Jornalistas deram dicas e revelaram detalhes e histórias de suas carreiras. (Imagem: Reprodução/Teams)

Beta Redação recebe três jornalistas esportivas gaúchas

Evento online contou com a presença de Débora de Oliveira, Valéria Possamai e Heloíse Bordin

André Cardoso
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8 min readApr 5, 2022

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Com Sara Nedel Paz e Thanise Melo

Todos os dias, mulheres lutam contra as estatísticas negativas e obstáculos relacionados à representatividade feminina no esporte. Atualmente, muitas mídias têm falado sobre o assunto e defendido o posicionamento contra o machismo nas práticas esportivas ou na atuação jornalística — levando para discussão temáticas sobre as dificuldades enfrentadas por elas.

Para falar sobre a mulher, o jornalismo, a formação e a área esportiva, a Beta Esporte recebeu, na segunda-feira, 28 de março, três referências do meio profissional: a apresentadora do programa Ponto e Contraponto da ABC, Débora de Oliveira, a produtora da Rádio Gaúcha Valéria Possamai e a produtora do Globo Esporte, da RBS TV, Heloíse Bordin.

A rodada de conversas começou com as experiências da jornalista formada pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), Débora. “Eu lembro quando estudava aí e a gente recebia os convidados para fazer esse tipo de bate-papo. É sempre tão especial e, agora, vamos se colocando no lugar deles, fazendo parte dos próximos ciclos”, revela.

O futebol passou a fazer parte da rotina de Débora ainda na infância, por influência do pai, o jogador Leonel de Oliveira. Atualmente, ela está retornando para a ABC FM para comandar o programa Ponto e Contraponto, na programação matinal do veículo, sendo um exemplo de empoderamento feminino em sua área de atuação.

De acordo com Débora, na cidade de Novo Hamburgo — onde cresceu — ela sempre fez parte de um ambiente em que as mulheres vivem o futebol naturalmente.

“Nunca tinha entendido ou pensado que esse era um lugar que não teria espaço para mim. Isso porque meu pai era jogador de futebol, minha mãe era rainha do time adversário e minhas primas, tias e vizinhas, iam aos jogos. Então, para mim, sempre foi muito natural. Fui entender que esse era o ambiente onde as mulheres tinham de galgar espaços quando eu cheguei no mercado de trabalho. Antes disso, não tinha essa noção”, relata.

Ao comentar sobre seu passado, a jornalista deixou claro que já esteve no mesmo lugar que os estudantes presentes e que “a gente tem que estar sempre preparado para todas oportunidades que aparecem”. Débora começou a carreira na Rádio ABC, em 1998, mas ao longo da sua jornada, chegou a Porto Alegre, em 2004, para ser a primeira mulher a integrar um programa de debates na TV Bandeirantes, no extinto programa Toque de Bola. Já em 2006, foi contratada pela RBS TV, onde atuou por sete anos como repórter das transmissões esportivas.

O jornalismo e os desafios do mercado de trabalho

Conforme Débora Oliveira, a paixão pela profissão pode vir de inúmeros motivos. No seu caso, surgiu através do amor pelo universo esportivo. “Escolhi fazer jornalismo, pois era uma forma que eu tinha para trabalhar com futebol”. Ela ainda comenta que, até mesmo nas aulas, priorizava as atividades acadêmicas direcionadas às práticas de rádio. “Naquela época, não dava a mínima para escrever e sempre deixava os meus colegas que queriam aparecer no vídeo como prioridade. Hoje, minha carreira toda é baseada praticamente na televisão, então a gente tem que estar sempre preparado”, ensina.

Foi através dessas experiências que a jornalista começou a pensar diferente e desenvolver uma visão renovada da área.

