Em 1994, a melhor campanha do América na história da Copa Rio

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7 min readSep 23, 2023

Anderson Castro

Embora ainda não tenha conquistado o título da Copa Rio, o América esteve perto da taça em 1994. Foi na quarta edição do torneio, no tempo em que Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco ainda jogavam a competição. E o time rubro fez bonito nos clássicos: eliminou a dupla Vasco e Flamengo, mas caiu na semifinal, naquela que é, até aqui, a melhor campanha do Diabo.

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Batizada de IV Taça Estado do Rio de Janeiro, a disputa oferecia uma vaga na Copa do Brasil, uma competição bem mais enxuta que a atual. A vaga despertou a cobiça dos coirmãos, que viam nela um atalho para a Libertadores. Na ocasião, o quarteto da Série A do Campeonato Brasileiro só entrava nas quartas-de-final da Copa Rio.

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Apesar dos atrativos, as equipes geralmente mandavam a campo times reservas, a não ser que estivessem pressionadas. Os representantes do Rio na Série B do Brasileiro eram Americano e Bangu, vagas obtidas através de um classificatório disputado no ano anterior, em que eliminaram América e Itaperuna. O Diabo e o Campo Grande disputavam a Série C.

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A fase inicial era dividida entre capital e interior, totalizando quatro chaves. O grupo da capital tinha quatro times cada, e os dois primeiros avançavam para as quartas-de-final, onde eram aguardados pelo quarteto da Série A. Nos dois grupos do interior, era necessário vencer o grupo para seguir vivo na competição e enfrentar Americano ou Entrerriense nas semifinais. Neste sistema eram definidos os campeões da capital e do interior. Os dois primeiros colocados de cada região jogariam as semifinais, em busca do título da Copa Rio.

INSTABILIDADE SUPERADA

O América vivia um ambiente de incertezas. Recém saído do Andaraí e sem poder contar com o Estádio Giulite Coutinho, ainda em construção, o Diabo se via nômade. O clube vinha de uma frágil participação no Campeonato Carioca, na qual flertara até o fim com o inédito rebaixamento. Mas, aos poucos, o clima foi melhorando. Seu Edevair, pai de Romário, assumiu o cargo de diretor de futebol. O prestígio do pai do Baixinho contribuiu para a inclusão dos rubros no Brasileirão da Série C.

Time base: Ricardo Cruz; Marcelo Lopes, Saint Clair, Valtinho e Vanderlan; Zinho, Carlinhos e Berg; Vivinho, Álvaro e Rogério. Técnico: Luisinho Lemos.

Na Copa Rio, o América estava no Grupo 2, ao lado de Olaria, Portuguesa e São Cristóvão. Treinado pelo ídolo Luisinho Lemos, o clube montou um elenco proletário. O goleiro Ricardo Cruz era o nome mais conhecido. Após um começo irregular, estreando com derrota para o Olaria (1 a 0) e empatando sem gol com a Portuguesa, o América engatou uma sequência de quatro vitórias (2 a 0 no São Cristóvão, 3 a 1 no Olaria, 1 a 0 na Portuguesa e 1 a 0 no São Cristóvão).

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Líder de seu grupo, o América teria pela frente nas quartas-de-final o Vasco da Gama, liderado pelo artilheiro Valdir Bigode e as promessas Gian e Yan. O time era dirigido por Alcir Portella.

CLÁSSICO DA PAZ? NEM TANTO

Os sucessivos adiamentos do confronto com o Vasco fizeram o vice-presidente de futebol rubro, Antônio Tavares, acusar Eurico Miranda de interceder junto à Ferj em busca de uma data mais confortável para o clube, fazendo com que os interesses dos cruzmaltinos, que ainda jogavam o Campeonato Brasileiro, prevalecessem sobre os do Diabo. Inicialmente previsto para cinco de novembro, na Avenida Teixeira de Castro, o duelo acabaria remarcado para dois dias depois.

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Os rivais buscavam levar a partida para São Januário, mas um fax da Ferj manteve o confronto no estádio do Leão da Leopoldina, onde o América exercia seu mando de campo. No entanto, o vice-presidente da Federação, Álvaro Bragança, ex-presidente do América, alegou aguardar uma confirmação do clube, o que não teria acontecido. Assim, na data, apenas os comandados de Luisinho Lemos foram a campo. Bragança teria então, telefonado para o Bonsucesso, pedindo que fosse informado aos dirigentes o adiamento da partida. O que o dirigente não soube explicar foi a presença da equipe de arbitragem, designada pela própria entidade.

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Advogados do América reivindicaram os pontos da partida, uma vez que o clube não recebeu oficialmente nenhum pedido de adiamento. Os rubros ameaçaram abandonar a competição caso o jogo fosse remarcado.

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Todos os demais jogos foram realizados, e como o Vasco não enfrentou o América, a competição ficou parada. Durante o período de indefinição, o América manteve-se em treinamento, realizando coletivos e amistosos. A federação só resolveu marcar a primeira partida entre as duas equipes no dia 24 de novembro, 17 dias depois do adiamento. Porém, o América só foi avisado na véspera da partida e, por esse motivo, decidiu que não entraria em campo, pedindo mais uma semana para preparação. O Vasco, então, compareceu à Rua Bariri, disposto a enfrentar o América, que não compareceu.

