestra sobre o tema, um artigo, um podcast, um projeto open-source, contribuindo com um projeto open-source já existente, criando uma branch experimental no seu projeto diário, lendo e-book, ouvindo um podcast, vendo um vídeo tutorial no YouTube, indo a uma palestra sobre o tema, participando de um hackathon, participando de meetups, Dojos. Como pode ver, existem muitas possibilidades de se aprender algo técnico, é só você ver qual se identifica mais, que seu cérebro te boicotará menos. :)

Quais são as principais recompensas da área?

A maior recompensa da área são as pessoas. As amizades! Graças a minha carreira tenho grandes amigos em Porto Alegre, Maceió, Aracajú, BH, São Paulo, Cuiabá, Salvador, Recife e muitos outros lugares do Brasil e até fora.

Existe um experimento que foi criado nos anos 70 por Edward Deci que comprovou que nossa motivação é muito maior com a motivação intrínseca que a extrínseca, ou seja, dinheiro não te motivará por muito tempo, foque em desenvolvimento profissional, time, ambiente, benefícios e principalmente qualidade de vida.

O Dev de hoje é o novo jogador de futebol, ou seja, salários cada vez maiores, negociações cada vez mais ousadas para aquisição e offices cada vez mais descontraídos para reter e engajar mais os colaboradores. A comunidade mais ativa do Brasil é sem dúvida a de Javascript, pois está presente na vida de todos os Front-end developers, e na grande maioria dos Back-end Developers. Um profissional de Javascript pode chegar a ganhar R$ 7k — 8k em BH ou RJ, podendo chegar a R$ 11k-12k em SP.

Dentro de tudo que é envolvido o trabalho de desenvolvimento no Brasil, a única coisa que eu não tenho gostado é a moda em cima do trabalho remoto. Acredito que o DEV deveria querer estar no ambiente da empresa, tendo contato com colegas, outros setores, tomar um café no corredor com o gestor, trazer meetup pra dentro de casa. A maioria dos devs que querem trabalho remoto é puramente para ficar “mais tempo em casa”, o que é extremamente anti-produtivo. São poucos os profissionais que conseguem criar um ambiente em casa profissional, com gestão de tempo e eficácia, muitos reclamam de usar um “time-tracking”, mas poucos pensam em como “retornar ROI” para o seu contratante.

Acredito que isso tem que ser melhor evangelizado. Eu sou contra o Dev precisar trabalhar todo dia no escritório, mas também não concordo com essa “moda” de Dev com 19–20 anos querer trabalhar remoto, como se já tivesse se desenvolvido bastante como profissional. Eu penso e discuto muito com as pessoas sobre isso. Quando um dev remoto vai se tornar gestor? Quando ele vai ser promovido? Quando ele vai inovar na empresa (não em seu código, framework ou qualquer coisa técnica que não influencia nem 10% no sucesso da empresa)?

Só para termos um pouco de dados, um Dev fica em média 4.5 meses na mesma empresa, ou seja, eu invisto em contratação, em um salário bom, em desenvolvimento pessoal, em um office irado e o cara sai em 6 meses no máximo. Como eu consigo aumentar esse tempo, a partir do momento que eu não tenho esse dev dentro de casa? Ele não está sendo impactado diretamente pela minha cultura, ele não está ali fisicamente para um diretor ou até mesmo o dono chamá-lo para um bate-papo e corrigir qualquer “problema” que a empresa possa ter lhe trazido em algum momento. Então, não sou contra a empresa permitir remotos, muito menos para talentos que são de outras cidades, mas sou contra muitos devs que estão começando só aceitarem trabalhar se forem remotos. Acho que eles estão perdendo a chance de aprender muita coisa legal, principalmente não técnica.

Você pensa em mudar de área?

Hoje eu faço muitas coisas, empreendo, administro, produzo, escrevo, gravo, palestro, apresento, desenho, vendo, prospecto. São tantos chapéus que muitos usam o termo bonitinho de CEO. Tenho a minha empresa de recrutamento de Devs que tem crescido bastante e conseguido oferecer diversos empregos de qualidade aos programadores brasileiros e tenho a DeLuna Creative, onde presto consultoria, palestras e outras atividades criativas para empresas de ponta como Coca-cola, Furnas, Microsoft, Estácio, entre outras.

Recentemente fechei um projeto muito legal com a GoDaddy, onde me aproximarei ainda mais das comunidades de desenvolvimento, apresentando alguns dos produtos incríveis que já são um sucesso lá fora.

Acredito que esses projetos fazem parte da minha insanidade mental de estar sempre presente em muitos lugares, até hoje isso tem dado muito certo em minha vida. :)

Você não deve se tornar nada que não está ligado ao seu coração

Por que alguém deveria se tornar um(a) desenvolvedor(a)?

Você não deve se tornar nada que não está ligado ao seu coração. Você pode ser um construtor ou construtora de castelos de areia na praia, com muito sucesso. O conceito de sucesso é engraçado, pois ele é algo absoluto-pessoal (cada um define o seu próprio sucesso) mas relativo-dependente (o seu sucesso só acontece quando um outro te reconhece como bem sucedido). Ou seja, se o seu sonho é trabalhar em uma grande empresa como desenvolvedora ou desenvolvedor, foque toda sua energia nisso, um dia você estará palestrando por essa empresa e em cima do palco perceberá que alcançou o que sempre sonhou.

Agora, não coloque suas escolhas de código, frameworks, bibliotecas, ferramentas na frente de habilidades profissionais. A pior coisa hoje da tecnologia é grupinhos trazendo discussões improdutivas de qual linguagem é melhor. Outra coisa importante que está inerente da sua carreira, seja o mais gentil sempre. Nunca interrompa alguém porque você considera já ter a resposta, permita estar rodeado de diferenças, dando voz a todo tipo de diversidade, seja genética ou cultural, e por fim, compartilhe seu conhecimento, não ligando para quem tenta te diminuir por você ser X ou Y (você não precisa ser PHD em um assunto para compartilhá-lo, você precisa apenas ter atitude para isso).

Mais do que tudo, seja feliz, seja como programadora ou programador, seja como designer, seja como cartunista, como videomaker, como professor ou professora, como arquiteto de soluções, como qualquer coisa. Seja feliz e será meu prazer pessoal te ajudar nessa missão!

Este foi um post sobre como é trabalhar como Software Developer, porém temos também sobre como é trabalhar como Consultor de TI, por André Baltieri, Coordenador de Sistemas, por Jhonathan Souza Soares, Analista de Qualidade, por Érik Patekoski, Full-Stack Developer, por Ana Eliza, Front-End Developer, por Fernando Daciuk, Desenvolvedor Front-End, por Felipe Fialho, Back-End Developer, por Giovanni Cruz, Líder Técnico, por Elton Minetto e muitos outros. Confere lá!

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William Oliveira
Training Center

Engenheiro de software frontend, escritor do livro O Universo da Programação (http://bit.ly/universo-da-programacao), periférico e bissexual