10 MITOS SOBRE A PORNOGRAFIA

Ninka
Recuse A Clicar
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31 min readSep 18, 2020

Mito 1: A pornografia é uma FANTASIA e não afeta ninguém, nem homens ou mulheres, na vida real.

Realidade: A pornografia é violência filmada e real contra meninas e mulheres, e afeta a sociedade como um todo.

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A retórica comum e prevalente sobre a questão da pornografia é que ela é “apenas fantasia” e que as pessoas, homens e mulheres, participando das filmagens dos filmes pornográficos são meros atores. Para produzir o material pornográfico, os pornógrafos usam mulheres reais que engajam em atos sexuais reais. A esmagadora maioria dos atos praticados para a produção do conteúdo são baseados na objetificação, no silenciamento, e nos maus tratos e violência contra essas mulheres. Ser uma atriz não é igual a não ser um ser humano; e as mulheres usadas pela indústria são humanas reais, contrário à crença subjetiva que os pornógrafos querem gravar em nossas mentes e imaginário. Essas mulheres são constantemente sexualizadas, desumanizadas e sujeitas a ódio e abusos de todos os tipos. Nesse sentido, a pornografia não afeta somente a mulher diante das câmeras, e seus efeitos se extendem pra a sociedade como um todo — especialmente para as mulheres.

Mas se pornografia é fantasia, quais são as mensagena sendo transmitidas e quais são os efeitos dessas mensagens para a sociedade? Vamos dar uma olhada neles. O esquema principal ao redor da pornografia em geral é o seguinte: um homem, com um desejo sexual que sempre será satisfeito, e uma mulher que o homem irá usar como um objeto sexual para ter seu desejo satisfeito. O que a mulher quer é irrelevante, já que é considerada sua natureza querer ser usada e abusada e satisfazer o desejo do outro. A pornografia é, então, o veículo pelo qual as necessidades masculinas, e apenas as deles, são acolhidas e atendidas (Gail Dines, 2010). As mulheres não têm voz e “consentem” com as demandas dos homens: elas fazem sexo (ou deixam “sexo ser feito com elas” quando for e como for que ele queira, de uma forma que agrada a imagem de masculinidade à qual os homens foram socializados.

Na pornografia, “não” significa “sim”:

Os pornógrafos apresentam situações nas quais práticas sexuais começam sem um real consentimento mas, como não há os usuais indicadores de violência sexual — como a mulher resistindo fisicamente ou sendo agredida — violência sexual é retratada como se fosse sexo não violento. Na cultura do estupro, uma mulher que não está chorando, esguelando, ou tentando desesperadamente se defender não está sendo estuprada. Podemos então assumir que a violência sexual não apenas está sendo relativizada mas também erotizada e sexualizada. E essa ideia vaza para a sociedade.

Para as mulheres na pornografia, sua representação são baseadas em descrevê-las como objetos de penetração que merecem e servem apenas para uso e abuso sexual. Mas quando um homem urina, defeca nas mulheres, e quando eles a batem, dão tapas e as sufocam, eles estão fazendo aquilo de verdade. Não por “fantasia” e não é em nome da “atuação”. A imagem da mulher como pessoas que amam serem usadas sexualmente é claro pois, na pornografia, as mulheres estão sempre prontas pra sexo e estusiasmadas em fazer quaisquer que sejam as necessidades e vontades dos homens naquele momento. Seu “não” é ausente, elas não têm imaginação sexual e refletem aquilo que os homens querem. Elas também nunca estão preocupadas com o bem estar de seus corpos e com os ferimentos muitas vezes causados a elas e parecem imunes a serem diminuídas, humilhadas e violadas (Gail Dines, 2010).

A pressão sobre as mulheres para realizar essas “fantasias” é esmagadora, causando a elas danos físicos e psicológicos. Se recusar a os atos sexuais derivados de um script pornográfico é difícil para as mulheres pois nós fomos socializadas para pensar e acreditar que nós fomos designadas para satisfazer aos outros, devido ás retratações agressivas e pornográficas de práticas sexuais, não apenas na pornografia em si, mas também na indústria do entretenimento em geral. Retratações de relacionamentos sexuais pornificados são prevalentes; conteúdo sexual aparece em aproximadamente 85% dos principais filmes (Jamieson et al., 2008), em 82% dos programas de TV (Fisher et al., 2004), 59% dos clipes de música (Turner, 2011), 37% de letras de música (Primack, Gold, Schwarz, & Dalton, 2008), 22% de segmentos de rádio (Gentile, 1999) e em 21% de chamadas de revistas (Davalos, Davalos, & Layton, 2007).

A pornografia é uma forma de prostituição filmada no sentido de que é uma gravação de atos sexuais reais que não aconteceriam se não fosse o envolvimento de dinheiro. Enquanto admitimos que a pornografia não é o único tipo de material envolvendo sexo, é certo que ela é o mais prevalente e poderoso e irá ser um dos ingredientes principais que irá desenvolver e moldar a realidade e outros materiais eróticos segundo à sua dinâmica e narrativa. O argumento da “pornografia é fantasia” é usado principalmente por pornógrafos e usuários, como são eles que possuem investimento financeiro e emocional sobre ela. Essas “fantasias” são, como Gail Dines coloca brilhantemente, totalmente formuladas para moldar um mercado e orientada para o lucro dos produtores.

Se isso é fantasia, que já sabemos há tempos estar influenciando as mentes e corpos e comportamentos de nossa sociedade, especialmente dos mais jovens, é esse o tipo de mensagem que queremos que seja passada? A pornografia cria um mundo que é falso em muitos sentidos, mas será que podemos dizer honestamente que as mensagens desse mundo permanescem ali dentro da tela e não gera efeitos reais e mensuráveis no mundo palpável, real?

“A mensagem transmitida pela indústria pornográfica é que há um tipo de mulher retratada na pornografia que quer e merece ser humilhada. Por detrás de títulos como “Mulher Africana Ilegal Transa por Comida”, “Jovem Menina Pornô transformada em um Lixo de Porra obediente”, e “Adolescente Tem Sessões de Sexo com o Papai” há mulheres e meninas reais , com histórias reais, que são forçadas ou coagidas a suportar a violência real, a dor real, a humilhação real. A pornografia não é um conceito que existe apenas na imaginação daqueles que estão envolvidos, e não é coiscidência que a indústria recrute meninas e mulheres que são marginalizadas, vulneráveis socioeconomicamente e que já tenham anteriormente sido expostas a várias formas de violência física e sexual. Nos olhos daqueles por trás da indústria, sua vulnerabilidade e falta de oportunidades e reais opções é o facilitador da exploração”.

