POLARIZAÇÃO PARA DUMMIES, parte 3: LIBERDADE DE EXPRESSÃO
Bem-vindo ao terceiro episódio de nossa série ilustrada sobre as origens da polarização ideológica que tomou conta da vida digital — e os mecanismos, involuntários ou não, que nos arrastam para o bate-boca sem fim. (Se perdeu os anteriores, comece por aqui: POLARIZAÇÃO PARA DUMMIES, parte 1 e POLARIZAÇÃO PARA DUMMIES, parte 2: O ISENTÃO).
Capítulo VI: o quê é que eu vou fazer com essa tal liberdade (de expressão)?
O termo “liberdade de expressão” tem estado em voga nos últimos anos. Em especial no contexto de polarização fomentado pelas redes sociais.
Ninguém discorda disso.
Entretanto, o termo significa coisas diferentes para pessoas diferentes.
Vamos ver o que diz a Constituição brasileira, no título II, capítulo I (“Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos”), artigo 5º.
Assim como a manifestação do pensamento é livre, o direito de resposta é assegurado e as violações da honra e da imagem alheias são passíveis de sanção legal. Em resumo:
Muita gente, no entanto, só presta atenção na primeira fala da figura acima. Para essas pessoas, a liberdade de expressão é uma via expressa de mão única, sem radares nem bafômetros.
O reacionário acredita que a liberdade de expressão é, na prática, um salvo-conduto para dizer o que quiser sobre qualquer assunto, a qualquer pessoa, em qualquer situação, sem sofrer qualquer consequência. Ele pratica a parte do “todo mundo pode falar o que quiser…”
…mas quando é confrontado com as consequências de seu discurso, entra na defensiva.
Esse é o raciocínio (?) que justifica demonstrações de intolerância…
…arengas contra as mudanças nos valores da sociedade…
…a confusão entre fatos consumados e opiniões…
…incitações públicas à prática de crimes…
…e grosserias gratuitas disfarçadas de “franqueza”.
E ainda abre espaço para contradições e paradoxos dentro do discurso reacionário.
Já o conservador costuma usar a liberdade de expressão para justificar a criação de falsas equivalências…
…e/ou dar visibilidade para opiniões que contrariam o pensamento progressista (e, eventualmente, o bom senso ou mesmo a lei).
Liberdade de expressão sem responsabilidade + confusão entre opinião e fato + contaminação ideológica nos discursos = polarização ao cubo.
As redes sociais, como sempre, têm seu papel no cenário. Em nome da liberdade de expressão, as plataformas fazem “vista grossa” para fake news, discurso de ódio e outras manifestações de intolerância e desinformação. (Mas depende de quem posta, claro.)
Daí, quando as plataformas afinal resolvem aplicar suas próprias regras para coibir o “excesso” de liberdade de expressão…
…dá nisso:
Nesse momento, costuma surgir o isentão (que, como vimos na parte 2 dessa série, se diz isento mas sempre está do lado do conservador e do reacionário) pra dar aquela passada de pano…
…complicando ainda mais o panorama.
A liberdade de expressão é um direito fundamental. Mas como todos os direitos, também tem seus limites e sua contrapartida em deveres. Pense nisso antes de exercê-la. Quem não pensa nisso, acaba contribuindo para o grande mal contemporâneo disseminado pelas redes sociais: a polarização.
Sobre polarização, isenção e outras mumunhas mais, leia também:
A VINGANÇA DO MONSTRO DA CAIXA DE COMENTÁRIOS.
VERBOS ALTAMENTE IRREGULARES (à moda das redes sociais)
O PREÇO DO PROGRESSISMO É A ETERNA PROBLEMATIZAÇÃO.