Pense Pequeno: Feedback, feedback e FEEDBACK

Coloca um tchan nesse jogo

Thais Weiller
Game Start
6 min readJul 4, 2017

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Já sentiu um cheiro que te lembrou de alguma coisa? Você não consegue mais beber vodka depois daqueles porres com Balalaika que você tomou?

Isso vem do nosso grande amigo Pavlov. Talvez você não conheça esse nominho, mas você certamente está familiarizado com as conclusões do trabalho dele sobre a capacidade de associação e reconhecimento de sinais do cérebro.

Os experimentos mais conhecidos de Pavlov eram razoavelmente simples, mas ainda sim bem eficientes. Ele tocava um sino toda vez que alimentava cachorros. Após exposição suficiente a esse "treinamento", apenas ouvir o som do sino era suficiente para fazer os cães salivarem. Sem nenhuma outra referência a comida como ou cheiro ou a visão dela, os cães passaram a associar o som do sino à própria comida.

Isso acontece porque quando fazemos algo que é prazeroso, seu cérebro recebe um teco de dopamina. E dopamina é um negócio sério para o seu cérebro, ele tenta optimizar o recebimento dela o máximo possível. Então, se algo sempre acontece junto com o recebimento de dopamina, vamos chamar esse algo de estímulo, o cérebro começa a associar essa outra coisa com o prazer da dopamina também. Assim, só perceber receber esse estímulo, o cérebro já começa a liberar dopamina.

De forma semelhante, estímulos podem ser associados a coisas negativas. Pavlov usava choques para tornar estímulos negativos, você usou o vômito e a ressaca para associar reflexos negativos a balalaika. A associação negativa não tem uma reação tão forte no cérebro como a positiva com dopamina, então mesmo que muitas vezes a associação ocorra ela costuma ser menos imprecisa ou menos forte (você continua tomando Smirnoff que eu sei).

É por isso que, se você jogou Super Mario Bros, o som de pegar uma moeda do jogo ainda te faz ter uma sensação boa. Enquanto que o som de morte tráz algo negativo. Claro que a própria composição desses sons foi feita pensando nessas sensações, entretanto todas as milhares de vezes que você jogou Super Mario Bros, ouviu esses sons e imediatamente depois disso sentiu algo (bom ou ruim) conferiu a esses sons o poder de trazer um pouco do sentimento que o seguiu tantas vezes.

Quando estamos no começo de um projeto de jogo, tendemos a pensar que o feedback é algo mais para o final, um polimento a ser adicionado.

Isso é um grande erro. Adicionar informações visuais e sonoras de que o jogador está "fazendo certo" ou "fazendo errado" sem você ter que ficar pulando do lado avisando isso não só essencial para o entendimento básico da mecanica principal. É também um dos motivos para o jogador continuar jogando seu jogo e até, quem sabe, gostar dessa coisa aí que você fez.

Vou chamar esse estímulo de feedback, mas podia chamá-lo de juice ou de "o gostosinho" de jogar o jogo, todos expressões que já ouvi por aí. Prefiro feedback por que é o mesmo termo que o Mihaly Csikszentmihalyi usa para falar dos sinais que as pessoas percebem em uma atividade quando entram no flow. Pode soar um pouco confuso se você está acostumado a pensar em feedback como opinião de pessoas sobre o seu jogo, que é um sentido que eu uso também na vida mas não nesse texto.

Esses estímulos ou feedbacks vão servir para: 1) mostrar que o input que o jogador colocou foi recebido pelo (como o som de passos ou o deslocar do avatar); 2) mostrar o resultado da ação executada por esse input (som de pagar a moeda ou power up); 3) dar sentido a ação executada (sentido positivo ou negativo); 4) estimular a repetição das ações positivas e desestimular as negativas (você salivando pelo barulho do sino).

Então, antes de muita coisa pensa como você vai comunicar para o jogador o que é ~certo~ e o que é ~errado~. Estou colocando entre ~ por que certo e errado são termos muito contextuais, dependem de jogo a jogo ou do momento no jogo ou até o contrário do que deveriam significar para o jogador. Em jogos como Braid e Spec Ops, o jogador é levado a crer que certos comportamentos são ~certos~ quando na real são ~errados~. Mas tenha ciência que isso foi intencional e essa desilusão foi construída para ser assim e revelada apenas no fim. Enquanto no começo do jogo, o jogador é levado a crer que certos comportamentos são realmente certos.

Em jogos de luta, o som e as poses e expressões do personagem são os maiores comunicadores de ~certo~ e ~errado~, mas ao mesmo tempo temos outros estímulos para incentivar o jogador a dar ainda mais valor positivo para o ~certo~, como os combos e a comunicação visual deles.

Caixas de texto, efeitos coloridos e screenshakes são todos excelentes indicações para ajudar seu jogador a 1) entender o que está acontecendo e 2) gostar ou desgostar cada vez mais de fazer certas coisas, mas cuidado! Todos esses estímulos já carregam alguns sentidos, não imagine que você pode empregá-los como bem entender pois eles podem sim ser mal compreendidos por seus jogadores.

Um som que soa meio positivo pode ser problemáticos para passar a sensação de morte (a não ser que a ambiguidade faça parte do seu leitmotif), um feedback positivo vermelho pode não passar imediatamente esse sentido se seu público joga muito FPS. Claro que você pode construir esses sentidos dentro do jogo, mas sempre que possível tente tirar vantagem do que já é consenso entre seu público pois facilita a compreensão.

O screenshake é um dos meus feedbacks favoritos por que não é inerentemente nem bom nem ruim atualmente; há jogos que usam para comunicar desempenho positivo e outros para negativo. Não importa para qual você use, apenas use de forma consistente. Pavlov teve que repetir o estímulo junto com a recompensa diversas vezes até os cachorros associarem os dois, você deve fazer o mesmo com o seu jogador. E faça o máximo para não fazer estímulos que signifiquem coisas diferentes serem semelhantes (novamente, a não ser que a ambiguidade faça parte do seu leitmotif), caso contrário você corre o risco de só ser confuso pacas.

Agora, para balancear o número de feedbacks e a sua intensidade não tem muita regra. Imagine que você é dono de uma caixinha de luzinhas ou de carimbinhos de "legal" e "tente melhorar"; com qual frequência você deve usar cada um deles depende muito do feel do seu jogo e do ritmo que você quer passar. Jogos como Dark Souls tem muitos feedbacks de erro e acerto, mas não muitos para incentivar que o jogador continue acertando. Faz sentido no mundo de Dark Souls, que tem um ambiente austero e quer passar um feel de que tudo a ser feito no jogo requer trabalho e habilidade. Já jogos como Candy Crush dependem fortemente em seu feedback não só para comunicar erros e acertos, mas também para manter os jogadores interessados em jogar.

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