Mulheres, de carne e osso, são levadas a suportar atos sexualizados degradantes, desumanizantes e violentos. Quem são essas tão chamadas “mulheres fantasiosas” encontradas na pornografia? Na indústria do sexo, seu nome é “vadia” , “puta suja” que “tem o que ela merece”. Além do abuso verbal, ela é exposta a atos extremos e degradantes. Cospem nela, a amarram, a agridem. Três ou mais homens a penetram oralmente, vaginalmente e analmente de uma vez só, o que é chamado de “gangbang”. Lágrimas escorrem pelo seu rosto enquanto ela é sufocada pelo pênis a penetrando violentamente pela boca, frequentemente logo após aquele pênis ter penetrado seu ânus ou o ânus de outra mulher, contendo remanescentes de fezes. E nada disso acontece na imaginação de alguém- tudo isso e mais, é real.”*

Links e referências:
* Talita Reality Check: https://www.reality-check.nu/wp-content/uploads/2019/01/10-myths-about-porn.pdf

Mito 2: Assistir pornografia é uma atividade normal e uma necessidade humana natural!

Realidade: Décadas de ativismo e pesquisas descobriram as consequências prejudiciais diretas da coerção da indústria pornográfica sobre os meninos e jovens para torná-los viciados em práticas sexuais violentas, moldando suas expectativas para relacionamentos íntimos.
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A pornografia hoje está em todo lugar e somos levados a acreditar que todo mundo assiste pornô — com exceção de religiosos fanáticos e puritanos. É o maior tabu em aberto na sociedade — algo que está presente em todo lugar e supostamente todo mundo usa, mesmo que não seja considerado educado falar sobre isso abertamente.

Somos ensinados que a pornografia é o “pequeno segredinho sujo” de garotos jovens ou homens adultos crescidos, e isso é feito através de uma série de comentários e piadas sobre como os homens têm que esconder seus históricos de pesquisas online ou, mais antigamente, esconder suas pilhas de “revistas e vídeos secretos”. Esse tipo de ‘piadinha’ não falta em filmes e séries ou mesmo na vida real. E sempre há aqueles jornalistas e pesquisadores que parecem ficar realmente bem felizes quando descobrem que mulheres e meninas também assistem pornografia — não é essa uma incrível evidência de “igualdade de gênero” e prova cabal da normalidade da pornografia?

De fato, as pessoas até acreditam que até mesmo as feministas em geral assistem e apoiam a pornografia, a considerando como algum tipo de libertação sexual feminina, e que pornografia e liberdade feminina estão de alguma forma intrinsecamente ligados. “Meu corpo minhas regras”?

Bom, tudo isso são um bando de mentiras.

A oposição feminista à pornografia sempre existiu. Mesmo sendo as feministas que primeiro se abriram sobre o existente desejo sexual feminino, elas sabem que a pornografia era primeira e principalmente uma ferramenta da sociedade sexista para retomar o poder sobre as mulheres e seus corpos. Para as feministas a pornografia é justamente uma falha na libertação sexual das mulheres — no final das contas, essa tal liberdade acabou sendo cooptada e sequestrada por cafetões e pornógrafos* que estão no comando geral do mercado sexual.

Cada vez mais, há também muitos homens (e diversos outros grupos sociais) tomando posições firmes contra a pornografia. Notem, no entanto, que grande parte dessas pessoas nem o fazem por uma perspectiva feminista ou mesmo social. Eles consideram a pornografia como sendo altamente viciante (como as pesquisas em neurociências já vêm mostrando), deturpando e remoldando suas mentes para pensar em mulheres como menos que humanas e causando danos intensos em suas próprias vidas e relacionamentos íntimos pessoais. A pornografia também vem sendo associada com os crescentes índices de disfunção erétil, agora comum mesmo antes dos 40 anos.

Como o famoso ator, Terry Crews, coloca, “ela [a pornografia] muda totalmente a forma como você pensa sobre as pessoas. As pessoas se tornam partes do corpo. Elas se tornam coisas para serem

usadas, ao invés de pessoas a serem amadas”. Precisamos que um ator famoso repetisse em público e em voz alta os argumentos que aa feministas e ativistas antipornografia já vêm usando há décadas para que a luta antipornografia fosse espalhada e levada mais a sério pelo público em geral. E muitas pessoas responderam a Crews dizendo que a pornografia havia destruído suas vidas e seus relacionamentos com mulheres na vida real. Hoje, Crews lidera um movimento que encoraja homens a largarem a pornografia e, desde a declaração da pandemia, vem encorajando a todos a passarem a quarentena livres de pornografia [1].

Para a indústria da pornografia, a ideia de que as pessoas (homens, em particular) possam não assistir ou gostar de pornô, ou admitir que ela causa danos em suas vidas, é uma completa blasfêmia. [2] Bom, eles têm um produto para vender! E, para que esse produto alcance mais consumidores quanto o possível, também vende-se a ideia de que um homem precisa de pornografia, ou que não é homem o suficiente se não gostar ou não quiser assisti-la. Feministas e ativistas antipornografia se tornaram alvos de campanhas de ódio, mas mesmo comunidades que se centram apenas em se opor ao vício na pornografia, como o NoFap, cresceram e causam ódio na indústria pornô e em seus usuários mais fervorosos, resultando no espalhamento de campanhas de ódio e difamação. (Quem aí ja ouviu que somos “fiscal de punheta alheia”? “moralismo barato”?)

Existe esperança — apesar do grande poder da indústria da pornografia (uma indústria que movimenta bilhões), tanto homens quanto mulheres estão começando cada vez mais a se atentar às pegadinhas dessas falácias de que “todo mundo usa” e aos danos potenciais do uso de pornografia. É importante mostrarmos, talvez especialmente para os mais jovens, que assistir pornografia não é algo que “todos os adultos fazem”, não é um “segredinho sujo mas inofensivo” e não, nem todas as pessoas assistem e muitos homens e mulheres são críticos sobre seus próprios hábitos de consumo, conscientizando-se sobre os impactos sociais da pornografia, seu impacto em relacionamentos, sobre os impactos na saúde física e mental de seus usuários, e sobre os impactos nos direitos das mulheres, principalmente as mais vulneráveis.

