A segunda e desconhecida publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas (1880)
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Tema: a publicação dos primeiros nove capítulos do romance de Machado de Assis no Diário de Pernambuco.
Datas da publicação: 3, 5 e 6 de abril de 1880 (na seção Literatura).
Curiosidade: a informação (Conclusão), no início do terceiro episódio, sugeria aos leitores que a história findava no capítulo IX, tratando-se de um conto, e não de um romance.
Origem da reprodução: o início de Memórias Póstumas, publicado na Revista Brasileira em 15 de março de 1880.
Primeira publicação do romance: Revista Brasileira (Rio de Janeiro, RJ), de 15 de março a 15 de dezembro de 1880, em dezessete partes.
Publicação do romance em livro: 1881.
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A descoberta da publicação, até agora desconhecida, de parte do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas em jornal brasileiro, antes do lançamento do livro, deu-se por acaso.
Em 3 de junho de 2020, a tradutora da mais recente edição americana do romance de Machado de Assis, Flora Thomson-DeVeaux, redigiu um tuíte sobre a natureza da recepção da crítica à época do lançamento do livro: entre fria e hostil. Machado ressentiu-se tanto dessa reação que o cunhado teve de reanimá-lo: “A justiça será feita, mais cedo ou mais tarde, você pode estar certo”.
O reflexo de pesquisador assumiu o comando, e logo eu estava buscando na Hemeroteca digital da Biblioteca Nacional as resenhas do livro.
Um macete aprendido bem cedo em pesquisa histórica é o respeito às regras do idioma vigentes na época visada pela pesquisa. Assim, se alguém busca na Hemeroteca o conto fantástico O País das Quimeras, também de Machado de Assis, nada encontrará, porque o título que leva a resultados é O Paiz das Chimeras.
Portanto, a primeira providência nas buscas é saber como os contemporâneos redigiam o título ou o nome do autor. No caso da pesquisa sobre o romance, a forma correta é Memorias Posthumas de Braz Cubas.
Os resultados do primeiro periódico (apenas 6) levaram somente a anúncios, mas o segundo resultado do segundo periódico (o Diário de Pernambuco) levou a uma das experiências mais valorizadas pelos pesquisadores: “Será que eu descobri uma informação importante?”.
Na tela do computador aparecia o início do romance. Conferi a data: 3 de abril de 1880.
Memórias Póstumas de Brás Cubas saiu inicialmente em uma revista, e não em livro. A Revista Brasileira, publicada no Rio de Janeiro, lançou o romance em dezessete partes, de 15 de março a 15 de dezembro de 1880.
Essa obra já fazia parte de três cronologias publicadas por mim no Medium: ficção fantástica, ficção geral (folhetins, novelas e romances) e ficção sobre a escravidão. E a memória não trazia nenhuma informação sobre Diário de Pernambuco.
Uma rápida busca no Google e no Google Scholar (a seção do Google para trabalhos acadêmicos) nada revelou sobre a associação do romance com o periódico. A sensação de ter descoberto algo valioso se intensificava. E era boa.
Pesquisei então a continuidade da publicação de Memórias Póstumas no Diário de Pernambuco. Descobri, surpreso, que somente a primeira parte havia sido publicada, subdividida em três edições: as de 3, 5 e 6 de abril.
Mais: o editor havia incluído o aviso (Conclusão) no início do terceiro episódio, sugerindo aos leitores que a história de Machado de Assis terminava no nono capítulo. Seria, portanto, um conto, e não um romance.
Sem acesso ao texto da tradução de Flora, escrevi um tuíte em resposta ao tuíte original da tradutora:
A resposta veio uma hora depois:
Mesmo quem já viveu essa experiência muitas vezes, graças ao largo âmbito das pesquisas (no meu caso, toda a literatura brasileira do século XIX), comemora. Cada atividade com suas conquistas e prazeres.
A primeira publicação (integral) de Memórias Póstumas de Brás Cubas
No dia 15 de março de 1880, a Revista Brasileira (Rio de Janeiro) começou a publicar o romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, sem aviso ou introdução do editor.