“Hoje digo que sou muito mais apaixonada pelo jornalismo do que pelo futebol. Se eu pudesse dar uma dica para vocês é a de que vivam todas as possibilidades que vocês têm, mesmo que seja numa rádio do interior, numa rádio pequena, no canal de vocês no YouTube ou no Instagram. Pois, aquela chance de vocês é que vai fortalecer os alicerces para construírem bases sólidas para vida profissional de cada um”, enfatiza.

O jornalismo tem espaço para quem procura exercer a profissão com amor e vontade. A profissional passou por várias experiências de vida e percorreu situações que mostram que atitudes banais do cotidiano podem se tornar grandes oportunidades. “O jornalista precisa estar atento. Eu fui para Argentina cobrir Grêmio e Tucumán, na Libertadores de 2017, e eu estava no voo com toda a delegação e o Renato disse assim para mim: ‘quero ver se dá pé quente. Porque senão tu vai voltar de ônibus lá da Argentina para Porto Alegre’. Eu quietinha gravei a fala no celular e, no dia do jogo, o Grêmio ganhou e fiz toda a minha matéria em cima do meu pé quente”, explica.

Para encerrar a produção com o gancho que ocorreu no voo, ela, que produziu toda a matéria da partida sozinha usando apenas o celular, foi atrás do desfecho perfeito. “O Renato ficou atendendo torcedores antes de entrar para o voo, então sentei lá no fundão e, quando ele entrou, eu já não tinha conseguido gravar o final. Aí chamei o dirigente Nascimento para levar meu celular para o Renato, porque eu estava com vergonha de ir lá na frente sozinha e ele disse: ‘não né, todo mundo aqui te conhece. Vamos lá! O Renato vai gravar’. E ele gravou. Encerrei a matéria com ele reconhecendo meu pé quente e dizendo que eu deveria sempre acompanhar a delegação. E são essas coisas que diferenciam o trabalho e a dedicação de um jornalista”, declara.

Para ela, muitas pessoas se destacam no meio jornalístico e inúmeros outros talentos se perdem. Por esse motivo, é necessário buscar o seu melhor. “Porque alguém vai estar vendo, alguém vai estar ouvindo, alguém vai estar assistindo e clicando. Nós não sabemos quem, mas alguém vai mudar e vai transformar nossa história. Então meu último recado é que vocês precisam fazer o que amam. Temos que aproveitar as oportunidades e dar o nosso melhor”, finaliza.

Alunos de jornalismo tiveram a oportunidade de ouvir os relatos de três jornalistas esportivas. (Imagem: Reprodução/Teams)

Me formo agora ou deixo para depois?

Graduanda em jornalismo pela UFRGS, Heloíse Bordin dividiu suas conquistas e desafios. Aos 23 anos, ela atua como produtora no Globo Esporte, da RBS TV. Anteriormente, atuou junto à Assessoria de Imprensa do Grêmio Náutico União, com atenção aos Esportes Olímpicos. Passou pela TV Pampa e, em seguida, foi para a Rádio Grenal, onde contribuiu como redatora, produtora de conteúdo e de reportagem. Nas temporadas 2020 e 2021 do Campeonato Brasileiro de Futebol Feminino, foi comentarista no canal do MyCujoo e da CBF TV.

Sobre o mercado de trabalho, Heloíse destaca que tem coisas que precisam melhorar, mas que avanços estão acontecendo. Ela e Valéria Possamai foram colegas na Rádio Grenal, parceria que perdura como uma grande amizade. Hoje, na redação do Globo Esporte, ela trabalha com mais mulheres do que estava acostumada.

“Te dá uma sensação diferente tu saber que tem outra mulher ali do teu lado, não só uma, mas muito mais”, comenta.

Heloíse ainda trouxe diferentes reflexões sobre a graduação de Jornalismo e as escolhas feitas nesse período, como optar por estágios que pagam mais ou aproveitar uma oportunidade e se formar em outro momento. Ela contou sobre sua decisão de tentar a vaga no Globo Esporte. “Será que eu vou ampliar minha faculdade? Vou deixar mais um tempo ou será que eu me formo e era isso? Me formo jornalista e deixo para quem está depois? Eu não poderia perder essa oportunidade de estar lá, como estagiária, aprendendo, sabe?”, explica.