Então, não se sinta estranho ou acanhado por não gostar de pornografia e se recusar a assistir, ou querer largá-la. Você não está sozinho. E no final, estará fazendo um favor a si mesmo e às pessoas ao seu redor.

Links e Referências:

[1] Live com Terry Crews, #NoPornQuarantine:
https://medium.com/recuse-a-clicar/live-com-terry-crews-nopornquarantine-aaa7a6638641

[2] O Problema em Dizer que “Homens Precisam Assistir Pornô”:
https://medium.com/recuse-a-clicar/o-problema-em-dizer-que-homens-precisam-assistir-porn%C3%B4-d0e42245d7eb

* Not a Love Story: A Film About Pornography (1981) https://www.youtube.com/watch?v=oKop44I0MP8

* In Harm’s Way: The Pornography Civil Rights — Catharine A. MacKinnon and Andrea Dworkin Hearing — http://radfem.org/dworkin/

* Meagan Tyler — Harms of production: theorising pornography as a form of prostitution:
https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1Sp1dt8xxnW2PrpB_LrnKgbPcFvvT0SUA

Mito 3: A pornografia é apenas atuação, a mulher ali retratada é apenas uma atriz.

Realidade: Tratar mulheres na pornografias como apenas atrizes é um artífice utilizado para fingir que elas não são pessoas, seres humanos reais. Isso nos compele a considerar os vídeos como mera fantasia, esquecendo que por trás de toda pornografia “hardcore” há sangue e dores reais.
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Quando conversamos sobre os males da pornografia, a maior parte das pessoas rapidamente apontarão que não devemos levar o que está na pornografia a sério. A pornografia, eles dizem, é só fingimento — como se fosse um filme ou uma peça de teatro, não deveríamos estar preocupados se a “atriz principal” está chorando ou se parece estar sentido dor. Isso apenas mostra o quão “boa atriz” ela é!

Na pornografia, o “sexo” não é sugerido ou indicado — ele é real. E, quando a pornografia é violenta, esses atos de violência usualmente também não são forjados.

Um estudo muito citado de 2010 intitulado “Aggression and Sexual Behavior in Best-Selling Pornography Videos: A Content Analysis Update”[1] revelou que “88.2% das cenas mais populares da pornografia na época continham agressão física, principalmente espancamento, engasgamento e tapas”, e que “o alvos das agressões eram esmagadoramente as mulheres” [e esse estudo já está fazendo 10 anos, vocês acham que melhorou ou piorou?]. Essas agressões físicas contra as mulheres não são “atuações” — as mulheres estão, de fato, sendo espancadas, engasgadas, estapeadas para a produção dos vídeos.[2]

De fato, a pornografia é tão real que deixa traços físicos duradouros nos corpos das chamadas “atrizes”, incluindo prolapsos anais, vaginais, abcessos de Bartholin, infecções de trato urinário, vaginoses bacterianas e DSTs.

Mulheres na pornografia são “atrizes” da mesma forma que as mulheres na prostituição também estão “atuando” quando dizem estarem se sentindo atraídas pelos compradores de sexo ou sentindo muito trazer naquele ato sexual coagido. É o mesmo tipo de “atuação” que toda mulher e garota é treinada a fazer com o objetivo de agradar aos homens, para que uma violência ainda maior consiga ser evitada.

Os usuários de pornografia nunca conseguem saber a história real das mulheres por detrás desses vídeos. Quer ela pareça estar sorrindo, ou chorando, ou em dor ou em êxtase, não há maneira de simplesmente olhar e dizer se a mulher está sendo abusada, manipulada, coagida, estuprada ou traficada. Tudo que você pode ter certeza é que o ato sexual sendo mostrado a você está realmente acontecendo — não é atuação.

Chamar as mulheres na pornografia de “atrizes” é uma ferramenta para fingir que elas não são seres humanos reais e que não tem atos reais sendo realizados com seus corpos. Isso nos compele a nos perdermos em uma “fantasia”, nos esquecendo que por detrás de cada cena de pornografia violenta existe sangue e dores reais.

TESTEMUNHO
“Existe o que chamamos de pornô ‘gonzo’: nós somos espancadas bem forte, somos cuspidas, nossos cabelos são puxados. Eu tive que gravar sozinha com 35 homens. Todos eles usavam máscaras. Eu tive queimaduras no meu corpo devido ao esperma.. eu vi dildos de tamanhos ridículos, três vezes o diâmetro de uma garrafa. Um produtor me forçou a colocar o pé de um cara nas minhas partes íntimas e colocar uma camisinha nele. Outro homem urinou em minha boca enquanto eu estava fazendo oral nele” — Nadia.

Links e referências:

In Legardinier, Claudine (2017) “Nadia: ‘Le X c’est de viols à répétition, c’est inhumain’”. Prostitution et Société, juin 2017.
http://www.prostitutionetsociete.fr/temoignages/article/nadia-le-x-c-est-des-viols-a-repetition-c-est-inhumain

[1]Bridges, A. et al., (2010) “Aggression and Sexual Behaviour in Best-Selling Pornography Videos: A Content Analysis Update”, Violence Against Women, 16 (10).
[2] https://medium.com/recuse-a-clicar/pornografia-%C3%A9-prostitui%C3%A7%C3%A3o-gravada-e-totalmente-descriminalizada-e-isso-n%C3%A3o-a-torna-segura-f262f357fa07

Mito 4: Sites de pornografia barram vídeos de estupros e/ou de vítimas do tráfico.

Realidade: É impossível para sites de pornografia regular todos os vídeos e avaliar se há “consentimento” real. E quanto mais cruel e violento o vídeo, mais visualizações ele atrai e mais dinheiro é gerado.
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Muitas pessoas são rápidas em condenar um vídeo de pornografia quando sabem que ele explora uma criança ou retrata vítimas de tráfico humano. Eles querem acreditar que os sites de pornografia encontraram uma maneira legítima de regular o tipo de conteúdo que está disponibilizando, certificando que as mulheres ali são maiores de idade e que consentiram aos atos sexuais que foram performados com seus corpos.

Já discutimos anteriormente sobre como é impossível separar a violência sexual real da pornografia com retratações de mulheres que são supostamente atrizes a estariam “atuando”, e como é praticamente impossível provar ou constatar um consentimento continuado. Isso também tem a ver com o fato de que os sites de pornografia de fato não regulam o tipo de conteúdo que está sendo colocado no site.

