Comer carne é um dano líquido? uma colaboração entre um comedor de carne e um vegetariano (parte 5)

Altruísmo Eficaz Brasil
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5 min readFeb 16, 2020

[Continuando a série de posts da “colaboração antagônica” entre um comedor de carne e um vegetariano, do blog StateStarCodex, chegamos ao tema do impacto ambiental do consumo de carne. Leia as partes anteriores aqui: Parte 1- Consciência animal , Parte 2- Condição de criação dos animais, Parte 3- Felicidade e vidas dignas de serem vividas, Parte 4-Implicações para a saúde humana]

5. Impacto ambiental

O impacto ambiental do consumo de carne é difícil de medir e agregar, pois os números são sensíveis ao tipo de criação de animais utilizado e à localização, e qualquer tentativa séria de medição requer uma enorme agregação de diferentes fontes de dados. A melhor que pudemos encontrar foi a do departamento de zoologia de Oxford, que combinou dados de 570 estudos, os quais tinham o ano mediano de referência de 2010, e cobriam 40.000 fazendas e 1.600 processadores agrícolas, tipos de embalagem e varejistas, em 119 países, de 40 produtos representantes de aproximadamente 90% do uso global de proteína e calorias. O estudo se concentrava em cinco indicadores de impacto ambiental: o uso do solo, a retirada de água doce pesada por meio da escassez local, gases do efeito estufa, emissões de substâncias acidificantes e emissões de substâncias eutrofizantes.

[Nota do Tradutor: A eutrofização ou eutroficação é o crescimento excessivo de plantas aquáticas, para níveis que afetem a utilização normal e desejável da água.]

No geral, a cadeia de suprimentos alimentícios atual cria aproximadamente 13,8 bilhões de toneladas métricas de CO2 equivalentes, que é cerca de 26% das emissões causadas por humanos. Também causa 32% da acidificação global do solo e 78% da eutrofização. Também consome bastantes recursos, pois cobre cerca de 40% da terra livre de deserto e gelo, e provoca mais ou menos 90% do uso de água pesado por meio da escassez, porque a irrigação devolve menos água aos rios e águas subterrâneas do que usos industriais e municipais, sendo predominante em áreas e épocas do ano com escassez de água.

Por conta de diferentes tecnologias e outras variáveis ambientais, o impacto ambiental de qualquer produto alimentício pode variar amplamente. Por exemplo, o 90º percentil das emissões de gases do efeito estufa provenientes de bovinos é 105 kg de CO2 equivalentes por 100 g de proteína, e o uso da terra (área multiplicada pelos anos ocupados) é de 370m2 por ano. Estes valores são 12 e 50 vezes maiores do que os impactos de laticínios bovinos no seu 10º percentil.

No entanto, como você pode ver abaixo, o impacto ambiental da carne sobrepuja o de qualquer outro recurso nutricional:

No total, carne, aquacultura, ovos e laticínios fazem uso de ~83% da terra agrícola do mundo e contribuem com 56–58% das diferentes emissões provenientes de alimentos, embora forneçam 37% da nossa proteína e 18% das nossas calorias.

Por conta de efeitos de substituição e exigências nutricionais, não é claro quanto destes recursos seria liberado se parássemos de comer carne. Num modelo simples em que presumimos que “proteína é proteína e calorias são calorias” e em que a terra então disponível apenas removeria carbono através da vegetação natural e do carbono acumulado no solo, “trocar as dietas atuais por uma dieta que exclui produtos animais resultaria na redução do uso do solo para produção de alimentos por 3,1 (2,8–3,3) bilhões de hectares (uma redução de 76%), incluindo uma redução de 19% na terra arável; de emissões de gases do efeito estufa provenientes de alimentos por 6,6 (5,5–7,4) bilhões de toneladas métricas de CO2 equivalentes (uma redução de 49%); da acidificação por 50% (45–54%); da eutroficação por 49% (37–56%); e de retiradas de água doce pesadas por meio da escassez por 19% (5- 32%), tendo por referência o ano de 2010.”

É difícil traduzir estes trade-offs em “um número” que capturasse o impacto ambiental do consumo de carne. É mais provável que a terra que atualmente suporta a pecuária seja menos suscetível à agricultura e a habitações urbanas, e é difícil de medir os custos das mudanças climáticas, do valor da diversidade de espécies e da futura escassez de água doce. Um modo (muito aproximado) de fazê-lo é presumir que a raça humana está poluindo o planeta tanto quanto sustentavelmente pode (com as tecnologias atuais, é bastante pior, mas somos otimistas sobre a ciência), e que o impacto de longo prazo de uma redução na poluição seria uma mudança no equilíbrio populacional humano proporcionalmente inversa.

Escassez de água, eutroficação e acidificação são preocupações ambientais sérias, mas podem ser administradas. Solo e emissões de gases do efeito estufa parecem ser as limitações mais importantes. Combinando as estatísticas do impacto de recursos total absoluto da cadeia de suprimentos alimentícios com o relativo impacto de parar de comer carne, o resultado é que se o planeta virasse vegetariano reduziríamos as emissões por 12,5% e liberaríamos 30% das terras hoje livres de deserto e gelo no mundo (das quais a maioria não poderia ser bem utilizada de imediato). Achamos razoável que a redução total na “poluição humana e uso de recursos” seria de cerca de 10%. Como recursos brutos e acesso a um ambiente um limpo não são os únicos fatores limitantes sobre o tamanho populacional, este resultado deveria ser ajustado para um valor inferior por um fator razoável.

No modelo, presumimos que sem o cultivo de carne haveria cerca de 12% mais de capacidade para população ou qualidade de vida, dos quais (só um palpite sem fundamento) 30% se realizariam como mais vidas e 70% se realizariam como vidas melhores (e contariam com um peso de 1/5, devido à habituação).

Leia a parte 6 do texto aqui!

Tradução: Luan Rafael Marques

Revisão: Fernando Moreno

Traduzido do original: https://slatestarcodex.com/2019/12/11/acc-is-eating-meat-a-net-harm/

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Altruísmo Eficaz é um movimento que busca descobrir e aplicar as formas de fazer o maior bem, usando para isto evidências e racionalidade.