7. Prisões e Chaves

No meu primeiro ano no acampamento de verão, ouvi rumores sobre a fogueira do sábado à noite. Algo estranho acontecia depois, me contaram, mas ninguém me dizia o quê.

No nosso primeiro sábado ao escurecer, me reuni com o restante das pessoas do acampamento para a caminhada de aproximadamente meio quilômetro até o local da fogueira. Não eram permitidas lanternas, e os instrutores nos orientaram a ficar de olho no caminho à medida em que andávamos pela floresta. A expectativa só aumentava.

Às 10 e meia da noite, quando o show de talentos acabou e os carvões da fogueira já piscavam na escuridão, finalmente descobri o grande segredo. Cada um dos jovens que iam pela primeira vez ao acampamento iria voltar pelo caminho da floresta, no breu, sozinho. Minhas botas mal amarradas só conseguiram sentir meus pés tremendo.

Anos depois, como um veterano de acampamentos e instrutor, eu saboreava a lembrança da minha primeira “travessia da noite”, um rito de passagem que ninguém te conta até que você já tenha que passar por ele.

Mas naquele momento, enquanto eu esperava pela minha vez de descer aquela pedra de granito amedrontadora, minha mente latejava de medo, ansiedade e pensamentos contestadores de alguém que sustentava orgulhosamente ter 11 anos. “Isso é ridículo! Quem eles pensam que são? Vou processar todos eles!”

Senti uma mão encostando no meu ombro. “Não se desespere”, uma instrutora gentilmente me aconselhou. “Nós temos te preparado para isso”.

E ela estava certa.

O Acampamento Deer Crossing era um lugar curioso e especial para se ir todo verão, e não apenas porque eles faziam crianças de 11 anos caminharem na floresta sozinhas. A primeira coisa que você aprendia no Deer Crossing era que, nesse acampamento, não era permitido dizer “eu não consigo”. Nem nas aulas, nem nas refeições, nem mesmo em conversas casuais.

“Com certeza vou acabar quebrando essa regra”, lembro de ter pensado quando a ouvi no primeiro dia. Ela me soava como um tipo de nobre pronunciamento que um diretor de escola exclamaria no primeiro dia de aula, sem efeito prático algum.

No entanto, nos meus primeiros dias de acampamento, percebi que todo mundo levava a diretriz a sério.

Não que ela fosse universalmente aceita: a consequência mais séria de dizer “eu não consigo” eram as zoações dos outros colegas de acampamento entoando em uníssono, “você o queeeê?”

Ainda assim, esse estranho princípio teve total sucesso num aspecto. No Deer Crossing você aprendia que toda vez que dissesse “não consigo”, você estava fazendo uma escolha. De forma delicada, os instrutores sempre nos lembravam que, ao invés de dizer isso, nós poderíamos dizer algo diferente: “eu poderia se…”

Meu primeiro “eu poderia se…” foi nas aulas de caiaque, quando estávamos treinando a manobra de virar os caiaques na água e sair mergulhando deles (nossos caiaques eram fechados em cima, estilo aqueles White Water).

Numa das minhas viradas, meu pé ficou preso, o que me forçou a engolir um bocado de água de uma vez só. Entrei em pânico e esbravejei: “não consigo andar nesse caiaque idiota!” Minha vontade era sair dali o mais rápido possível, mas meu instrutor me convenceu a pensar um pouco no “eu poderia se…” antes.

O que havia feito meu pé ficar preso no caiaque, e o que eu poderia fazer diferente da próxima vez? Ainda relutante, comecei a pensar em várias respostas possíveis.

“Eu poderia tirar meu pé mais facilmente se eu… usasse um tênis menor.”

“Sim, é uma opção”, o instrutor respondeu. “Que mais?”

“Se eu me curvasse mais pra frente?”

“Sim. Que tal mais uma?”

Quase fundi meu cérebro de tanto pensar. “Se eu… tomasse mais fôlego antes para ter mais tempo lá embaixo?”

“Perfeito! Vamos tentar essa”, disse ele.

Surpreendentemente, na virada seguinte, saí do caiaque que nem um peixe deslizante.

Se alguém tivesse me introduzido à estratégia do “eu poderia se…” na fase adulta, talvez eu a achasse uma daquelas coisas de autoajuda sem sentido. Mas para a minha versão de 11 anos que estava lidando com a expectativa de uma assustadora caminhada na escuridão, o “eu poderia se…” acabou sendo a chave que me libertou da prisão da descrença no meu próprio potencial.

Ao sentir meus joelhos trêmulos naquela fria noite na montanha, respirei fundo, me recompus, e então me perguntei: “eu poderia dar conta desse caminho se eu…

andasse até a ponta da pedra de granito, onde já começa a ter terra…

procurasse caminhar entre as duas árvores maiores…

e seguisse o barranco rochoso ao longo da trilha na floresta.

Dei o primeiro passo. Cinco minutos depois, já estava de volta ao acampamento.

O acampamento de verão me ensinou que meu hábito de dizer “eu não consigo” era uma prisão, mas havia uma chave: “eu poderia se…” Para fugir dessa prisão, tudo que eu precisava fazer era usar a chave e pensar de uma forma um pouco diferente.

Atitude é o recurso mais precioso de um aprendiz autodirigido. Para cada prisão, é possível encontrar uma chave.

Prisões e Chaves

Eu não consigo — Eu poderia se

Eu devo — Eu escolho

Não sei — Vou descobrir

Eu desejo — Farei um plano

Eu odeio — Eu prefiro

Eu preciso — Eu começo

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Alex Bretas
A Arte da Aprendizagem Autodirigida

Alex Bretas é escritor, palestrante e fundador do Mol, a maior comunidade de aprendizagem autodirigida do Brasil. Saiba mais em www.alexbretas.com.