O Pornhub permite que os usuários subam seu próprio conteúdo na plataforma, o tornando virtualmente o ‘youtube’ da pornografia. Para subir um vídeo, você não precisa de um documento ou uma busca de antecedentes, apenas um endereço de e-mail. O site também não verifica de nenhuma forma informações como idade, se tanto o sexo quanto a filmagem quanto a distribuição foram consentidos, ou seja, se os participantes concordaram em ter o vídeo exposto publicamente.

Apesar disso, o Pornhub clama ter uma política estrita sobre o tipo de conteúdo que eles permitem que seja colocado em seu site. (Inclusive, recentemente afirmaram que cada vídeo seria avaliado manualmente por um vasto grupo de moderadores). A realidade apenas nos prova o contrário. Por exemplo, em 2009, Rose Kalemba descobriu o vídeo de seu estupro de quando tinha apenas 14 anos sendo distribuído por todo o Pornhub. Kalemba diz e mostra ter pedido para que o vídeo fosse removido durante 6 meses, mas seus pedidos foram ignorados (e hoje tem sua conta no twitter bloqueada pela conta oficial do Pornhub). Enquanto isso, os vídeos com títulos variados como: “adolescente chorando e sendo estapeada”, “adolescente sendo destruída”, “adolescente desmaiada” foram assistidos quase meio milhão de vezes.[1]

Histórias como a de Rose não são apenas exceções. Por exemplo, no último mês de Outubro, uma menina desaparecida de 15 anos de idade foi encontrada através de aproximadamente 60 fotos e vídeos pornográficos em sites como o Pornhub.[2]

Porque o Pornhub e outros sites de pornografia não podem desenvolver uma maior segurança digital? Isso é porque, na realidade, eles são cúmplices que lucram com o tráfico sexual em massa e a exploração principalmente de mulheres e crianças. Eles fazem dinheiro dessa falta de regulação. Na realidade, a indústria pornográfica tem uma ligação íntima com o tráfico sexual.[3] Eles já são cúmplices e culpados de distribuir vídeos de estupro e abusos por toda a internet e as entidades responsáveis ainda precisam começar a responsabilizá-los por isso.

A recente campanha #TraffickingHub trabalha para garantir que os grandes jogadores da indústria da pornografia sejam responsabilizados pela facilitação, promoção e lucro sob o abuso sexual de principalmente mulheres e menores — como de fato eles devem ser. Você pode conhecer melhor essa campanha global e a petição para que o Pornhub seja derrubado aqui: https://traffickinghub.com/.

Não existe nenhuma forma de garantir que o conteúdo pornográfico que você está vendo online não está retratando uma vítima de estupro, de tráfico, de coerção, de abuso. Então, enquanto sites de pornografia continuarem a existir, eles estarão se alimentando de pessoas vulneráveis, principalmente mulheres e crianças, gerando demanda por sua exploração. [4]

[1] https://www.bbc.com/news/stories-5139198.
[2] https://nypost.com/2019/10/24/mom-finds-missing-teen-girl-by-spotting-her-on-pornhub.
[3]https://medium.com/recuse-a-clicar/for%C3%A7a-fraude-e-coer%C3%A7%C3%A3o-entendendo-a-superposi%C3%A7%C3%A3o-entre-pornografia-e-tr%C3%A1fico-sexual-465203b585ad
[4]https://medium.com/recuse-a-clicar/quanto-mais-real-era-a-dor-mais-visualiza%C3%A7%C3%B5es-eu-tinha-confiss%C3%B5es-de-uma-atriz-porn%C3%B4-de-bdsm-6153a8c89922

Mito 5: Pornografia amadora é melhor que a mainstream porque é autêntica (e mais segura).

Realidade: Muito da pornografia amadora é divulgação de sexo sem consentimento (na filmagem e/ou da distribuição) e vídeos de estupros reais.
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Quando as pessoas pensam sobre “pornô amador”, eles imaginam um casal fazendo um vídeo deles fazendo sexo, que depois eles podem usar privadamente ou colocar na internet para fazer dinheiro. A “pornografia amadora”, então, parece escapar de toda a dinâmica exploradora da indústria da pornografia, e ela é um ‘escape’ muito popular pois oferece uma alternativa para os usuários que querem ver alguma coisa mais ““autêntica””.

Mas sob o disfarce de “pornografia amadora”, vemos os casos de vídeos de encontros sexuais reais publicados ou distribuídos sem o consentimento das partes — na maior parte das vezes, das mulheres. Esses vídeos são uma forma de abuso e violência sexual baseado em imagens, que pode incluir o que chamamos de “pornografia de vingança” (quando alguém divulga conteúdo sexual de forma não consensual com o objetivo de humilhar ou se vingar de alguém, frequentemente após o término de um relacionamento), vídeos onde uma das partes foi forçada ou coagida de alguma maneira a gravar, o que chamamos de “upskirting” (fazer vídeos ou fotos de mulheres por debaixo de suas saias, o que se tornou uma categoria em sites de pornografia).. ou mesmo gravações de estupros reais.

Além disso, a “pornografia amadora” é chamativa porque é tida como uma alternativa aos pornôs com atrizes populares. Então, se você quer ver uma “profissional”, você segue uma atriz pornô; mas se você quer ver algo mais parecido com “a garota que mora ao lado”, você vai procurar por pornografia amadora.

Os participantes na pornografia amadora não são esperados a ter a aparência estereotipada das “estrelas pornô”. Espera-se que as mulheres se pareçam com moças jovens, mais inexperientes, que estão fazendo pornografia pela primeira vez com algum homem de suas vida. É também inspirado por ideias sexistas de “perda da inocência” que parece excitar os usuários de pornografia, o que contribuiu bastante para a popularidade desse “gênero” de pornô.

Mas a história da “pornografia amadora” é em sua maior parte tudo parte de uma mentira. As garotas nesses vídeos “amadores” são mais frequentemente ou atrizes como em qualquer outro vídeo, mas que foi feito parecer amador, ou vítimas de pornografia de vingança ou violência sexual gravada.