Nesta mesma segunda-feira em que Heloíse participou da conversa, era um dia importante para ela, pois estreava o quadro “Como conquistei o Gaúchão”, sua primeira produção para uma série de reportagens. “Quando eu vi na TV, falei: meu Deus, eu consegui fazer, eu fiz isso! É muito legal ver que a gente consegue, sim.” E concluiu: “tem muita coisa que a gente ainda sonha em fazer, outras a gente sonhou e um dia aconteceram, e o que vai impedir de acontecer, né?”

Os sacrifícios e o prazer de trabalhar com o que se ama

Formada em Jornalismo pelo Centro Universitário Ritter dos Reis, Valéria Possamai iniciou sua trajetória na área estagiando na Associação dos Servidores da Justiça, onde permaneceu por quase dois anos. Por mais que sua paixão sempre fosse o futebol e o esporte, ela vê, hoje, com bons olhos a experiência acumulada no local. “Por exemplo, eu comecei em uma área que era ligada à justiça, não era bem o que eu queria, mas eu abracei e me deu uma base muito boa sobre um assunto que eu não dominava”, comenta.

Foi na Rádio Grenal que Valéria recebeu sua primeira oportunidade na área que tanto amava e ama. Por lá, permaneceu até 2021, quando ingressou na Rádio Gaúcha como produtora. Uma trajetória meteórica que requer certos sacrifícios.

“Eu fiz uma escolha. No início, às vezes precisamos escolher ganhar menos e trabalhar muito… Não parar em fins de semana, feriados, e isso pode ser difícil porque vivemos outra rotina em comparação com pessoas da nossa idade”, conta a jovem de 23 anos.

Mesmo com essa carga de responsabilidade a mais por trabalhar no maior veículo do Estado, ela ainda gosta de sair com amigos para se divertir. “Não podemos deixar essas coisas de lado. O importante é saber o momento e ter responsabilidade de estar comprometida com o trabalho. Por exemplo, trabalhar de ressaca ou ir ‘virada’ é praticamente impossível”, comenta aos risos.

Como produtora de programas como Sala de Redação e jornadas esportivas da Gaúcha, Valéria sempre busca inovar para tornar a transmissão mais interativa. “Na Gaúcha, estamos colocando em prática o projeto de ter uma transmissão digital no aplicativo. Dessa forma, o ouvinte consegue ver os bastidores de transmissão e interagir conosco. Quando o público está engajado, comentando nas redes, agrega muito”, pontua.

Mas nem sempre há somente o lado bom de trabalhar em programas de grande audiência. Por vezes, os comentários do público afetam o trabalho e a saúde mental dos envolvidos, sejam eles dos bastidores ou da linha de frente.

“A gente erra pra caramba. Eu já errei, errei na Gre-Nal e faz parte. O erro nos faz aprender outra coisa e observar isso para arrumar. Só não podemos ficar com isso na cabeça. É lidar com isso e seguir em frente”, diz.

Para os estudantes do curso presentes na conversa, Valéria deixa como dica aproveitar todas as oportunidades que a universidade e os estágios oferecem e se dedicar a tudo que for fazer. “É trabalhar, se esforçar, realmente amar o que está fazendo que alguém vai sempre estar olhando o teu trabalho e vai poder te indicar para algo. E tudo acontece no seu tempo, não tem necessidade de apressar nada”, finaliza.

Na Beta Redação, é possível encontrar diversas produções direcionadas a esse assunto com o propósito de lutar pela representatividade feminina no mundo esportivo. Confira:

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André Cardoso

Jornalismo/Unisinos. “Não há nada nobre em ser superior ao seu semelhante. A verdadeira nobreza é ser superior ao seu antigo eu”.