O YouTube determinará o futuro da TV?
Pela primeira vez, MrBeast revela detalhes do seu novo programa no Prime Video. Maior criador da plataforma tem incorporado estilo mais amigável em suas produções mirando transição para TV/streaming. Trata-se do seu big pivot? O Beast Games será o teste para saber se ele está apto ou não para o mundo da mídia tradicional, e um referendo sobre se o entretenimento algorítmico significa algo além dos widgets de recomendação reinantes na economia da atenção das redes sociais
A produção em Kupari, na Croácia, veiculada há duas semanas no YouTube, é o que MrBeast tem chamado de desaceleração. No manual do novo padrão dos vídeos adotado por ele ainda no ano passado, constam mais histórias e menos gritarias e conteúdos longos em que as cenas respiram.
É, provavelmente, o mais próximo que ele chegou de uma lógica cronológica com começo, meio e fim perceptíveis:
“Seus vídeos, geralmente, parecem um trailer de um programa de TV que não existe”, ponderou o insider Ryan Broderick.
Quando foi ao Twitter admitir a mudança na dinâmica dos vídeos e assegurar que as visualizações dispararam, Donaldson já havia assinado seu contrato de cerca de US$ 100 milhões com a Amazon.
Enquanto o valor do acordo descoberto por Matthew Belloni, da Puck, segue sem confirmações de ambas as partes, Donaldson revelou, nesta semana, as primeiras informações sobre o Beast Games, um reality show que terá 1.000 participantes competindo pelo maior prêmio da história da TV e do streaming: US$ 5 milhões.
“Será um híbrido de vídeos clássicos do MrBeast no YouTube e um game show clássico da TV.”
A definição da nova empreitada foi anunciada pelo youtuber ao canal de Colin e Samir, e indica sinais de amadurecimento do então adulto de 25 anos que podem ser interpretados como uma adaptação de um estilo mais amigável para a TV.
O processo de transformação incorporado pelo criador mais influente do YouTube nos faz lembrar sobre sua trajetória ascendente e meteórica em mais de uma década que remonta ao longínquo ano de 2012:
“Todo o seu projeto, desde o início, tem sido tentar maximizar o YouTube como mídia. Tudo o que ele fez desde seu primeiro vídeo viral foi converter dinheiro e recursos em tráfego na Internet para ganhar mais dinheiro e recursos para converter em mais tráfego. Simplesmente, não há nada além disso”, avaliou Broderick.
Transcorridos 12 anos, seria o momento para o seu Big Pivot?
Em uma coincidência muito oportuna, a pergunta feita por Broderick há duas semanas, ganhou uma resposta indireta de MrBeast no podcast de Colin e Samir ainda cercada por muitas dúvidas:
“Reconheço que isso pode ter um efeito positivo enorme, e todas as plataformas de streaming lançarão ofertas a torto e a direito para os criadores. Ou um efeito negativo, e as pessoas dirão: ‘se Jimmy não conseguiu fazer um programa de sucesso, o que faz você pensar que pode? Esse é um dos meus maiores temores.”
O misto de incerteza e receio reafirma a prova de fogo a qual o criador será submetido, conforme frisou Broderick: será um teste para saber se ele está apto ou não para o mundo da mídia tradicional e, na verdade, um referendo muito mais interessante sobre se o entretenimento algorítmico significa algo além dos widgets de recomendação em que nasceu.
Beast Games estreará somente no fim do ano. E até lá, teremos tempo para entender dois aspectos relevantes e intrínsecos aos reais desdobramentos desta nova aventura do MrBeast e como ela impacta todo o ecossistema da mídia reinante do vídeo:
1- O YouTube pode, enfim, vencer a TV?
2- O YouTube será capaz de resgatar a autenticidade e superar a cultura de agitação do MrBeast pautada por mais visualizações, dinheiro e popularidade?
As dicotomias polarizadas na figura do personagem de Donaldson têm suscitado debates sobre as eras distintas dominantes na plataforma.
Em artigo escrito para o portal Polygon, Patricia Hernandez sacramentou o fim do reinado do MrBeast como um sinal do esgotamento e saturação da homogeneização da cultura em meio a um pedido urgente de restauração da autenticidade que lembra os primórdios do YouTube.
A jornalista resgatou um episódio do ano passado em que o criador Seán “Jacksepticeye” McLoughlin afirmou categoricamente que MrBeast é o grande culpado pela “piora do YouTube”: ele é a personificação de quem trabalha full time para crescer às custas do algoritmo.
Na visão de Hernandez, o criador incorpora fielmente a era ostensiva do YouTube, tornando-se o próprio sinônimo da plataforma.
“Você vê a influência dele em todos os lugares, nos tipos de conteúdo turbulento que as pessoas fazem, nos estilos de edição rápidos que povoam todo o conteúdo de tendências do YouTube e até mesmo na maneira como os YouTubers estilizam as miniaturas de seus vídeos.”
O relato reproduzido acima pela jornalista é do estrategista da plataforma Zackary Smigel. Resumidamente, ele traçou uma linha de tempo do app de vídeos, e destacou o exato momento em que houve uma mudança drástica em relação ao formato original da plataforma: o estabelecimento das super produções.
“No início, o YouTube valorizava a autenticidade, e o criador prototípico, provavelmente, estava gravando de seu quarto em um iPhone. Quando o dinheiro real entrou em cena, os mesmos criadores que construíram a plataforma se tornaram marcas que viviam de sua popularidade. O Smosh pronto para a câmera que você vê hoje, cujas palhaçadas explodiram com o advento das presenças de mídia social com curadoria em plataformas como o Instagram, é muito diferente da dupla amadora que começou o canal em 2005, por exemplo”
Os vídeos típicos de Donaldson ostentam um orçamento que bate até US$ 3,5 milhões. Apesar de não revelar os números para o Beast Games, o criador explicou a Colin e Samir que não há restrições em relação aos custos, e prometeu que o programa “vai deixar vocês boquiabertos.”
A dimensão da expectativa que está sendo criada serve para reforçar o que representa o maior desejo de MrBeast: provar que YouTubers e criadores podem ter sucesso em outras plataformas.
E ao capitanear essa frente, o Prime Video endossa a máxima de seu novo contratado, mas também amplia a amostragem do julgamento. Ou seja, MrBeast será avaliado por quem também não é seu público-alvo.
Certamente uma integrante desta categoria, a jornalista da Polygon tem plena convicção de que “ele não é o melhor que o YouTube tem a oferecer.”
Assim como Smigel admite estar exausto do sensacionalismo prevalecente nas redes sociais na última década.
Compactuo das mesmas opiniões de ambos!
MrBeast é a estrela cadente da segunda ou terceira geração do YouTube cujas produções lembram cada vez mais as antigas redes de TV a cabo, tanto em suas premissas de game-show quanto em suas produções de alto orçamento.
“Mas o YouTube pode não querer que sua plataforma continue a resolver para o MrBeast.”
A visão de Max Read é uma repercussão do artigo da Polygon e conclui de maneira brilhante esta discussão. Para o jornalista de cultura, mídia e tecnologia, a leitura do futuro feita por Hernandez antecipa uma mudança brusca rumo à “autenticidade”, casualidade, intimidade e “relacionabilidade” em uma tentativa de desprofissionalizar o YouTube novamente.
É algo que os blogs faziam com brilhantismo antes de serem atropelados pelo próprio YouTube.
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