A polêmica do “Banheirão” na SmartFit: o autor responde.
Eu sei que não é exatamente isso, mas ninguém liga.
Eu ligo, bee, e ligo muito! E olha só, vocês me viram falar bonito, agora vão ver é eu falando FU-RI-O-SA!
Brinks! #pas ♡
Então, meu amor, eu sei que muita gente não leu de verdade o meu texto e acabou compartilhando conteúdo só por compartilhar. Muita gente até chegou a ler, e algumas críticas foram babado! Mas a maioria das críticas focou em um ponto fictício que nem existe no texto: o de que eu supostamente defendi a pegação e menosprezei o constrangimento público e o consenso. Mas ó, eu juro que não tô bravo com isso não, porque sei que esse tipo de coisa acontece, e sou parcialmente responsável por isso por causa do meu estilo barroca_2019. Mas vamos lá, prometo que vou tentar me expressar sem dificultar, beleza?
Edit: confira também meu vídeo em resposta à polêmica.
Pegação versus botão
Então, eu até poderia ter realmente falado sobre a pegação, que é um puta fenômeno social interessante. Pegação não é algo que você defende ou discorda, mas analisa como um fato social complexo, com vários lados.
Mas, no caso, o que eu fiz, longe de “romantizar” a pegação, foi assumir ela como uma questão para problematizar a forma como a academia vem conduzindo o problema. Ou seja, o botão!
Houve, portanto, um problema de comunicação, e eu admito que isso tem a ver com o meu estilo de escrita.
Agora, bee, eu não ofereci uma solução pontual mesmo, mas apontei o diálogo como método para uma saída coletiva e justa. Mesmo porque, vamos combinar, se alguém tem que solucionar esse problema, esse alguém não sou eu, mas a empresa que lucra com o pink money. Se a SmartFit me contratasse um dia para isso, aí sim eu poderia ser cobrado para resolver algum problema, a começar por aquele amarelo cafona.
A resposta e o a questão do botão
A SmartFit me procurou um dia antes da explosão no Twitter. Foi uma conversa muito positiva, franca, aberta e amistosa. Trocamos impressões sobre a questão de maneira leve e adulta. Eles haviam lido atentamente meu texto. Falei para eles que a conversa estava boa, mas preferia que a academia se posicionasse de maneira aberta à comunidade, já que se tratava de uma carta pública. Na prática eles escreveram uma nota xoxa, capenga, manca, anêmica, frágil e inconsistente. Não questiono a escolha, ela é coerente.
Na nota se diz: “Esses mecanismos têm o objetivo de garantir a segurança e a comodidade dos alunos, ao permitir o acionamento imediato de um colaborador da unidade”.
Por causa desse trecho uma galera veio me falar que o botão podia ser utilizado para reportar homofobia e misoginia. Respondo para essa povo bancar essa teoria publicamente e explico o porquê, e ainda adiciono que essa fala transita entre cinismo e ingenuidade. E sabe por quê?
Quando uma mulher, um gay, uma pessoa negra sofre uma opressão ordinária, ela é recorrentemente colocada numa situação de silenciamento, deslegitimação e resignação. Agora, quando a pessoa minoritária faz merda, a violência é naturalizada.
Como assim?
Vamos supor: uma mulher sofre um assédio verbal, é seguida por um macho na academia ou ouve um comentário misógino. Na prática, quantas mulheres vão reportar isso pro atendente (que pode ser outro macho misógino)? Quantas não aguentam caladas essa situação? Quantas não têm medo de serem deslegitimadas ou ridicularizadas por se posicionarem publicamente contra essas atitudes?
Agora, quando uma mulher faz uma “barbeiragem” no trânsito, ou seja, quando é o minoritário que faz a merda, a violência na linguagem é banalizada, e essa mulher será desprezada por ser mulher porque desta vez há “motivo” para isso.
A perseguição contra a pegação entre homens é exatamente isso. Ou você acha que todos os gays se sentem à vontade num ambiente de constrangimento público desse para reportarem algo contra um cara cuja masculinidade é prestigiada?
Logo, esse papo de que o botão pode ser usado contra assédio é bonito, mas não me convence. Mesmo porque o que interessa para mim não são as intenções originais da implementação, mas os efeitos que ela produz.
Oportunismo das plataformas de conteúdo
As plataformas que citaram o meu perfil e o meu texto (Veja, BuzzFeed, Pheeno, Destak) exploraram de maneira oportuna (pra não meter logo um -nista) a polêmica. Mandei um DM para alguém do BuzzFeed perguntando se el@s tinham interesse de me ouvir. Não tive resposta.
Vários trechos integrais do meu texto foram citados, mas claramente rolou uma falta de preparo para entender algumas ideias socioantropológicas. O objetivo era ter cliques, e não informar com idoneidade, já que nenhuma das páginas me procurou para ouvir minha opinião.
Aliás, estou disponível para essas empresas para dar treinamento gratuito sobre antropologia, ciências sociais, gênero e sexualidade, caso elas estejam interessadas.
Os tuítes que foram indexados pelas plataformas de conteúdo foram os memes que exploravam uma certa comicidade da polêmica. Aproveito a oportunidade para deixar aqui alguns tuítes com críticas positivas que as referidas plataformas não compartilharam. 《Não é exatamente isso, mas ninguém liga》.
