O case Mundial e como funcionará o negócio das editorias de nicho
Tradicional publicação de cultura e lifestyle de futebol prioriza assinaturas e construção de comunidades por meio de boletins informativos e tráfego direto. A escalada mira crescimento orgânico através de conexões diretas em vez de visualizações de página dentro de seu canal no Discord
Owen Blackhurst é saudosista do fim dos anos de 2010, quando as sextas-feira à tarde transformavam o Twitter no “melhor pub do mundo” para a resenha de futebol. E era um desejo do cofundador do Mundial reviver esta nostalgia uma década depois.
No mês passado, a publicação que melhor retrata a cultura do futebol e seus momentos icônicos escolheu 100 assinantes para inaugurar seu espaço no Discord. Ou melhor, um lugar que pretende funcionar como um clube para os fãs.
Duas semanas depois, o convite foi extendido a todos os pagantes da publicação trimestral.
O apelo gerado em um curtíssimo espaço de tempo é a resposta que o Mundial aguardava para seu entendimento de como funcionará as editorias de nicho: elas priorizam conexões diretas em vez de visualizações de página, e estão cada vez mais voltadas para a comunidade por meio de boletins informativos e tráfego direto.
Na verdade, esta foi apenas mais uma estratégia que endossa a sua atual máxima de que “as assinaturas e a criação de comunidades são os pilares” do negócio.
Em novembro, a Footballco, dona da publicação, anunciou uma parceria com a Ludo para criar um programa fidelidade que recompensa os melhores fãs do Mundial, reconhecendo todas as interações desde o envolvimento nas redes sociais à participação no Discord.
Com suporte financeiro da holding de mídia, o Mundial já preparava o terreno para se posicionar como uma “marca com conexões profundas e reais com pessoas reais.”
“A solução para o Mundial nunca foi ter 10 milhões de seguidores no Instagram — já temos uma marca a FootballCo que faz isso.”
A ponderação de James Lamon, vice-presidente sênior de conteúdo e criação, encontra-se em uma reportagem publicada pelo Digiday na qual ele e Blackhurst explicam como a visão de nicho está conquistando assinantes e criando uma comunidade.
Além da versão digital da revista que pode ser obtida por £9,99 a cada três meses, a Mundial introduziu recentemente uma newsletter semanal de formato mais longo pelo preço de £1,99. A contrapartida é um conteúdo exclusivo não veiculado na edição mais curta e aberta.
O próximo passo será conectar essa comunidade à ativações presenciais como o Hotel Mundial, que será retomado durante a Eurocopa de 2024. Sem acontecer desde 2018, o evento criou um espaço em Londres para veiculação dos jogos e venda de produtos.
Em tempos de migração do fandom para grupos fechados e que priorizam a qualidade, o Mundial desponta como um case relevante de como o crescimento orgânico e constante é o novo favorito, deixando para trás os espetáculos chamativos, conforme pontuou o Digiday.
Nos últimos meses, tenho mostrado este movimento e como há uma retomada do “impulso em direção à qualidade” direcionado pela economia do nicho. No caso da mídia, a grande questão é saber como criar um modelo de negócio sustentável no longo prazo. E o Mundial parece ter encontrado uma solução.
Em maio do ano passado, a The Block Point analisou detalhadamente a crise da mídia a partir da quebra da Vice e alertou: derrocada acontecia na sequência de quebras no setor, expondo saturação do modelo de alcance e cliques. Contra ditadura algorítmica, formato centrado na comunidade pode ser bote de resgate desta indústria
O pedido de falência é resultado de um período desafiador para muitas empresas de tecnologia e mídia que vêm cortando custos para sobreviver a um mercado publicitário fraco em meio à desaceleração do crescimento econômico.
Na corrida infinita pelo clickbait, a escala de audiência em detrimento da qualidade e otimizada para as plataformas algorítmicas das big techs criou um ciclo vicioso que coloca esta indústria contra a parede.
Projetando o futuro deste mercado a partir da distinção entre audiência e comunidade, mostramos como recompensar a participação dentro de grupos impulsiona a criação de valor. E não é exatamente o que o Mundial está propondo com o seu canal no Discord?
Em setembro, compartilhei este conteúdo que explica o conceito de Declan McGlynn para a economia do gosto.
Ela pode ser entendida como uma confluência de novos formatos que irão determinar as relações entre marcas e público na próxima década. Em suma, temos uma convergência da economia do nicho e do movimento rumo às comunidades restritas onde encontramos pessoas que compactuam das mesmas preferências.
“O futuro incerto dos feeds em todos os lugares, parece um bom momento para dar um passo para trás e imaginar o que pode estar à frente. Para fazer isso, é útil olhar para o passado.”
Essas reflexões não remetem ao que o Mundial está fazendo?
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