A publicação se estendeu até 15 de dezembro do mesmo ano. São estas as datas e as páginas inicial e final de cada episódio ou parte da história:
1. 15 de março (número 3, páginas 353 a 372).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3306
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3325
2. 1.º de abril (número 4, páginas 5 a 20).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3390
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3405
3. 15 de abril (número 4, páginas 95 a 114).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3480
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3499
4. 1.º de maio (número 4, páginas 165 a 176).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3549
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3560
5. 15 de maio (número 4, páginas 231 a 242).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3617
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3626
6. 1.º de junho (número 4, páginas 292 a 305).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3678
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3688
7. 1.º de julho (número 5, páginas 5 a 20).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3938
http://memoria.bn.br/docreader/139955/3953
8. 15 de julho (número 5, páginas 125 a 138).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4058
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4071
9. 1.º de agosto (número 5, páginas 195 a 210)
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4128
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4143
10. 15 de agosto (número 5, páginas 253 a 272).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4185
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4204
11. 1.º de setembro (número 5, páginas 391 a 401).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4322
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4332
12. 15 de setembro (número 5, páginas 450 a 462).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4381
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4392
13. 1.º de outubro (número 6, páginas 5 a 17).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4455
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4467
14. 15 de outubro (número 6, páginas 89 a 107)
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4539
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4557
15. 1.º de novembro (número 6, páginas 193 a 207).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4643
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4657
16. 1.º de dezembro (número 6, páginas 357 a 370).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4806
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4819
17. 15 de dezembro (número 6, páginas 430 a 439).
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4877
http://memoria.bn.br/docreader/139955/4887
A segunda publicação (parcial) de Memórias Póstumas de Brás Cubas
Nos dias 3, 5 e 6 de abril de 1880, portanto ainda no início da publicação de Memórias Póstumas pela Revista Brasileira, o Diário de Pernambuco ofereceu a seus leitores, em sua inteireza, a primeira parte da história, referente à edição de dia 15 de março do periódico do Rio.
Repare que o terceiro episódio traz o aviso (Conclusão), utilizado naquela época para indicar o final de uma publicação seriada de história de ficção (geralmente, um folhetim).
O nome do autor também só costumava aparecer no final da publicação de histórias breves.
Assim, os leitores do Diário de Pernambuco foram levados a pensar naquela história como um conto, e não como um romance, de autoria de Machado de Assis.
A edição em livro (1881)
A edição do romance em livro, que gerou decepção em Machado devido à receptividade fria ou hostil dos críticos, saiu em 1881.
Essa reação não incomodou somente o autor. No ano seguinte (1882), o também romancista Aluísio Azevedo aproveitou uma de suas colunas sobre teatro para recriminar o comportamento dos críticos de jornais.
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Machado de Assis, um dos mais graduados oficiais da nossa literatura, lança ao público um mimo de concepção, de graça e de arte — as Memórias Póstumas de Braz Cubas, um trabalho de au jour le jour, não é um conto improvisado para encher o rodapé de uma folha diária, mas sim um livro meditado, escrito metodicamente, no qual o autor pagou uma grande soma de seus estudos e uma grande soma de seu talento. Não é um romance de enredo, é um livro de filosofia, de observação e de estilo.
Pois bem, como foi que a imprensa recebeu esse livro, que em qualquer país civilizado representaria um grande acontecimento literário?! O que foi que ela lhe dispensou? Quais as críticas que se levantaram em torno dessa obra excepcional?
Nada de valor! A imprensa constituída expressou-se a declarar que recebeu e que agradeceu o volume do Sr. Machado de Assis, e, para arredondar a frase, disse condescendentemente que a obra está bem impressa e que o autor tem talento…
O trabalho histórico é um processo sem fim. Caso a descoberta revelada nesta página já tenha registro em texto de algum estudioso do Bruxo do Cosme Velho (uma situação nada rara em pesquisa histórica), a retificação será realizada prontamente e o mérito alheio reconhecido sem ressalvas.
Links
Para ler o texto atualizado do romance:
http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=2038
Para comprar a tradução de Flora Thomson-DeVeaux:
https://www.amazon.com.br/Posthumous-Memoirs-Brás-Cubas-English-ebook/dp/B081M5RL5S/