Teve também a abordagem do Põe Na Roda, que foi bem mais ponderada que a dos outros veículos.
Comuniquei mal
Sou cientista social e antropólogo (atualmente no doutorado) e a Carta tem realmente um jargão próprio de algumas vertentes das ciências humanas (sobretudo pós-estruturalismo e estudos de gênero e sexualidade, para tentar ser preciso).
Meu estilo de escrita é chatão, meu gênero é o textão (e textão não é um termo pejorativo, mas o único tipo de gênero literário que permite o encadeamento de argumentações complexas).
Mas assim, eu não fiz um texto rebuscado com composições complexas e palavras bonitas pra dar credibilidade à pegação nem nada disso, mas é porque uma vez me ensinaram que, se você é uma bicha e quer ser ouvida como tal em suas reivindicações, você tem que saber falar.
Em outras palavras, dominar a linguagem é uma forma de empoderamento. Pensem sempre nisso antes de chamarem as migles de pedantes, porque às vezes não é pedância, tá? Você pode questionar meu estilo, mas não a minha luta.
O ódio
O Medium, e sobretudo a Revista Subjetiva são verdadeiros lares para mim. Esta é uma rede social de texto, que permite com que as pessoas debatam com generosidade. Contudo, houve uma torrente inédita de comentários que mesclavam críticas negativas com puro ódio moralista. Celebro cada pessoa que dedicou seu tempo e energia em vir até a plataforma para poder comentar meu texto, mas deixei os comentários um pouco de lado a partir do momento que percebi que eles desprezavam o real assunto do texto ao mesmo tempo que se concentravam em me desqualificar apenas porque propunha uma abordagem desconstruída.
Eu li que eu era promíscuo, doente mental, mamador e manjador de rolas e oportunista. Li que fiz um desserviço ao movimento LGBT (meu velho conhecido), e que meu texto causava nojo e repulsa. Muita gente certamente já foi ler o texto com sangue nos olhos para criticá-lo. Sem falar das pessoas que o criticaram sem sequer lê-lo.
E o mais louco é que foram os próprios gays, ou seja, meus irmãos, que fomentaram essa escalada ao ódio.
Então parei de ler os comentários mesmo e fui cuidar da minha vida. Porque, né, não sou obrigado!
Respeita minha história m@nas!
Não gosto de dar carteirada, mas assim, sou bacharel em Ciências Sociais, mestrado em Antropologia e tô no doutorado agora, e sempre estudei gênero e sexualidade. Acho muito afrontoso o povo vir discutir sem ter o menor cuidado com um texto que é fruto de anos de pesquisa e dedicação, e que tem a intenção justamente de problematizar homofobia.
Tem gente que nunca pisou fora de casa para ir a manifestação pró-LGBT. Gente que acha que política é só lacrar em hashtag. Para você que falou que meu texto é um desserviço para a militância, digo o seguinte: respeita a minha história! Tenho dez paradas LGBT e caminhadas lésbicas nas costas, já participei de beijaço em delegacia e na frente de vários estabelecimentos comerciais, dezenas de manifestações de rua anti-homofobia, fui a uns oito congressos nacionais de gênero e sexualidade, fui à segunda marcha nacional contra a homofobia em Brasília, já apanhei por dar close na rua, dediquei meu mestrado aos estudos de gênero e sexualidade e faço trabalho voluntário no Centro de Cidadania LGBT de São Paulo. E você vem me chamar de versão gay da Barbie branca dos privilégios? Ponha-se no seu lugar, bee!
_erinhoos cronista e _erinhoos cantor
Gostaria, por fim, de aproveitar o flow para divulgar duas coisas que eu faço e de que tenho muito orgulho. Coisas pelas quais eu realmente gostaria de ser conhecido. A primeira delas é: eu escrevo, escrevo com paixão, e escrevo sobre muitas outras coisas por aqui; relacionamentos abertos, justiça, classe e sexualidade, sociedade do espetáculo, música e classe, aplicativos de pegação, cinema, juventude, prostituição masculina, gênero e dignidade, compersão, heteronormatividade, a música do metrô, hipocrisia entre gays, bullying, swing gay, casamento, a falácia do sucesso, clichês gays, pânico moral e sociologia, espaço urbano, esquema de pirâmide.
A segunda coisa é: eu canto e componho. Vou deixar aqui e aqui os links de dois sons meus para vocês conhecerem. Minha página no facebook é esta e meu arroba no instagram é @meroserros.
Balanço final
Saldo positivo: movimentei as redes, tive cliques, fiquei famoso por um dia, mobilizei a academia e, o mais importante, fiz o debate acontecer.
Saldo negativo: acabei promovendo a academia — e o próprio botão por tabela—, fui xingado por milhares de pessoas (os próprios gays?!) e, o pior, não ganhei nenhum centavo para isso.
Ou seja: mirei na crítica de um dispositivo que considero ofensivo, equivocado e oportunista, e acertei no alvo da promoção involuntária da academia, adesão moralista em massa do botão e até na minha própria humilhação pública. Mas…
Não me arrependo nem um pouco! Espero ter mobilizado muita gente legal para pensar sobre o tema, assim como aprendi bastante nessa última semana com a repercussão da Carta.
No mais, só agradeço a todas as monas & manas que somaram nesse debate com o peito aberto! Vem que tem mais!
Bjs de luz que o de hoje tá pago!