Crescimento e criação de valor em ecossistemas: empreendedorismo, inovação e digitalização

Fabio Farago
Bridge Ecosystem
Published in
6 min readJul 13, 2021

Anteriormente, já abordamos o assunto de ecossistemas, explicando sobre sua estrutura de atores. Em um outro texto, mostramos por meio do caso da Tesla como esta empresa moldou o setor automotivo por meio da orquestração de um ecossistema de inovação. Caso você queira entender como desenvolver capacidades por meio do ecossistema, temos um texto onde apresentamos um modelo para auxiliar nesse processo.

Existem diferentes tipos de capacidades que estão presentes em ecossistemas de inovação e que precisam ser gerenciadas e fortalecidas para que o ecossistema se desenvolva. Clique aqui se você quiser entender quais são as 10 capacidades para a gestão de empresas operando em ecossistemas, pois nesse texto daremos um passo além mostrando as implicações dessas capacidades para a gestão dos ecossistemas de inovação. Partindo dessas capacidades, foi apresentado um modelo estruturado de capacidades para gestão de ecossistemas.

Figura 1: Modelo de Gestão das Capacidades do Ecossistema

O modelo apresenta as capacidades dinâmicas como elo central e impulsionador do conjunto das capacidades para a sustentação das empresas e do ecossistema, assim como para o alinhamento e crescimento do ecossistema. Isso porque as capacidades dinâmicas, como explicado no texto de capacidades, faz a transformação de todas as outras.

Neste texto, será apresentado o conjunto de capacidades para crescimento do ecossistema:

Capacidades para crescimento do ecossistema:

O conjunto de capacidades para o crescimento do ecossistema agrega as capacidades de inovação, empreendedora e digital.

1. Capacidade de inovação

A capacidade de inovação é a criação ou transformação de produtos, serviços, processos e modelos de negócios realizadas por duas ou mais empresas dentro de um ecossistema, que gera benefícios diretos ou indiretos a todos os participantes. Essa capacidade se desenvolve mais facilmente dentro de ecossistemas, pois estes propiciam um ambiente de colaboração, compartilhamento de recursos e conhecimentos e redução de custos de desenvolvimento. Tradicionalmente, a forma de se pensar na inovação empresarial é por meio de um modelo fechado, onde a inovação é um atributo interno da empresa. Nos ecossistemas, a inovação é aberta, envolvendo várias empresas e organizações e seu desenvolvimento vai além da soma do que qualquer empresa individual consegue entregar. Existe um conjunto coordenado de entidades atuando para gerar inovações em torno da proposta de valor do ecossistema.

O caso da Tesla é útil para entender em detalhes essa capacidade, já que é uma das montadoras mais inovadoras. Muitas inovações da Tesla no design, funcionalidades e projeto dos veículos foram desenvolvidas por meio de parcerias de P&D com outras empresas do ecossistema. Como exemplo, pode-se citar a tecnologia de carregamento ultrarrápido presente nos modelos mais novos. Esta inovação confere à Tesla com diferencial, que é a praticidade e velocidade de recarregamento da bateria, e foi fruto de um co-desenvolvimento com a Panasonic. Outro exemplo é a Apple que possui muitas de suas inovações criadas em parceria com diversos complementadores de seu ecossistema, que são todos os desenvolvedores que criam aplicações que geram valor para o usuário final do iPhone.

Assim como no caso da Apple, uma estratégia de ecossistema para aumentar a inovação é escanear o mercado em busca de startups que possam trazer inovações de produto, processo, modelo de negócios, ou marketing. Assim a empresa consegue ir escalando e tracionando o negócio e aumentando a intensidade de tecnologia dentro do ecossistema. Trazer inovadores e coordená-los dentro do ecossistema pode aumentar o know-how e as capacidades tecnológicas, facilitando o desempenho inovador e a geração de receitas de longo prazo. Atrair organizações para o ecossistema é uma estratégia para viabilizar as metas de inovação, trazendo novos talentos, novas culturas, novas tecnologias e novas formas de inovar.

2. Capacidade empreendedora

A capacidade empreendedora é a criação de novos negócios ou exploração de novas oportunidades por duas ou mais empresas do ecossistema, que gera benefícios diretos ou indiretos a ambos os participantes. Ecossistemas saudáveis e em crescimento frequentemente possuem essa capacidade bem desenvolvida entre as organizações do ecossistema, contribuindo para o lançamento de novos negócios, produtos e serviços para complementar a criação de valor no ecossistema.