Não são raros os casos de estupros reais serem colocados em sites de pornografia — com a ideia de que seriam pessoas atuando uma história fantasiosa. Como o mito #4 nos ensinou, os sites de pornografia não regulam os vídeos que estão sendo colocados na plataforma. Isso significa que não existe nenhuma maneira de os usuários estarem 100% certos de que não estão assistindo um vídeo permeado de violência sexual ou falta de consentimento na gravação e/ou divulgação.

Não caia na armadilha de pensar que a “pornografia amadora” é apenas a versão online de vídeos de sexo caseiros. Por trás, o grosso do conteúdo é ditado pelas mesmas dinâmicas de exploração e violência que o resto do mercado da pornografia. Mesmo os sites chamados de sites de “sexo real”, que dizem que seu objetivo é oferecer uma alternativa “real” e “íntima” da pornografia “normal” (como o MakeLoveNotPorn) frequentemente acabam hospedando e lucrando de abuso e exploração de pessoas reais, e apesar dos esforços para controlar quem posta o que, eles ainda são responsáveis por criar espaços onde abusadores são legitimados. Para colocar de maneira simples, você nunca saberá se as pessoas participando dos vídeos passaram livremente por todas as etapas de consentimento para que aquele material chegasse até você.

Claro, você poderia dizer que esse é o caso com qualquer formato de mídia ou conteúdo online. Mas devemos reconhecer que os contextos sexuais são especialmente vulneráveis a serem palco para esses tipos de abuso: muitos homens frequentemente tomam vantagem sobre a vulnerabilidade de outras, principalmente de mulheres e garotas, manipulam, coagem e as abusam por status, poder e humilhação em encontros sexuais e relacionamentos — “convencer” suas parceiras/os a gravar pornografia ou distribuir o material pode ser apenas mais uma ferramenta no arsenal.

Alem disso, a humilhação e destruição da vida de uma pessoa que pode acontecer como consequência de ter sido exposta em pornografia de vingança ou ter seu abuso filmado e distribuído é muito maior do que com qualquer outro tipo de material. Muitas pessoas tentam por meses ou anos retirar o conteúdo desses sites e muitas nunca conseguem. Uma vez na internet… Parte desses conteúdo pode ter vindo de um relacionamento abusivo, um encontro sexual onde a pessoa foi drogada, coagida, estuprada, e é muito comum que as pessoas que passam por isso sofram consequências sérias de estresse pós traumático, experimentem pananoia, considere difícil sair de casa, conseguir um emprego ou ter uma vida social, por exemplo. Você nunca sabe se o conteúdo que você está assistindo é o momento mais doloroso e vulnerável de uma pessoa, que a causa dor ou destrói sua vida até hoje.

[1]https://mashable.com/2014/01/12/amateur-porn-abuse/?europe=true
[2] Sobre o “pornô ético”: https://medium.com/recuse-a-clicar/porn%C3%B4-%C3%A9tico-uma-cortina-de-fuma%C3%A7a-para-uma-ind%C3%BAstria-exploradora-886b828a08dc?source=your_stories_page---------------------------
[3]Por que a pornografia amadora nunca será segura:
https://medium.com/anti-pornografia/or-que-a-pornografia-amadora-nunca-ser%C3%A1-segura-b15cc8d1f84

Mito 6: O ‘pornô feminista’ está mudando a indústria e ele empodera as mulheres!

Realidade: Incitar mulheres a participar de pornografia é sexista, pois implica que as mulheres devem imitar o comportamento sexual dos homens. Vender ‘pornografia para mulheres’ apenas permite aos pornógrafos expandirem seu mercado sem modificar os efeitos danosos por trás de qualquer pornografia.
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A pornografia é uma forma de prostituição, só que em vídeo: mulheres devem engajar em atos sexuais que elas não realmente desejam — elas não fariam se não fosse pelo dinheiro. O fato de que uma mulher está por trás das câmeras não muda essa realidade.

Interessantemente, quando feministas se declaram ser antipornografia, sempre são confrontadas com a pergunta, “mas e a pornografia feminista?” Na nossa visão, sendo uma mulher por trás das câmeras ou não, o fato de que a pornografia é uma indústria multibilionária movida pela demanda e pelo lucro deveria ser argumento suficiente para acabar de com a falácia do ‘pornô feminista’. Os vídeos pornográficos ainda servem o olhar masculino e seus ideais do que significa ser uma mulher (esse olhar e essas noções permeiam toda a nossa cultura). A chamada pornografia feminista serve aos mesmos propósitos e às mesmas narrativas da pornografia ‘convencional’, é feita pelos mesmos magnatas na indústria e vendida para essencialmente o mesmo público. De fato, incitar as mulheres a também fazerem e assistirem pornografia (elas também podem! tem pornografia para elas!) é algo inerentemente sexista, porque implica que as mulheres devem imitar o comportamento sexual dos homens (e, talvez, de alguma maneira isso os exima de seus próprios comportamentos problemáticos..?): os homens são apresentados como o padrão de comportamento humano no qual devemos nos basear.

“E a Erika Lust?”* Se você se refere ao site de Lust, ela descreve os vídeos pornográficos que produz como ‘bonitos, cheios de luxúria e de alma’, se opondo à pornografia convencional, que ela considera ser mecânica, sem emoção e redundante. Erika Lust tentou vender sua pornografia como conteúdo “indie”, alternativo, tornando fácil que meninas jovens em nosso tempo se declarassem em favor da tal ‘pornografia artística e feminista’. É, claro, uma excelente estratégia de marketing para expandir o mercado para mais um nicho.

Na realidade e nos sets, as coisas são bem diferentes. Em 2019, o ‘performer’ Hello Rooster fez alegações de comportamento antiético nas gravações no Olympe de G. dos filmes de Erika Lust, apesar de que essas alegações sejam refutadas de novo de novo**. Hello Rooster adicionalmente afirmou que as pessoas que alegaram contra tanto a Olympe de G.quanto à Lust tenham sido frequentemente manipuladas, ofendidas e debochadas quando falaram sobre violações de seus limites impostos ***.

Em maio desse ano, Lust publicou um post em seu blog com o título “We Care” (“Nós nos Importamos”), no qual ela reconhece que houveram “situações indesejáveis” em várias de suas sessões de gravação. O post especificamente mencionou “situações” durante a produção de 7 filmes diferentes, a maior parte deles com diretores convidados, incluindo o “Don’t Call Me a Dick”, o filme em que Rooster participou. Desde então, no entanto, o mesmo post foi editado para excluir os nomes específicos dos filmes (má publicidade, certo?). A exata natureza de tais “situações” nunca foi feita clara****.