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O árbitro Márcio Pereira Nascimento deu ao Vasco os pontos da partida por W.O. Após muita confusão, o confronto definitivo entre Vasco e América foi marcado para 26 de novembro, em São Januário. A Federação determinou que, em caso de empate, seria disputada uma prorrogação de 30 minutos. A partida terminou empatada em 2 a 2, gols de Tinho e João Paulo para o Vasco, e Berg e Baiano para o América. O cruzmaltino, entendendo que havia vencido a partida anterior por W.O. e estaria, portanto, classificado, não voltou para a disputa da prorrogação.

A decisão gerou um novo imbróglio, com alguns veículos da imprensa informando que o Vasco seria o adversário do Flamengo nas semifinais da competição. Posteriormente, o clube de São Januário desistiu de pleitear a vaga, pois já havia assegurado presença na Copa do Brasil de 1995, como campeão carioca daquele ano. O América garantiria então a vaga e, finalmente, enfrentaria o Flamengo.

AMÉRICA AFUNDA RUBRO-NEGRO NA CRISE

Jornal dos Sports deu destaque à vitória rubra, em pleno Estádio da Gávea

Precocemente eliminado no Brasileirão e sem nenhuma conquista na temporada, o Flamengo fechava a temporada e se encaminhava para as férias. No entanto, a diretoria do clube da Gávea viu na Copa Rio a possibilidade de se redimir de uma temporada ruim e decidiu que o clube entraria na competição com força máxima, adiando o descanso obrigatório do elenco principal, o que causou indignação dos atletas.

Não adiantou muito. Mesmo com o que tinha de melhor — Sávio foi a única ausência — o Flamengo foi superado pelo América por 2 a 1, na Gávea, em 30 de novembro. Todos os gols ocorreram no segundo tempo. Paulo Nunes abriu o placar para o Flamengo, mas Rogério e Baiano, de cabeça, viraram para o Mecão, em confronto marcado pelo clima eleitoral do clube rubro-negro.

Edição do Jornal dos Sports no dia seguinte ao segundo confronto com o rubro-negro na Rua Bariri

A pressão na Gávea cresceu ainda mais. Consciente de que o América contava com a vantagem do empate, o rubro-negro escalou Sávio para o jogo da volta, em três de dezembro, na Rua Bariri. Após disputa intensa, vitória do Flamengo por 3 a 2. Sávio, Rogério e Herbet fizeram para o rubro-negro, enquanto Carlinho e Vivinho descontaram para o América. Mas na prorrogação, deu América: Álvaro fez o gol da classificação, levando o time rubro à decisão do grupo da capital, contra o Fluminense.

TROPEÇO NA PRIMEIRA DECISÃO

Assim como o Flamengo, o Fluminense estava eliminado do Brasileirão e decidiu utilizar o elenco principal na Copa Rio. Os tricolores chegaram à decisão após eliminarem o Botafogo, que atravessou toda a competição com time misto. Acostumado a jogar com três atacantes, o América mudou de formação.

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Preocupado com o talento individual de jogadores como Luís Henrique e Djair, que atuara no América no ano anterior, vindo diretamente da Lazio, o técnico Luisinho Lemos decidiu fechar o time para o confronto, colocando mais um meio de campo, povoando o setor.

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A decisão ocorreu na Gávea, em jogo único. As alterações de Luisinho não surtiram efeito e, prejudicado pelas expulsões de Saint’ Clair e Marcelo Lopes, o América foi superado por 4 a 1. Leonardo, duas vezes, Galo e Lira anotaram para os tricolores. Álvaro fez o de honra dos rubros. Apesar do sabor amargo deixado pelo resultado, a equipe não estava eliminada. O vice-campeonato da capital garantia passagem para a semifinal geral da competição. Do outro lado, o campeão do interior: Volta Redonda.

NOVA OPORTUNIDADE PERDIDA

O time da Cidade do Aço venceu a chave do interior ao superar o Americano. O confronto entre Volta Redonda e América foi marcado para o Caio Martins, em Niterói. Em uma partida marcada por falhas defensivas dos comandados de Luisinho Lemos, o time do Sul Fluminense levou a melhor por 3 a 1. Gols de Ricardo, Denimar e Flávio para o Volta Redonda. Álvaro descontou para os rubros.

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Para chegar à decisão, seria necessário vencer o Volta Redonda no velho Raulino de Oliveira, para forçar a prorrogação. Metade da missão foi cumprida. Com gol de Valtinho, o América venceu no tempo regulamentar por 1 a 0. No entanto, Valtinho e Missinho marcaram para os anfitriões na prorrogação, fazendo com que o América desse adeus à Copa Rio.

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O Volta Redonda avançou à decisão e superou o Fluminense, para ficar com o título. Aquele foi o último ano em que os clubes da Série A do Brasileirão jogaram a competição.

*Anderson Castro é torcedor, sócio e ex-conselheiro do América.

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