Ainda no exemplo anterior, no caso da Tesla, pode-se citar a entrada em um novo mercado, o de carros populares, em parceria com a Toyota. Por um lado, a Tesla pretendia entrar em um segmento de carros de baixo custo, mas não tinha capacidade tecnológica suficientes. Por outro, a Toyota queria entrar em um novo mercado, o de carros elétricos, mas não tinha capacidade de produzir tal veículo, porém, é uma das líderes do setor de carros de baixo custo. Deste modo, por meio do ecossistema, ambas as empresas se beneficiaram e conseguiram entrar no novo mercado. Outro exemplo é o caso da Apple, que ao lançar o iPhone, financiou complementadores para formar um ecossistema e criou ferramentas de desenvolvimento de aplicações para auxiliar os complementadores. Neste caso também todos os atores se beneficiaram da capacidade empreendedora da Apple.

Uma ferramenta bastante utilizada no mercado e útil para a formação dessa capacidade dentro do ecossistema é o incentivo a realização de MVPs (produto mínimo viável), que consiste no desenvolvimento e teste rápido de hipóteses e soluções para o mercado. Essa ferramenta permite a validação de soluções com pouca utilização de recursos financeiros e de tempo. Firmas focais podem incentivar por meio de disponibilização de recursos como ferramentas para desenvolvedores e financiamentos para que complementadores testem MVPs relacionados à proposta de valor do ecossistema.

Tanto a capacidade de inovação quanto a de empreendedorismo são mais características no âmbito dos complementadores, que representam empreendedores e startups no ecossistema. Porém, seu potencial de inovação é dependente da empresa focal, que geralmente é a líder em tecnologia e conhecimento no ecossistema, bem como dos fornecedores que ora direcionam a inovação do ecossistema, e ora tem a necessidade de absorver as demandas de inovação. Deste modo, é preciso que exista alinhamento e liderança no ecossistema para potencializar a capacidade de inovação e de empreendedorismo.

3. Capacidades digitais

Por fim, a capacidades digital é definida como a aplicação ou desenvolvimento de tecnologias de codificação nas atividades de dois ou mais empresas do ecossistema, que gera benefícios diretos ou indiretos a todos os participantes. São aquelas capacidades que permitem às empresas aplicarem novas tecnologias em seus produtos, serviços ou processos. Essa capacidade é relevante pois muitas tecnologias digitais, principalmente aquelas ligadas à indústria 4.0 como a inteligência artificial e a internet das coisas, possuem um potencial disruptivo. Desse modo, podem trazer crescimento ao ecossistema que possuir essa capacidade bem desenvolvida entre suas organizações e apresentar um risco para ecossistema que não as possui, já que outros ecossistemas rivais podem a desenvolver.

Um exemplo da presença dessa capacidade no caso da Tesla pode ser observado em sua rede de manutenção de carros. Os modelos mais recentes possuem diversas tecnologias digitais e são frequentemente denominados de “aplicativo sobre 4 rodas”. Parte da manutenção desses veículos pode ser realizada remotamente, sem a necessidade de levar os veículos para a concessionária. Outro exemplo é a estratégia da Tesla de reduzir a quantidade de lojas de carros, para migrar para um modelo onde o cliente encomenda o veículo diretamente pelo website da Tesla. Ambas as aplicações digitais geram benefícios para a empresa e para os clientes.

Outro exemplo é o caso da Apple, na medida em que empresas tradicionais migram para modelos digitais, como os bancos desenvolvendo apps de internet banking, isto complementa a proposta de valor do iPhone para os clientes, gerando benefícios para diversos atores do ecossistema. Deste modo, a capacidade digital se mostra fortemente associada à inovação e ao empreendedorismo, mas demanda de todos os atores uma estratégia constante de aprendizagem para co-desenvolver e aplicar novas tecnologias digitais utilizando os recursos e capacidades de um ecossistema.

Firmas focais com pouca capacidade digital podem fazer uso do ecossistema atraindo fornecedores e complementadores que possuem conhecimento em tecnologias digitais e os alinhando para desenvolver aplicações úteis. Empresas intensivas em inovação, como por exemplo hospitais privados, frequentemente focam em seu core business, e para melhorar seu desempenho de inovação, monitoram o mercado em busca de fornecedores digitais que podem criar valor para seu ecossistema. Como exemplo pode-se citar startups de telemedicina, que é um ramo em rápido crescimento e que gera valor aos clientes de um hospital, tornando a formação de parcerias com esse tipo de negócio uma estratégia bastante benéfica para firmas focais do ecossistema hospitalar.

O conjunto dessas três capacidades exerce de modo mais proeminente a função de criação de valor no ecossistema. Muitos ecossistemas se criam em torno de capacidades digitais, como é o caso de plataformas como Uber, Airbnb e iFood. Esses ecossistemas são denominados de “plataformas”, e frequentemente empregam estratégias para aumentar a interdependência entre organizações, trazendo mais negócios para complementar a proposta de valor da plataforma.

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