No cenário nacional, temos a recente polêmica em torno da figura defensora da pornografia feminista no país, a atriz e produtora DreadHot. A Alice Rey, camgirl do Camera Privê, montou uma thread em seu perfil no Twitter para explicar toda a polêmica e que está rolando neste momento entre as profissionais (e amadoras) do entretenimento adulto nacional: A camgirl e atriz pornô Dread Hot supostamente teria agido de má fé e cometido abusos na exploração e comercialização da conteúdo que envolveria a participação de outras profissionais. Lunna Vaz e Lucão Camargo, Emme White e Vênus fizeram coro nas denuncias.

Como a grande abolicionista Josephine Butler disse: nós nunca pensamos em estabelecer horários designados para o assassinato. ‘Com licença Sr, você assassinou sua esposa as 7:30h quando o assassinato nesse distrito é limitado para de 4 às 7h: eu precisarei te condenar por isso’. Porque é que nós consideramos a regulação ou a modificação da violência sexual contra a mulher quando ela deveria ser erradicada? É porque ela é tão pervasiva que começamos a acreditar que ela é inevitável? Como Noam Chomsky diz: “É como o abuso sexual infantil… você não quer um abuso sexual infantil que seja ‘melhor’, você quer acabar com o abuso sexual infantil”.

Vender pornografia ‘de mulheres para mulheres’ apenas permite que os pornógrafos abram mais um segmento no mercado, deixando todo o resto da indústria intacta, só que com mais uma porta. Mas mulheres não deveriam ser tratadas como mais um nicho de mercado e a exploração sexual de nossos corpos sendo feito por outras mulheres não é sensual, bonito ou ousado. É apenas aquilo que sempre foi: prostituição. Não tem como colorir isso de outra cor.

* https://www.youtube.com/watch?v=Z9LaQtfpP_8&t=2s
** https://jezebel.com/is-feminist-porn-getting-its-metoo-mome
*** https://www.youtube.com/watch?v=tzluj_HTth8&feature=youtu.be
**** https://erikalust.com/we-care/

Mito 7: A pornografia permite que mulheres (principalmente as mais jovens) alcancem sua independência financeira.

Realidade: Mesmo muitas das grandes atrizes da indústria pornográfica acabam tendo sua ‘fortuna’ apropriada por agentes, produtores e sites de hospedagem de pornografia.
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Um dos mitos mais prevalentes sobre a pornografia e sobre as mulheres na indústria pornô gira em torno da premissa de que a pornografia provê para as mulheres, especialmente as mais jovens, com independência financeira. Isso, quando já não partem para o discurso de que as atrizes ficam ricas! Com a independência financeira vêm a liberdade de decisão, a estabilidade de vida, então quando ativistas antipornografia questionam a indústria, isso pode facilmente aparentar que estão sendo uma antítese ao ‘feminismo’.

Mas, se você cavar um pouco mais além da superfície — e sinceramente, não precisa de muito esforço porque as informações estão á um clique de distância — você terá sua falácia confrontada com o fato de que as mulheres não acumulam dinheiro dentro da indústria da pornografia. Um uma dimensão ou outra, as mulheres de dentro da indústria da pornografia acabam tendo a maior parte de seus ganhos (se podemos falar assim) sendo apropriados por agentes, produtores ou sites de hospedagem de material.[1] Mulheres jovens são particularmente vulneráveis a isso porque são novas na indústria e ou não reconhecem que estão sendo exploradas ou estão tão desesperadas que irão aceitar o mínimo do mínimo para poder comer, pagar o aluguel ou mensalidades de estudos.

Por mais que haja divergências quanto a figura, a história de Mia Khalifa é relevante nesse tópico: em 2019 ela contou à BBC que, apesar de ser uma das “estrelas pornô” mais assistidas de todos os tempos, isso não necessariamente retornou como pagamento.[1] Ela ganhou um total de $12,000 durante seu tempo na indústria e “nunca mais viu nenhum centavo”. Isso, apesar do fato de que ainda há vídeos dela circulando em vários sites de pornografia. Se isso aconteceu com Mia Khalifa, uma das mulheres mais famosas do mercado pornográfico, não deveria ser surpresa para ninguém que isso também se aplica a qualquer outra mulher que tenha vindo antes ou depois dela para o mercado.

Além dessa verdade, de um ponto de vista ético, esses argumentos invisibilizam a violência inerente à pornografia, que foram descritos em mitos anteriores, e priorizam argumentos baseados no dinheiro. Porque a mulher supostamente está fazendo dinheiro, é ok que os apologistas da pornografia priorizem o dinheiro acima da violência contra a mulher, já tão escancarada e evidenciada? Tudo está bem, desde que as mulheres estejam sendo pagas?

Lembrem-se, sexo por coerção tem nome: estupro. Isso inclui coerção econômica.[2] Pornografia é prostituição filmada, e as mulheres que viveram a realidade da prostituição relatam como a prostituição é, sim, um violência, um tipo de ‘estupro pago’.[3] O dinheiro é apenas mais um agente coercivo.

[1]bbc.com/news/newsbeat-49330540
[2]https://medium.com/recuse-a-clicar/o-mito-da-livre-escolha-13265a1ebb61
[3]https://medium.com/recuse-a-clicar/quanto-realmente-custa-e-paga-ser-uma-atriz-porn%C3%B4-hoje-59e012bf79d0?source=your_stories_page---------------------------

Mito 8: Ser antipornografia é ser puritano, antissexo!

Realidade: Ser antipornografia é o primeiro e importante passo para libertar nossa sexualidade dos desequilíbrios de poder e dos estereótipos violentos e misóginos.
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Primeiramente, essa declaração assume que pornografia é sexo, o que, em turno, significa que homens degradando sexualmente mulheres ‘é sexo’. A pornografia nega a natureza mútua de um encontro sexual ao comodificar e comercializar o acesso sexual masculino aos corpos de mulheres (ou de humanos à outros corpos humanos, no caso geral), deixando o usuário sobre o controle de toda a experiência sexual.[1] Assim como sabemos que nenhuma amizade que valha o nome possa ser comprada, não sobra muito de ‘sexo’ quando atos sexuais são forçados e coagidos sobre mulheres por meio de uma troca financeira.

Nós não estamos aqui para pregar sobre castidade ou sobre abster-se de sexo. Na verdade, estamos aqui para encorajar que homens e mulheres façam sexo, se eles quiserem, de uma maneira consciente e saudável, que não irá danificar sua saúde física, mental ou emocional.[2] Queremos nos certificar de que todos, em particular as mulheres, possam desfrutar de uma sexualidade autêntica e que NÃO EXISTE para satisfazer os desejos de uma cultura pornificada, degradante e violenta. É permitido a nós termos uma vida sexual cheia de respeito, mutualidade e consentimento informado. De prazer e descoberta. Nossa sexualidade não deveria estar à venda e não deveria servir para agradar ao olhar masculino e pornificado moldado por uma indústria.[3]

Ser antipornografia é lutar contra a comodificação sexual dos corpos e uma sexualidade moldada para o lucro e geração de demanda de uma indústria que só se importa com seus ganhos, e em nenhum momento com a saúde sexual de seus usuários.

Ser antipornografia significa nos impormos contra uma indústria que está ditando normas sexuais para meninos de até mesmo 11 anos de idade para ganho monetário e à despeito da degradação de mulheres reais. [4]

Ser antipornografia é o primeiro e importante passo para tomarmos posse de nossa própria sexualidade, a libertando dos interesses alheios, dos desequilíbrios de poder sociais e estereótipos misóginos e degradantes, para que ela possa ter um desenvolvimento genuíno, autêntico e pleno.

E não há nada mais ‘pró-sexo’ do que isso.

[1]https://medium.com/recuse-a-clicar/carta-aberta-sobre-pornografia-dos-dois-renomados-terapeutas-de-relacionamento-julie-john-f619f01971ae
[2]https://medium.com/recuse-a-clicar/%C3%A9-hora-de-uma-campanha-de-sa%C3%BAde-p%C3%BAblica-sobre-pornografia-online-prejudicial-b6954b4eb89e
[3]https://medium.com/recuse-a-clicar/estudantes-que-cometeram-estupros-pensam-que-garotas-chorarem-faz-parte-das-preliminares-devido-%C3%A0-3ee39fd9b08e
[4]https://medium.com/recuse-a-clicar/como-falar-com-seu-parceiro-sobre-pornografia-e-porque-todos-dever%C3%ADamos-fazer-isso-e672287c917a

Mito 9: A pornografia pode te ajudar a ser um parceiro sexual melhor!

Realidade: A pornografia apresenta uma visão completamente distorcida do sexo que prioriza o prazer e a satisfação masculina e normaliza o abuso sexual.
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Mais uma mentira comum em torno da pornografia é que ela pode ajudá-lo a explorar sua sexualidade e ensiná-lo a ser um parceiro sexual melhor. Assistir pornografia, continua dizendo o mito, expõe você a uma variedade de atos sexuais e tipos de corpos e apresenta novas fantasias que então se introjetam em você de modo a torná-lo um parceiro sexual mais confiante. E este é um mito por alguns motivos. Em primeiro lugar, os atos sexuais apresentados na pornografia raramente refletem a realidade do sexo. A pornografia é filmada através do olhar masculino — é por isso que o prazer masculino é quase sempre priorizado. Muitas vezes, o homem nem mesmo é visível. Vemos a mulher através de seus olhos e ela está lá para seu prazer. Espera-se que a mulher, entretanto, performe como se estivesse tendo prazer — faça poses provocativas, faça sons. Seu corpo é objetificado para trazer ainda mais satisfação sexual ao espectador, que geralmente é um homem. Isso envia uma mensagem muito poderosa onde a mulher existe como um objeto sexual para o prazer masculino. Como a pornografia é considerada a principal fonte de conhecimento sobre sexo e sexualidade, ser sexual muitas vezes significa encenar atos pornográficos. Essa é a mensagem dominante, o volante por detrás da pornografia hoje — mera objetificação, e a venda de partes de pessoas. “Mulheres não são nada além de conjuntos de orifícios destinados para o uso e abuso dos homens, e os homens não são nada além de falos anônimos demandando serem servidos” — escreveu Horsey. (1) Em segundo lugar, a pornografia normaliza a dor e a violência como partes desejadas do sexo. Como já exploramos nos dias anteriores, a misoginia desempenha um grande papel no motivo pelo qual a violência física contra as mulheres é tão naturalizada na pornografia. Outra razão é que a pornografia foi projetada para lhe dar prazer através da liberação de dopamina. No entanto, quanto mais pornografia você assiste, menor a probabilidade de obter o mesmo prazer outrora obtido. Seu cérebro requer constantemente mais novidades (2). É por isso que os espectadores, com o tempo, precisam buscar imagens mais extremas para obter a mesma satisfação. A pornografia faz isso sexualizando a violência e o abuso para chamar a atenção dos espectadores e mantê-los cativos. Acostumar-se a encontrar satisfação sexual assistindo a atos violentos torna mais difícil desfrutar do sexo sem violência ou jogos de poder na vida real. Sexo sem violência parece não apenas menos interessante, mas também não estimula sexualmente o suficiente. Alguns estudos mostram como a exposição à pornografia se correlaciona com a incapacidade de encontrar satisfação sexual no chamado “sexo baunilha” e com o desejo crescente de novos atos sexuais (3). Nossos desejos, apesar da narrativa liberal tão popular, não são totalmente inatos — o que assistimos tem um impacto naquilo que desejamos. Mulheres e meninas aprendem através da pornografia que a violência contra elas, como enforcamentos, cuspidas ou outras agressões, é uma parte natural do sexo e, portanto, internalizam isso como seu próprio desejo, o que torna extremamente difícil ver pelo que ela realmente é — mera violência contra mulheres travestida de sexo. “A pornografia é aquilo que todo mundo está vendo como se fosse normal, mas a questão é, não é normal, nós sabemos que não é normal ou natural, é completamente manufaturado e mercadológico. A pornografia contém muita violência contra a figura feminina. Ela é terrivelmente racista. Se você olhar para a pornografia popular, é terrivelmente misógina e abusiva. Mesmo assim, ‘pornografia = sexo’ se tornou a mentalidade cultural mais comum”. (4) A pornografia capitaliza uma necessidade humana de satisfação sexual: ela a transforma em um produto que substitui a conexão e a intimidade reais. Por que se preocupar em lidar com a complicada realidade do sexo quando você pode obter prazer assistindo a um vídeo? Por que conversar com um parceiro e explorar o que vocês gostam juntos — e, portanto, se expor à possibilidade de rejeição, mas também de intimidade real — quando você pode fazer isso sozinho apenas ligando um computador? Por que questionar a dor e a violência como partes do sexo quando você pode concluir que “simplesmente gosta disso”? Infelizmente, pornografia não é um bom professor. O sexo não tem que envolver atos mecânicos e supersexualização de corpos femininos. Sexo não tem que ter violência. Mas deve trazer diversão, prazer e segurança para todas as partes envolvidas.

(1) https://medium.com/recuse-a-clicar/amor-manufaturado-como-a-pornografia-hoje-%C3%A9-sobre-criar-uma-intimidade-sint%C3%A9tica-99b59d27b93b (2) https://oceanrecoverycentre.com/2016/07/the-ultimate-guide-to-overcoming-internet-porn-addiction (3) Janssen, E. & Bancroft, J. (2007). The Dual-Control Model: The role of sexual inhibition & excitation in sexual arousal and behavior. In E. Janssen (Ed.), The Psychophysiology of Sex. Bloomington, IN: Indiana University Press, 197–222 (4) https://medium.com/recuse-a-clicar/muitas-mulheres-assistem-pornografia-pensando-que-aquilo-%C3%A9-sexo-normal-n%C3%A3o-%C3%A9-1bc4c9ba0489

Mito 10: As atrizes pornô estão sob controle de suas carreiras.

Realidade: A indústria pornográfica é uma indústria assassina que se sustenta da completa exploração de seus “atores” e “atrizes”.
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Conforme abordado no mito nº 3 de nossa campanha, as mulheres exploradas na indústria da pornografia não são atrizes, mas meninas e mulheres na vida real “fazendo sexo” diante das câmeras. Os atos a que são forçados, na maioria das vezes, têm consequências duradouras em seu psicológico, comportamento social e corpos. O mito nº 3 pode estar ligado ao mito de que as mulheres na pornografia estão no controle de suas “carreiras” — que mulher, de boa vontade, assinaria um contrato no qual fica explícito que seu corpo e mente seriam violados e danificados, às vezes sem possibilidade de reparo? A pornografia é, de fato, uma indústria implacável que prospera explorando seus “artistas”. Se as mulheres na pornografia estivessem realmente no controle de suas “carreiras”, os vídeos em que aparecem circulariam por décadas e décadas, mesmo que a mulher em questão tivesse saído da indústria e/ou pedido que o conteúdo fosse removido da internet?

Os pornógrafos não oferecem nenhuma garantia de privacidade, integridade física e dignidade. Esses são princípios essenciais quando se trata de controlar sua carreira e sua imagem externa. É sabido que algumas mulheres, tendo feito apenas alguns vídeos e passado um tempo limitado na indústria da pornografia, nem mesmo são pagas — mesmo que o conteúdo de seus vídeos circule por anos. Elas não têm controle de sua imagem, para quem ela é vendida e por quem é distribuída. O que achamos dos vídeos de abuso sexual infantil, como os das sobreviventes Avri Shapir e Rose Kalemba? Eles estavam e estão no controle de sua “carreira”? Eles tiveram alguma influência na produção e distribuição de seus estupros filmados? A resposta é um sonoro NÃO.

Outro ponto digno de nota: o fato de as mulheres jovens, novas no setor, serem preparadas para participar da criação de um conteúdo mais hardcore para se manterem relevantes e continuarem ganhando dinheiro. Como sabemos, a pornografia é uma roda em constante rotação, à medida que a demanda por estupro e abuso sexual pagos é cada vez maior, cada vez mais mulheres e meninas são empurradas para ela. Muitas vezes, até não ter volta.

Com os lucros das produtoras caindo, as atrizes estão sob cada vez maior pressão de filmarem mais e mais atos extremos e desviantes, porque esse tipo de cena gera mais lucro. Pra dizer de forma crua, dor gera lucro.

Uma cena contendo atos extremos e violentos pode pagar à atriz de $1,200 a $2,400 dependendo do ato, enquanto cenas “normais” podem pagar a uma atriz $800 ou menos. É fácil ver, então, como uma atriz em situação mais vulnerável pode acabar atuando em cenas cada vez mais e mais extremas, humilhantes e abusivas, mesmo que elas não estejam confortáveis com elas, e mesmo que um bom pedaço de seus ganhos acabe sendo usado para pagar contas de consultas médicas ou medicamentos como resultado.

Cada vez mais, não existe algo como uma atriz pornô “regular” — existem aquelas que aceitam participar de gravações cada vez mais e mais violentas e extremas para sobreviver e se manter provavelmente por alguns anos se tiverem sorte — e existem aquelas que não têm essa sorte, e se encontram às margens de uma indústria sem verem saída dela e tendo muito poucas opções, quando não acabam desenvolvendo doenças, vício em substâncias ou até mesmo cometendo suicídio. Enquanto esse ciclo ocorre, ele alimenta e nutre uma demanda por material crescentemente abusivo e cenas cada vez mais extremas e mais desviantes, que devem ser produzidas para que o negócio seja lucrativo para os diretores, estúdios e sites. (1)

Pense sobre isso — o primeiro e único foco da indústria pornográfica é fazer dinheiro. Não é realmente “apimentar” sua vida sexual, te fornecer um entendimento saudável sobre sexo e consentimento, ou te ajudar a respeitas mulheres ou homens. Por trás dos novos atos sexuais e títulos explícitos estão times de pessoas responsáveis por alimentar essa máquina produtora de dinheiro. Os produtores de pornografia têm todo o incentivo que precisam para criar o produto mais extremo disponível para então poder competir com um mercado inundado e, assim, fazer dinheiro. (2)

Ser preparado e coagido a filmar atos que violam claramente sua integridade corporal é estar no controle de sua “carreira”?

(1) https://medium.com/recuse-a-clicar/quanto-realmente-custa-e-paga-ser-uma-atriz-porn%C3%B4-hoje-59e012bf79d0
(2) https://medium.com/recuse-a-clicar/as-pessoas-querem-mais-forte-essas-frases-reais-de-produtores-porn%C3%B4-s%C3%A3o-mais-que-6a1d20d025b

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Via Radical Girlsss
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Ninka
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Cursando PhD em Física. Lutando contra a exploração e violência sexual evidente e inerente à pornografia, prostituição e tráfico humano nas horas vagas.